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Arquitetura e Urbanismo: Planejando

e Edificando Espaços

Atena Editora

2019

Bianca Camargo Martins

(Organizadora)

2019 by Atena Editora

Copyright © Atena Editora

Copyright do Texto © 2019 Os Autores

Copyright da Edição © 2019 Atena Editora

Editora Executiva: Profª Drª Antonella Carvalho de Oliveira

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Edição de Arte: Lorena Prestes

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

(eDOC BRASIL, Belo Horizonte/MG)

G345 Arquitetura e urbanismo [recurso eletrônico] : planejando e edificando

espaços / Organizadora Bianca Camargo Martins. – Ponta

Grossa (PR): Atena Editora, 2019. – (Arquitetura e Urbanismo.

Planejando e Edificando Espaços; v. 1)

Formato: PDF

Requisitos de sistemas: Adobe Acrobat Reader

Modo de acesso: World Wide Web

Inclui bibliografia

ISBN 978-85-7247-452-8

DOI 10.22533/at.ed.528191007

1. Arquitetura. 2. Planejamento urbano. 3. Projeto arquitetônico.

I. Martins, Bianca Camargo. II. Série.

CDD 711

Elaborado por Maurício Amormino Júnior – CRB6/2422

Atena Editora

Ponta Grossa – Paraná - Brasil

www.atenaeditora.com.br

contato@atenaeditora.com.br

APRESENTAÇÃO

Um dos principais problemas estruturais do Brasil é a desigualdade social. O

abismo existente entre as classes sociais é resultado de um sistema desigual que

massacra e exclui a população de menor renda de modo contínuo desde o período

colonial.

Hoje, quando olhamos para as cidades brasileiras, vemos claramente a

materialização da desigualdade na paisagem urbana. Os efeitos nocivos da especulação

imobiliária e a valorização do preço da terra se manifestam de diversas formas no

urbano, seja na expansão desenfreada, nos vazios urbanos ou na multiplicação das

ocupações. Os diferentes modos de habitar mostram que a segregação socioespacial

está enraizada no cotidiano da população, desde os endereços mais privilegiados até

aos assentamentos informais.

O foco da presente edição do livro “Arquitetura e Urbanismo: Planejando

e Edificando Espaços” mostra a importância da discussão sobre o direito à boa

arquitetura, o direito à moradia e, sobretudo, o direito à cidade.

Os textos aqui contidos são um convite à reflexão e reúnem autores das mais

diversas instituições de ensino superior do Brasil, sejam elas particulares ou públicas,

distribuídas entre vários estados, socializando o acesso a estas importantes pesquisas.

Certamente os trabalhos aqui apresentados são de grande relevância para o

meio acadêmico.

Aproveite a leitura!

Bianca Camargo Martins

SUMÁRIO

SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 ................................................................................................................1

A ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA E SUA INFLUÊNCIA EM RESIDÊNCIAS DE

SANTO CRISTO/RS

Tais Elisa Schmitt

Cornelia Kudiess

Graciele Hilda Welter

DOI 10.22533/at.ed.5281910071

CAPÍTULO 2 .............................................................................................................. 11

RESSIGNIFICAÇÃO DA LINGUAGEM COMPOSITIVA

Rômulo Abraão Lima dos Santos Rodrigues

DOI 10.22533/at.ed.5281910072

CAPÍTULO 3 ..............................................................................................................26

PERMANÊNCIAS E INOVAÇÕES TÉCNICAS E ORNAMENTAIS EM CASAS

SENHORIAIS URBANAS CONSTRUÍDAS PELOS BARÕES DO CAFÉ EM

CAMPINAS – SP

Renata Baesso Pereira

Ivone Salgado

DOI 10.22533/at.ed.5281910073

CAPÍTULO 4 ..............................................................................................................42

EXPERIMENTAÇÕES ARQUITETÔNICAS COMO PROCESSO PROJETUAL E DE

APRENDIZAGEM

Sasquia Hizuru Obata

Carolina de Rezende Maciel

Milton Vilhena Granado Júnior

DOI 10.22533/at.ed.5281910074

CAPÍTULO 5 ..............................................................................................................59

REPENSANDO O ESPAÇO CONSTRUÍDO DA EDIFICAÇÃO ESCOLAR COM AS

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

,

superando em muito a produção do Vale do Paraíba (TONON, 2003, p.

52).

2 | A ORIGEM DAS FORTUNAS DO BARÃO DE ITATIBA E DO BARÃO DE

ITAPURA – A FAMÍLIA PATRIARCAL EM CAMPINAS

Tanto o Barão de Itapura (Joaquim Policarpo Aranha) como o Barão de Itatiba

(Joaquim Ferreira Penteado) fazem parte de duas famílias patriarcais paulistas das

mais abastadas, donas de grandes propriedades rurais. Segundo Tonon (2003,

p.47) nessas famílias patriarcais, “o casamento representava a união de interesses,

especialmente entre a elite branca e rica, preocupada com a manutenção do prestígio

e da estabilidade social”.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 29

A legalização do casamento sempre dependia do consentimento paterno cuja

autoridade era legítima e incontestável sendo, muitas vezes, de sua competência

decidir e determinar o futuro dos filhos sem consulta prévia sobre preferências

afetivas (TONON, 2003, p.48).

Ainda segundo Tonon,

(…) vamos encontrar muitas parentelas políticas em Campinas, todas elas bastante

atuantes, desde o final dos setecentos, inicialmente ligadas à propriedade

territorial e, posteriormente, complementadas por outras atividades ligadas aos

melhoramentos urbanos e à construção das ferrovias, principalmente após 1870

(TONON, 2003, p. 53).

Dentre as principais parentelas campineiras no século XIX, destacam-se os

Teixeira Nogueira, os Camargo, os Souza Aranha e os Salles (TONON, 2003, p. 53).

Joaquim Policarpo Aranha (1808 -1902), o Barão de Itapura, faz parte da família Souza

Aranha e Joaquim Ferreira Penteado (1808 - 1884), o Barão de Itatiba, pertence à

família Camargo.

Os Teixeira Nogueira tiveram grande número de casamentos endogâmicos (...)

tiveram também o maior número de ocupantes em cargos públicos. Esta família

dividiu com os Camargo, desde o início, a vida política do município. Unidos por

laços de parentesco e compadrio, a partir de Floriano de Camargo Penteado,

capitão-mor do município desde 1820, deram início ao que mais tarde seria o

Partido Liberal, enquanto que alguns membros dos Camargo, unindo-se à família

Andrade, originaram o Partido Conservador (TONON, 2003, p. 53-54).

Os Camargo, ascendentes do Barão de Itatiba, eram descendentes de antiga

linhagem originária de Castela e se fixaram em São Paulo no último quartel dos

seiscentos, destacando-se no governo colonial. Em 1757, os irmãos José de Camargo

Paes e Ignácio de Camargo Paes casaram-se, na Vila de Parnaíba, com as irmãs

Bárbara Paes de Barros e Ana Vicentina Paes de Barros, respectivamente. Bárbara

e Ana Vicentina eram filhas de Antônio Rodrigues Penteado e Rosa Maria Luz Prado.

Destes casamentos, originou-se a família Camargo Penteado.

Dos nove filhos de Barbara Paes de Barros e José de Camargo Paes destacam-

se: Floriano de Camargo Penteado, pai de Francisca de Paula Camargo, a futura

Baronesa de Itatiba; e Joaquim de Camargo Penteado, que teve uma de suas filhas,

Delphina de Camargo Penteado casada com Ignácio Ferreira de Sá, estes pais de

Joaquim Ferreira Penteado, o futuro Barão de Itatiba. Portanto, a Baronesa de Itatiba

era neta de Barbara Paes de Barros e José de Camargo Paes; enquanto o Barão de

Itatiba era bisneto destes. Delphina de Camargo Penteado se casou ainda mais duas

vezes, na última vez com Floriano de Camargo Penteado, seu tio, o que reforça a

política de construção da parentela na sociedade campineira.

O barão e a baronesa de Itatiba tiveram treze filhos, dos quais doze se casaram

com parentes consanguíneos.

Além de fazendeiros e de ocuparem cargos políticos, alguns filhos dos Barões

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 30

de Itatiba também exerceram outras funções, entre elas a de capitalistas das

companhias ferroviárias, de águas e esgotos, Campineira de Iluminação e Gás,

entre outras. Tiveram também Casa Comissária em Santos e sociedade na Casa

Bancária da Província de São Paulo, com matriz em Santos (TONON, 2003, p. 56).

Os Souza Aranha descendiam de José de Souza Siqueira, fundador do primeiro

estabelecimento agrícola na então vila de Campinas e que, juntamente com Francisco

Barreto Leme – este último considerado o fundador de Campinas, pois doou terras de

sua sesmaria para a constituição do patrimônio da primeira capela - declararam no

recenseamento de 1773, possuir sítio por escritura, o que confirma que os dois haviam

se estabelecido em terras pertencentes aos primitivos sesmeiros da região (TONON,

2003, p.54).

Francisco Egydio de Souza Aranha (1778 – 1860) casou-se com Maria Luzia

de Souza Aranha, em 16 de junho de 1817, reforçando as uniões consanguíneas na

família Souza Aranha. O casamento foi realizado no sítio do Mato Dentro, propriedade

da família onde já se produzia açúcar. No registro matrimonial consta a portaria de

dispensa de impedimento de segundo grau de consanguinidade, a licença do vigário e

mais a procuração do noivo, apresentada pelo pai da noiva. Compareceram à cerimônia

o tio da noiva e do noivo, padre José Francisco de Aranha Barreto de Camargo,

proprietário da fazenda e engenho Atibaia (Solar dos Aranha de Camargo), com área

de 2.247 alqueires de terras (extensão declarada em 1818), que são herdadas por

Joaquim Policarpo Aranha (Barão de Itapura) e Manoel Carlos Aranha (Barão de

Anhumas), prováveis filhos do padre José Francisco de Aranha Barreto de Camargo,

e que se casam com duas filhas de Francisco Egydio de Souza Aranha e Maria Luzia,

Libânia e Anna Tereza.

Joaquim Policarpo Aranha casou-se aos 35 anos com Libânia de Souza Aranha,

sua prima de segundo grau (MOYA, 1941, p.63), com a qual teve 6 herdeiros: Joaquim

Policarpo Aranha Filho, Olímpio de Souza Aranha, Manoel Carlos de Souza Aranha

Sobrinho, José Francisco de Souza Aranha, Alberto Egídio de Souza Aranha e Isolete

Augusta de Souza Aranha. Seu irmão, Manoel Carlos Aranha, também se casa com

sua prima de segundo grau, irmã de Libânia, Anna Tereza de Souza Aranha.

Nota-se a construção de uma “poderosa teia clânica” e a estratégia de dilatação

das fortunas, decorrente de matrimônios entre familiares, consolidando bens e

garantindo-os para gerações posteriores, como forma de manter a “hegemonia política

de controle do poder local e do seu patrimônio econômico” (LAPA, 1995 p.111).

Joaquim Policarpo Aranha foi Membro da Guarda Nacional, possuindo a patente

de Capitão, e vereador da Câmara de Campinas entre 1845 e 1848, aliado ao Partido

Liberal. Participou da organização da visita do Imperador Dom Pedro II à cidade de

Campinas em 1886 (LAPA,1995, p. 101) e recebeu em 1883, do Governo Imperial a

condecoração de Comendador da Imperial Ordem da Rosa, e o título de primeiro e

único Barão de Itapura.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 31

3 | AS FAZENDAS DAS FAMÍLIA DO BARÃO DE ITATIBA E DO BARÃO DE

ITAPURA

O português e Capitão-Mor Inácio Ferreira de Sá recebeu terras do governo

português em 06 de outubro de 1796 na então vila de Jundiaí, na parte do seu território

que em 1797 passaria a ser a Vila de São Carlos, futura cidade de Campinas. Seu

filho, Joaquim Ferreira Penteado, futuro Barão de Itatiba, mudou-se para Campinas

aos 22 anos de idade, onde se tornou um fazendeiro abastado, proprietário de várias

fazendas. Sua fortuna foi dilatada pelo casamento com Francisca de Paula Camargo,

filha de Floriano de Camargo Penteado, que também havia sido Capitão-Mor de

Campinas e proprietário de vários latifúndios.

Boa parte da fortuna acumulada pelo Barão de Itatiba foi oriunda das propriedades

de Floriano de Camargo Penteado, pai da baronesa e tio avô do barão. A outra parte

da fortuna do Barão de Itatiba foi herança do seu pai, o Capitão Ignácio Ferreira de Sá.

Floriano de Camargo Penteado (1792-1830), capitão-mor da Vila de São Carlos,

possuía grandes propriedades rurais em Campinas. Adquiriu o Engenho de Nossa

Senhora da Conceição do Sertão em 1820, que daria origem à Fazenda Sertão,

posteriormente produtora

,

de café. Também adquiriu por compra o Sítio Cabras, que

pertencia ao Brigadeiro José Joaquim da Costa Galvão, que ali possuía criação. Por

volta de 1830, este sítio já pertencia a Floriano de Camargo Penteado e encontrava-

se sem nenhuma benfeitoria, nem mesmo as suas pastagens eram utilizadas o gado.

Também foram propriedades de Floriano de Camargo Penteado o Sítio Duas Pontes,

o Sítio Ponte Alta, o Sítio São Bento, o Sítio Cachoeira e o Engenho Jaguary.

Com relação às propriedades rurais do Barão de Itapura, destaca-se a Fazenda

Atibaia, conhecida como Solar dos Aranha de Camargo, fundada pelo Padre José

Francisco Aranha Barreto de Camargo e transmitida por herança ao Barão de Itapura e

a seu irmão, Manoel Carlos Aranha, em 1839. Implantada na margem esquerda do Rio

Atibaia, em suas terras se ergueu um dos “grandes solares do açúcar” (PUPO,1983,

p.166) que mais tarde, passa a propriedade plena de Joaquim Policarpo Aranha e

se converte em fazenda cafeeira. O Padre Aranha também legou aos irmãos o

engenho e fazenda Pau d’Alho, em 1839. A Fazenda Recreio, foi herdada de Joaquim

Paulino Barbosa, pelo Barão de Itapura, em 1852, sendo uma unidade construída

exclusivamente para a cultura cafeeira que “em 1885 tinha 150 mil pés de café em

terra vermelha, com máquina de benefício a vapor e terreiro de terra” (PUPO,1983

p.189).

As propriedades rurais adquiridas por compra pelo Barão de Itapura são: o sítio

Jaguari, a Fazenda Dois Córregos, situada no atual município de Valinhos (PUPO, 1983

p.179), a Fazenda Chapadão, localizada em Campinas, em atual área pertencente ao

exército e um dos maiores exemplares de produção cafeeira do município, a Fazenda

Bom Retiro, localizada próxima ao atual município de Pedreira, próxima ao atual

bairro Carlos Gomes, a Fazenda Santa Thereza, em Campinas e a fazenda Velha, em

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 32

Americana.

Figura 1: Mapa do Município de Campinas de 1929. Destacam-se entre os rios Atibaia e Jaguari

as regiões denominadas por Pupo (1983) como Alto Atibaia, Médio Atibaia e Baixo Atibaia. Em

vermelho destacam-se as sedes das fazendas do Barão de Itapura e em verde as sedes das

fazendas do Barão de Itatiba.

Fonte: Arquivo Municipal de Campinas. Imagem original manipulada por Ana Beatris Fernandes Menegaldo.

A Figura 1, demonstra a divisão das terras ao longo do Rio Atibaia proposta por

Pupo (1983) e a localização das sedes das fazendas que eram propriedades do Barão

de Itatiba e do Barão de Itapura em Campinas.

4 | AS CASAS URBANAS DO BARÃO DE ITATIBA E DO BARÃO DE ITAPURA

A produção das edificações urbanas – a casa senhorial - dos grandes senhores

de engenho e cafeicultores da região de Campinas é entendida como uma casa de

morada desta nobreza e alta burguesia que se formou no período e seu entendimento

deve focar os múltiplos aspectos da sua arquitetura, de suas técnicas construtivas, de

seus programas distributivos e de sua ornamentação.

O estudo comparativo de dois exemplares de casas senhoriais urbanas de

Campinas, construídas pelos dois barões do café, se apoia na análise direta dos

edifícios, que ainda hoje mantêm um grau de integridade física, somado à documentação

existente sobre os mesmos.

O Palácio dos Azulejos, construído em 1878 por Joaquim Ferreira Penteado,

o Barão de Itatiba é atribuído ao construtor português Manoel Gonçalves da Silva

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 33

Cantarino, foi tombado nas instâncias federal, estadual e municipal e atualmente

abriga o Museu da Imagem e do Som (MIS) de Campinas. O Palácio Itapura, de

Joaquim Policarpo Aranha, o Barão de Itapura, iniciado em 1880 e concluído em 1883,

pelo construtor e prático italiano, Luigi Pucci, foi tombado nas instâncias estadual e

municipal e, atualmente, faz parte do patrimônio da PUC Campinas, encontrando-se

em processo de restauração.

Segundo a Monografia Histórica do Município de Campinas (IBGE, 1952, p. 83),

os Barões de Itatiba passavam a maior parte dos seus dias nas suas casas rurais

e afluíam à casa urbana, para realizar, entre outras atividades, seus negócios. Esta

forma de morar, urbana e rural, revela aspectos da sociedade campineira do período.

O estudo do casario senhorial urbano que estes abastados produtores agrícolas

construíram permite observar o processo de modernização urbana e o modo de morar

que a aristocracia de terras e a emergente burguesia almejavam. Também é possível

analisar a circulação de ideias e suas relações com os padrões culturais europeus na

produção de uma arquitetura que se transformava, tanto na adoção de novas técnicas

construtivas como nos modernos estilos arquitetônicos.

A casa senhorial urbana de Joaquim Ferreira Penteado e Francisca de Paula

Camargo, os Barões de Itatiba, conjugava a residência dos barões e de uma de suas

filhas, Francisca Ferreira de Camargo Andrade casada com Antônio Carlos Pacheco

Silva. O imóvel caracteriza-se por ser um caso singular de duas residências que

compuseram um conjunto único, de grande destaque urbano, vindo daí a denominação

popular de Palácio dos Azulejos.

Embora os dois exemplares tenham sido construídos por representantes de

uma mesma classe social e num curto intervalo de tempo, sua comparação aponta

permanências e inovações. Quanto a localização, enquanto a casa do Barão de Itapura

foi construída em uma chácara, próxima à Matriz Velha, primeiro núcleo urbano de

Campinas, o sobrado de Joaquim Ferreira Penteado foi construído ao lado da Matriz

Nova, eixo de expansão da cidade. A Figura 2 demonstra a inserção das duas casas

senhoriais no núcleo urbano e evidencia a extensão da chácara do Barão de Itapura.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 34

Figura 2: Planta de Campinas de 1916. Destaca-se em vermelho as casas urbanas do Barão de

Itapura e do Barão de Itatiba. A área da chácara do Barão de Itapura em verde.

Fonte: SEPLAMA Arquivo da Prefeitura Municipal de Campinas. Imagem original manipulada por Ana Beatris

Fernandes Menegaldo.

Na forma de implantação, o Palácio dos Azulejos, construído em uma esquina,

mantém suas fachadas rigorosamente nos alinhamentos do lote, formando um jardim

interno. O conjunto formado pelas duas residências, do casal de barões e de sua filha,

se alinha na quadra de forma contínua.

Figura 3: À esquerda, o sobrado do Barão de Itatiba destacando a implantação na esquina e

o alinhamento da construção aos limites do lote urbano. À direita, detalhe do revestimento da

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 35

fachada do Sobrado do Barão de Itatiba.

Fonte: Coleção Particular Maria Luiza Pinto de Moura. (TONON, 2003, p. 107) e

identidade-arquitetonica/palacio-dos-azulejos/> Acesso em maio de 2017.

Já a implantação da casa do Barão de Itapura, embora também construído

em uma esquina, mantém a fachada no alinhamento do lote sendo a lateral aberta

para um amplo jardim, ornado com palmeiras imperiais. (Figura 4). A chácara estava

localizada em um dos limites do perímetro urbano de então, o que permitia que a família

desfrutasse da proximidade do núcleo urbano e do conforto de dispor do amplo terreno

de uma chácara, provida de pomar, cavalariças e área de pastagem. A extensão do

terreno viabilizou a solução do jardim cercado pelo gradil de ferro, que compõe com

uma das fachadas urbanas e também de um jardim interno, protegido dos olhares

externos e articulado aos espaços de uso íntimo de família. Atrás do edifício principal,

havia outras dependências: um pavilhão de dois andares que abrigava serviços, as

cocheiras e depois o imenso pomar com grande número de árvores frutíferas.

Figura 4 : Residência do Barão de Itapura: à esquerda, fachada para a Rua Marechal Deodoro,

antiga Rua do Imperador; à direita, fachada para a Av. Francisco Glicério, Jardim lateral com

palmeiras imperiais

Fontes:

,

Acesso em maio de 2017.

Acesso em maio de 2017.

A análise dos programa e dos uso dos espaços revela como o enriquecimento das

famílias, ligadas à lavoura de açúcar e do café, se expressa nos espaços domésticos.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 36

Figura 5: Palácio dos Azulejos – À direita, planta Primeiro Pavimento com identificação do

programa e setorização das áreas sociais, íntimas e de serviços. À esquerda, planta do

Pavimento Térreo com identificação do programa e setorização das áreas sociais, íntimas e de

serviços.

Fonte: PUPO, 1983. Imagem original manipulada por Ana Beatris Fernandes Menegaldo.

Quanto ao programa e sua organização, os sobrados geminados do Barão

de Itatiba e de sua filha (Figura 5) são compostos de dois níveis: térreo e primeiro

pavimento; sendo organizados de forma similar em relação ao programa. Os

vestíbulos definiram novos critérios de circulação dentro das casas dando acesso às

salas, todas com seus respectivos quartos. Nos vestíbulos encontram-se escadas que

davam acesso ao primeiro pavimento e foram construídas de madeiras nobres, com

patamares finamente marchetados; suas paredes foram ricamente ornamentadas com

pinturas e possuem claraboias que as iluminam. (Figura 6)

Do ponto de vista do programa destes sobrados, encontram-se as salas

reservadas ao convívio social, sendo que a primeira sala da frente, no pavimento

térreo do solar do Barão de Itatiba, parece ter sido especialmente reservada para

receber os visitantes, pois seu acabamento é bastante requintado, apresentando teto

forrado com madeira, ornamentação com pinturas florais, piso marchetado com o uso

de diversas madeiras.

Num segundo plano encontram-se os quartos no pavimento térreo e superior; e

atravessando a casa no pavimento superior estavam localizadas a salas de jantar e as

varandas, local de refeições e permanência da família. No fundo do edifício estavam

as cozinhas e áreas de serviço das casas com cômodos reservados aos escravos ou

criados brancos que provavelmente dormiam ali (TONON, 2003, p.123).

Estas residências não eram servidas de água encanada, não possuíam,

portanto, instalação sanitária. No fundo do lote havia um jardim onde estava instalada

a cavalariça, pois desde 1870, “já era comum os carros de tipo europeu, como troles

e charretes, vitórias, tilburis e as diligências” que transportavam pessoas e suas

bagagens (TONON, 2003: p.124).

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 37

Figura 6: Palácio dos Azulejos – Vestíbulo. Detalhes da escada e do piso de marchetaria no

patamar da escada.

Fonte: Thaina Isabela Silva.

Com relação ao programa e sua organização, casa do Barão de Itapura é composta

de três níveis: rés-do-chão, pavimento térreo e primeiro pavimento. (Figura 7) No

primeiro pavimento, a partir de dois terraços dispostos simetricamente, se descortinava

a vista dos limites da cidade então. O pavimento denominado por Benedito Octavio

(1921) como rés-do-chão se organiza na parte frontal com um porão para ventilação

e o corpo lateral, abrigava os serviços e dependências para escravos domésticos. No

pavimento térreo, o vestíbulo com sua majestosa escada organizava os fluxos para as

áreas sociais e íntimas da casa. O mármore não foi poupado, reveste os pavimentos e

escadarias do vestíbulo e da sala que dá ingresso tanto para os cômodos do primeiro

quanto para os do segundo andar.

No pavimento térreo, a sala de visitas à esquerda com belas colunas coríntias

e ricos espelhos. Contígua ao vestíbulo, a sala de jantar, com vista, para o jardim

interno, com rica ornamentação de pinturas no forro e nas paredes. No corpo lateral

à esquerda, após uma longa galeria coberta e gradeada prosseguem os quartos e

outros cômodos, até uma bela sala íntima de perfeito acabamento, com forro de tecido.

A escada de serviço garante a separação dos fluxos da família, escravos e criados.

No primeiro pavimento, existe uma área de passagem para os terraços, a que se

chega pela grandiosa escada de mármore do vestíbulo. Vê-se à direita outra grande

sala e do lado oposto, continuam os cômodos e quartos desse andar.

Figura 7: Residência do Barão de Itapura – À esquerda, planta do Pavimento Rés-do-Chão,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 38

ao centro Planta do Pavimento Térreo, à direita, Planta do Primeiro Pavimento, todas com

identificação do programa e setorização das áreas sociais, íntimas e de serviços.

Fonte: OCTAVIO, Benedito. “O Palacete de Itapura – Campinas”. Correio Paulistano. Campinas, 30 de abril de

1921. Imagem original manipulada por Ana Beatris Fernandes Menegaldo.

Mas é na análise da técnica construtiva e da ornamentação que se revelam as

principais diferenças entre os dois exemplares: enquanto a casa do Barão de Itatiba

emprega a taipa de pilão “encamisada” por tijolos e a taipa de mão, além do uso

dos azulejos da tradição portuguesa, a casa do Barão de Itapura foi construída,

exclusivamente, em alvenaria de tijolos, empregando as modenaturas da tratadística

clássica como elementos de ornamentação das fachadas. (Figura 8)

Na casa da família do Barão de Itatiba, a maioria das paredes mestras do

pavimento térreo foi edificada em taipa de pilão encamisada com tijolos e alicerçadas

em pedras; as paredes externas do pavimento superior foram levantadas em tijolos

enquanto as suas paredes internas foram construídas em taipa de mão.

Figura 8: À esquerda, sobrado do Barão de Itatiba: detalhe construtivo de uma das paredes

construída em taipa de pilão que encontra outra parede construída com a mesma técnica e

encamisada com tijolos. À direita, residência do Barão de Itapura. Detalhe do alpendre junto ao

jardim interno. Destaque para as abobadilhas de alvenaria de tijolos com vigas metálicas e para

os elementos de ferro como gradis e colunelas Fonte: Thaina Isabela Silva e Leonardo Rosa.

Um grande destaque na construção da casa urbana do Barão de Itatiba, dando-

lhe requinte e imponência, foi a aplicação na fachada dos azulejos, inclusive na

cimalha que se encontra coroada por louça branca. A utilização de um grande plano

de fachada azulejada no Palácio dos Azulejos “é absolutamente incomum enquanto

caracterização da arquitetura paulista do período, lembrando em alguma medida a

expressão oitocentista do norte do país, os conjuntos neoclássicos de Belém, no

Pará”. (PAULA LEITE e outros, 2001, p. 10)

O uso dos azulejos nas construções, tanto no Brasil como em Portugal, ganham

maior disseminação a partir do século XVIII. No Brasil, eles foram utilizados, sobretudo,

nas igrejas, conventos e colégios religiosos das três grandes e ricas cidades de Salvador,

Recife e Rio de Janeiro, “que deviam gozar de prestígio suficiente para promover

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 39

embelezamento artístico constante, especialmente na velha capital” (TONON, 2003,

p.144).

Em Portugal, no final do século XVIII, difundiu-se o gosto neoclássico caracterizado

pela severidade das linhas e pela depuração decorativa, de espírito oposto ao rococó,

que abrangeu a primeira parte do reinado de D. Maria I. As descobertas arqueológicas

feitas em Pompeia, revelando os afrescos romanos, influenciaram a nova linguagem

decorativa e foram uma das principais fontes de inspiração do neoclássico. A azulejaria

portuguesa adaptou-se à nova linguagem (MECO, 1989, p. 240).

Em Portugal, a azulejaria neoclássica foi utilizada ao longo das três primeiras

décadas do século XIX. Com a implantação do regime constitucional em 1834, a nova

classe social em ascensão, a burguesia liberal, passou a utilizar a azulejaria para fins

utilitários e de demarcação social, o que antes era reservado ao clero e à aristocracia

(MECO, 1989, p. 241).

A partir de meados do século XIX, a criação de novas fábricas e a industrialização

dos

,

azulejos em Portugal permitiram a ampliação da utilização dos azulejos nas

fachadas dos edifícios burgueses transformando-os num destacado contributo de

transformação e enriquecimento urbanos, “muitas vezes associados a balaustradas,

estátuas, bustos, pinhas, vasos, urnas e outros elementos de faiança branca, realizados

nas fábricas do Porto” (MECO, 1989, p. 242).

O uso da azulejaria na construção civil, no Brasil, praticamente se difundiu apenas

no século XIX. Sua utilização no revestimento das fachadas iniciou-se por volta de

1830 e 1840, com a nova camada social que emergia, estendendo-se por todo o Brasil.

“Seu uso teve dupla função: a utilitária, quando trouxe proteção contra a humidade,

herdada do clima tropical e agravada pela salinidade existente nas cidades litorâneas

e a decorativa, tornando-se ostentação do proprietário”. (TONON, 2003, p.144).

[…] foram os construtores brasileiros quem, pela primeira vez, recorreram ao azulejo

para revestimento e proteção das fachadas de templos e sobrados. Tais aplicações

não foram utilizadas em Portugal a não ser, esporadicamente, em muros e paredes

exteriores de jardins e pátios, sempre com uma manifesta intenção decorativa e

voltados discretamente para os interiores (SIMÕES, 1965, p. 35).

A partir das novas relações estabelecidas entre Brasil e Portugal depois de 1822,

os fornecedores europeus de azulejos recorreram à Holanda, Inglaterra, França e

Espanha para fornecer aos construtores brasileiros os produtos. Somente quando

assinado o primeiro tratado de comércio entre o Brasil soberano e Portugal, se retomou

o intercâmbio mercantil, e a clientela brasileira volta a encontrar seus fornecedores

tradicionais (SIMÕES, 1965, p. 36). Sobre o uso da azulejaria nas fachadas em

Portugal, Santos Simões comenta:

São os comerciantes e capitalistas brasileiros que fomentam muitas das indústrias

de Portugal, particularmente as que se desenvolvem depois de 1850 no norte do

País, zona que mantém o ritmo migratório com o Brasil. São ainda os “brasileiros”

regressados a Portugal ou que aqui empregavam seus cabedais em investimentos

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 40

imobiliários que trazem a moda da fachada azulejada característica específica da

chamada “casa de brasileiro” (SIMÕES, 1965, p. 36).

O uso da azulejaria na fachada da casa senhorial urbana do Barão de Itatiba,

em Campinas, constitui uma excepcionalidade em relação ao planalto paulista. Na

cidade de Campinas há registros do uso de azulejos apenas em platibandas de mais

três casarios senhoriais. Os azulejos existentes nas fachadas do pavimento térreo

foram retirados em uma reforma de 1911. Aqueles remanescentes nas fachadas do

pavimento superior e na platibanda são de seis tipos, assentados em tijolos, três do

tipo “tapete” e três do tipo “friso” (TONON, 2003, p.145).

Além do revestimento externo em azulejos do Porto, dentro do antigo solar havia

ornamentos com cristais belgas, lustres franceses e mármore italiano, indicando a

riqueza de seus proprietários.

Como explica Paula Leite:

Outro aspecto bastante peculiar na esfera tipológica é dado pela relação entre

as duas residências que compõem o conjunto, pois sendo espaços privados e

autônomos explicitam a preocupação em configurar uma unidade, um todo, que

não se limita apenas à fachada, mas estende-se também à estrutura do espaço

interno e aos seus elementos ornamentais como forro, piso e à própria escadaria de

acesso. Tal atitude parece conter e explicitar as formas patriarcais de organização

da célula familiar, estruturada a partir de um modelo de referência, de uma imagem

a ser respeitada, multiplicada, mimetizada (LEITE et. al., 2001, p. 10-11).

5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS

A produção destes dois exemplares do casario senhorial urbano contribuiu para

o “embelezamento” de Campinas e sua produção obedeceu às regras do decoro, em

conformidade com a posição social e econômica de seus proprietários. Tais exemplares

se alinham com a arquitetura erudita da Corte no Rio de Janeiro e com a tratadística

que circulava nas mãos de arquitetos e construtores práticos.

No final do século XIX em Campinas, a tradição construtiva que emprega as

técnicas de taipa associadas ao uso da alvenaria de tijolos coexiste com emprego

exclusivo da alvenaria de tijolos. Nossa hipótese é que a escolha da técnica construtiva

se relaciona à origem dos construtores das casas, no caso do sobrado do Barão de

Itatiba, o português Cantarino faz uso da taipa e dos azulejos e, no caso da residência

do Barão de Itapura, o construtor italiano Luigi Pucci emprega a alvenaria de tijolos e

elementos da tratadística clássica.

REFERÊNCIAS

OCTAVIO, Benedito. O Palacete de Itapura – Campinas. Correio Paulistano. Campinas, 30 de abril

de 1921. Disponível em: http://memoria.bn.br . Acesso em 29 de março de 2016.

IBGE. Monografia Histórica do Município de Campinas. Rio de Janeiro: Fundação IBGE, 1952.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 41

LAPA, José Roberto do Amaral. A Cidade: os cantos e os antros. Campinas 1850-1900. São Paulo:

Ed. da Universidade de São Paulo, 1995.

MECO, José. A Azulejaria em Portugal. Lisboa: Publicações Alfa, 1989.

MOYA, Salvador de. Annuario Genealógico Brasileiro. São Paulo: Publicações do Instituto

Genealógico Brasileiro Ano III,1941.

LEITE, Paula; et al.. Palácio dos Azulejos: Inventário do Patrimônio Arquitetônico de Campinas.

Monografia. Disciplina Arquitetura no Brasil, FAU PUC Campinas, 2001.

PETRONE, Maria Thereza Schorer. A lavoura canavieira em São Paulo – expansão e declínio.

São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1968.

PUPO, Celso Maria de Mello. Campinas, Município no Império. São Paulo: Imprensa Oficial do

Estado S.A, 1983.

RIBEIRO, Maria Alice Rosa. Açúcar, café, escravos e dinheiro a prêmio: Campinas, 1817-1861.

Revista Resgate, Campinas, v. XXIII, n. 29, p. 15-40, jan-jun 2015.

SIMÕES, João Miguel Santos. A azulejaria Portuguesa no Brasil (1500-1822). Lisboa: Fundação

Calouste Gulbenkian, 1965.

TONON, Maria Joana. Palácio dos Azulejos: de Residência à Paço Municipal – 1878 – 1968.

Dissertação de Mestrado em História. IFCH UNICAMP, 2003.

Sites consultados:

http://iabcampinas.org.br/identidade-arquitetonica/palacio-dos-azulejos/

http://iabcampinas.org.br/identidade-arquitetonica/solar-do-barao-de-itapura/

http://www.campinasdeantigamente.com.br/2014/08/solar-barao-de-itapura.html

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 42

EXPERIMENTAÇÕES ARQUITETÔNICAS COMO

PROCESSO PROJETUAL E DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 4

doi

Sasquia Hizuru Obata

Universidade Presbiteriana Mackenzie, Faculdade

de Arquitetura e Urbanismo

São Paulo - SP

Carolina de Rezende Maciel

Universidade Presbiteriana Mackenzie, Faculdade

de Arquitetura e Urbanismo

São Paulo - SP

Milton Vilhena Granado Júnior

Universidade Presbiteriana Mackenzie, Faculdade

de Arquitetura e Urbanismo

São Paulo – SP

RESUMO: O presente artigo tem por

objetivo apresentar e descrever o método

de experimentação visando a concepção

arquitetônica como etapa para a evolução do

processo projetivo e baseado em dados obtidos

de maneira empírica. Foram apresentados 3

diferentes estudos de caso de experimentos

desenvolvidos por alunos do 9° e 10° do curso

de graduação em Arquitetura e Urbanismo

da Universidade Presbiteriana Mackenzie,

abrangendo os temas: Sistemas estruturais,

Acústica e Estudos de insolação. Por fim, a

prática da experimentação destaca ainda a

possibilidade de desenvolver os trabalhos de

graduação com a inter-relação com outras

faculdades da universidade, de forma a

que instituições distintas possam contribuir

para o mesmo objetivo: o aprimoramento do

conhecimento e sua disseminação, ou seja, o

conceito de UNIVERSIDADE.

PALAVRAS-CHAVE: Experimentação;

processo criativo; processo projetual;

arquitetura.

ARCHITECTURAL EXPERIMENTS AS A

PROJECT AND LEARNING PROCESS

ABSTRACT: The purpose of this paper

,

is to

present and describe the method of architectural

experimentation as stage for the evolution of the

design process and based on data obtained in

an empirical way. Three different case studies of

experiments developed by students of the 9th and

10th semesters of the Architecture and Urbanism

undergraduate program at the Universidade

Presbiteriana Mackenzie, covering the themes:

Structural systems, Acoustics and Shading &

Insolation Studies were presented. Finally, the

practice of experimentation also highlights the

possibility of developing undergraduate studies

with the interrelation with other faculties of

the university, so that different institutions can

contribute to the same goal: the improvement of

knowledge and its dissemination, or the concept

of UNIVERSITY.

KEYWORDS: Experimentation; creative

process; design process; architecture.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 43

1 | INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo apresentar e descrever o método de

experimentação visando a concepção arquitetônica como etapa para a evolução do

processo projetivo e baseado em dados obtidos de maneira empírica.

Como abordagem para este artigo adotou-se o contexto do processo projetivo

realizado durante o trabalho dos dois últimos semestres, 9o e 10o, da graduação no curso

de arquitetura e urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie e as estratégias

didático-pedagógicas desenvolvidas nas disciplinas denominadas “Experimentações”.

No desenvolvimento do referido componente curricular, os alunos são instigados a

adotarem uma abordagem transdisciplinar, de modo a questionar conhecimentos

apresentados ao longo do curso, enriquecendo o debate e a construção do processo

projetual.

Diz-se estratégias didático-pedagógicas como sendo a busca de maior

aderência e constantes rebatimentos que são tomados da prática de experimentação

como processo projetual e apresentados aos formandos pelos recursos publicados

e dinâmicos dos sites de arquitetos e escritórios que utilizam experimentação como

etapa de desenvolvimento, para os quais se tomam como exemplos Antoni Gaudí,

Norman Foster, Decker Yeadon, Studio Gang, Doris Kim Sung, Bjarke Ingels Group e

também as publicações de Frei Otto.

Portanto, se coloca como conjuntura aos formandos a necessidade de investigar

e se tomar o processo de projeto como uma evolução que tem como estratégia os

tensionamentos e busca por novas formas de desenvolvimento, bem como, como etapa

que tem como princípio o desejo e necessidade pela formação de novos métodos que

conduzam a novas tecnologias, maiores eficiências e inovações.

O exercício de experimentações exige habilidades no uso de conceitos

integrativos diversos como: exercício mão na massa, soluções de problemas, solução

por aprendizado invertido, do caos a forma, entre outros que visam fornecer melhores

desenvolvimentos, caracterizações do resultados e argumentos, além das entregas

de soluções, produtos e processos do projeto, ou seja, o arcabouço que delimita a

tecnologia em experimentações.

2 | EXPERIMENTAÇÃO COMO PROCESSO DE PROJETOS

Tomando-se que a tecnologia é a ciência da técnica e de modo evolutivo que

gera as novas tecnologias, toma-se neste artigo que o fazer das ações didático-

pedagógicas é uma prática contínua da ciência da técnica.

Segundo Coronel e Silva (2010, p. 182) as tecnologias, assim como, as novas,

partem de instrumentos lógicos e materiais indispensáveis de uma nova realização e

para o desenvolvimento científico, tratando-se de um fazer intrincado da superação

de obstáculos e busca de inovações e como se apresenta nas disciplinas base deste

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 44

artigo.

As tecnologias em experimentações são de longa data aderentes ao projetar e

aos produtos da construção e urbanismo, como históricos relatos apresentados por

Addis (2009), desde 450 A.C. até dias atuais.

De Addis (2009, p.610) pode-se classificar os métodos e regras projetuais em

que a experimentações e experiências partem do empirismo puro, situações mistas,

até a busca do desconhecido e sem parâmetros basilares, mas sob uma metodologia

de pesquisa como a regra para o desvendar.

As regras de projetos empíricas, baseadas na experiência prática, contém

a experiência coletiva, permitindo aos usuários interpolar dentro de diferentes

experiências e, até certo ponto, extrapolá-las. Regras empíricas não se baseiam em

conhecimentos científicos ou na explanação de fenômenos, mas funcionam.

As regras de projetos consolidadas também se baseiam na experiência, mas

incorporam alguns entendimentos e explanações científicas. Elas incluem constantes

empíricas sempre que necessário. Tais regras geram o que os engenheiros do século

XIX chamavam de propriedades ou valores relativos.

As regras de projeto científicas baseiam em uma incorporação e explanação

totalmente científica dos fenômenos relevantes. Em geral, não exigem o uso de

constantes empíricas para lidar com fenômenos não-explicados. Os engenheiros

do século XX se referiam o resultado de tais regras como propriedades ou valores

absolutos. A maior parte das regras de projetos modernas é deste tipo. (ADDIS, 2009,

p.610)

As regras de projetos a cada nova exigência passam por estágios que aumentam

as regras de projetos ditas por Addis (2009) como a especificação do desempenho

técnico em termos quantitativos, a compreensão do efeito da escala nas maquetes

físicas e as relações de não linearidades e o usos de fatores de segurança.

De certo há que se ver que experimentações e processos de projetos empíricos

– enquanto prática, possuem simplificações e com certeza sempre estarão envoltos

com outras constantes empíricas que estão atreladas aos próprios passos de

desenvolvimentos de produtos que clientes os queiram ou produtos como processos

que os permitam serem mais eficientes, mais sustentáveis, mais flexíveis ou mesmo

como um projeto inteligente.

De certo a evolução das experimentações poderia ser dita como antes e depois

do computador e as bases da materialização das experimentações também as são e

passam por crescentes evoluções que em entregas de produtos são chamadas como

produção em 4.0 – cunhada dos meios produtivos automatizados e autônomos – CNC,

computer numerical control.

As tecnologias de materializações computacionais nas etapas projetuais são cada

vez mais reconhecidas e como de maior valor segundo Burry e Burry (2017 p. 18) por

emular qualidades finais, desempenho através de medições e análises quantitativas

desde as condições estruturais às características térmicas, acústicas, relações

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 45

lumínicas, e de fato se ter uma materialidade para se questionar seus propósitos e

prover um background robusto enquanto se é um protótipo.

Neste sentido, a seguir serão apresentados arquitetos e escritórios que se valem

de práticas de experimentação como etapa para a concepção e aprimoramento das

soluções arquitetônicas.

Antoni Gaudí

A arquitetura proposta por Antoni Gaudí beneficiou-se muito de sua capacidade

de experimentação. Composta de complexos volumes definidos a partir de sólidos e

formas geométricas simples ora trabalhos com adição, ora subtração ou interseções

entre planos, abrindo uma vasta gama de possibilidades (ALMEIDA, 2011). Seu

processo criativo era originado por demandas funcionais, passando por um estudo de

viabilidade econômica e da técnica construtiva, finalizando em uma fase experimental,

geralmente por meio de maquetes físicas, em escala 1:10 ou 1:20.

Figura 1: (a) Experimentos de Antoni Gaudí com sacos de areia; (b) Mesma imagem invertida

em relação ao eixo horizontal

Fonte: ALMEIDA (2011)

Na Figura 1 é apresentado um exemplo de experimentação elaborado por Antoni

Gaudí, para o projeto da Sagrada Família. Com base na tecnologia existente, explica

Almeida (2011):

Gaudí fez uso dos gráficos funiculares,

,

compostos de sacos de areia e cordas,

para conceber e extrair a configuração ótima da estrutura, resultando no que se pode

ver hoje, as colunas e os arcos presentes em toda a basílica. (ALMEIDA, 2011, p. 21).

A concepção livre e experimental de Gaudí, afirma Giralt (2002), o levou a refletir

constantemente sobre seu trabalho, recorrendo a métodos tradicionais sempre que lhe

parecia válido e buscando soluções calcadas em saber construtivo, lógica estrutural e

criatividade geométrica, resultando em uma arquitetura singular.

Foster+Partners (Sir Norman Foster)

Liderado pelo arquiteto Norman Foster, o Foster+Partners possui uma cultura de

pesquisa e inovação por meio da experimentação. O escritório possui um departamento

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 46

dedicado ao desenvolvimento de pesquisas nas áreas de ARD - Applied Research and

Development, MRC e IC - Materials Research Centre and Information Centre e SMG

- Specialist Modelling Group. Abaixo são apresentadas imagens do 30 St Mary Axe

(Figura 2), projeto no qual as experimentações tiveram importante papel na definição

dos sistemas estruturais e na avaliação do impacto dos níveis de ventilação do entorno

após sua implantação.

Figura 2: Experimentações para o 30 St Mary Axe – Foster+Partners

Fonte: Foster+Partners (2004), disponível em< https://www.fosterandpartners.com/projects/30-

st-mary-axe/>

Além do supracitado projeto, datado de 2004, Norman Foster fez mais contribuição

à cultura de experimentação com a abertura da Norman Foster Foundation, em Madrid,

no ano de 2017. Sua missão, de acordo com informações do site da Fundação (http://

www.normanfosterfoundation.org) é:

Promover o pensamento e pesquisa interdisciplinar para auxiliar novas gerações

de arquitetos, designer e urbanistas a antecipar o futuro. A Fundação acredita na

importância da conexão entre arquitetura, design tecnologia e artes para melhor

servirem à sociedade, e está comprometida com os valores de uma educação holística

que encoraja a experimentação por meio de pesquisas e projetos. (NORMAN FOSTER

FOUNDATION, 2017).

BIG (Bjarke Ingels Group)

O escritório BIG, sediado na cidade de Copenhagen na Dinamarca, foi fundado

pelo arquiteto Bjarke Ingels em 2006. Em seu livro de 2009 “YES IS MORE”, Ingels

propõe que, no lugar de uma “revolução” arquitetônica, exista uma “evolução”,

aprimorada a partir de experimentações que considerem aspectos estéticos e

funcionais de diferentes projetos, ajustando-os de acordo com o programa, contexto

climático, a finalidade, aspectos econômicos, entre outros.

Na Figura 3 são apresentados modelos físicos resultantes do processo criativo,

baseado na abundância de propostas para posterior análise e “seleção natural”, com

o objetivo de definir a melhor solução para cada contexto. Neste sentido Ingels afirma:

Assim como Darwin descreve um a criação como um processo de excesso e

seleção, não propomos que as forças da sociedade, os múltiplos interesses de todos,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 47

decidam quais ideias devem viver e quais devem morrer. As ideias sobreviventes

evoluem através de mutações e de cruzamentos, até se converterem em espécies

de arquitetura totalmente novas. Com a invenção da arquitetura e da tecnologia, nós

apreendemos o poder de adaptar nossos ambientes para o jeito que queremos viver.

(INGELS, 2009, p.14).

Figura 3: Processo projetual evolutivo do BIG, com a sobrevivência da melhor (mais

adequada) solução para o contexto considerado.

Fonte: INGELS (2009)

Frei Otto

Para Frei Otto, experimentação com modelos e maquetes era uma parte

fundamental de seu trabalho como arquiteto. Sua obra foi marcada pelo espírito

investigativo e trabalho pioneiro utilizando bolhas de sabão (Figura 4) que resultou em

importantes contribuições para o projeto de estruturas leves e tensionadas:

O desenvolvimento de edifícios teve início há mais de dez mil anos e atingiu um

nível extremamente alto, mas de forma alguma é um processo fechado. Ainda existe

um número infinito de possibilidades abertas, de infinitas descobertas a serem feitas,

(OTTO, 2010).

Suas experimentações se procederam inicialmente com barras de aço e madeira

em duplas curvaturas, para a formação com tecidos, ao estudo de atender as curvas

que poderiam gerar as tensões mínimas através da obtenção das curvas pelas bolhas

de sabão. Estas curvas quando plotadas ou fotografadas conduziram a modelos

matemáticos que foram automatizados, chegando-se aos modelos atuais, totalmente

computadorizados e de definição não só de tensões como de parametrizações e feitura

de partes definidas e produzidas computacionalmente.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 48

Figura 4: (a) Experimentos com bolhas de sabão; (b) Aplicação na cobertura do Estádio

Olímpico de Munique (1972)

Fonte: OTTO (2010)

3 | PROCEDIMENTOS E METODOLOGIA PARA EXPERIMENTOS E SIMULAÇÕES

Para o desenvolvimento deste artigo procurou-se primeiramente a compilação

dos fundamentos teóricos e vistas aos planos e estratégias utilizadas pelos autores em

suas disciplinas de experimentações, descritos sob forma dos seguintes procedimentos:

1) Seleção e definição de metodologia que abarcava as formas praticadas e

consequente descrição de etapas;

2) Seleção dos conteúdos teóricos que suportavam os conteúdos e apresentações

desenvolvidas em aulas dos 9° e 10° semestres.

3) Seleção e descrição de quatro trabalhos orientados pelos autores e consultados

na biblioteca de experimentos FAU-Mackenzie, tendo como prévios aqueles que

atenderam como representativos da superação de etapas projetuais pelas experiências

não desenvolvidas durante os anos anteriores do curso e, portanto, demonstram o

vencer um obstáculo de forma protagonista.

4) Análises dos resultados dos trabalhos descritos e caracterizações das

orientações que sejam de contribuições na proposição de estruturas didáticos-

pedagógicas para as experimentações arquitetônicas e que estas sejam integradas

ao processo projetual e de aprendizagem.

Portanto este artigo tem por contribuição a proposição que a utilização de

experimentações projetuais como forma de evolução do projeto e do aprendizado,

tendo o processo de projetar como veículo que pode e deve suportar novos processos

e técnicas de ensino-aprendizagem, bem como, de formas que sejam além dos

conteúdos praticados em sala de aula e também possa ser de desafio trazer no fazer

de um trabalho de graduação uma forma de experimentar inclusive como profissionais

o fazem - dados exemplos de cronologia da evolução por experimentações.

Como processo de aprendizagem sobre a metodologia para experimentos e

simulações parte-se de um roteiro mais genérico e batizado em aula de “DO MICRO

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 49

AO MACRO – Os 12 PRINCÍPIOS” (Figura 5) que foram inspirados no artigo “The

Vision for Civil Engineering in 2025” da American Society of Civil Engineers (ASCE,

2007).

Figura 5: Roteiro “Do micro ao macro” para desenvolvimento de experimentos e

simulações.

Fonte: Autoria própria.

Tais passos são importantes como formação holística, mas como desenvolvimento

de experimentos e simulações aderentes a área das construções e urbanismo são

apresentadas etapas da evolução de um projeto e alguns parâmetros para decisão.

Dentro das etapas iniciais de um projeto arquitetônico e/ou urbanístico,

na concepção é comum se desenvolver estudos de modelos e de massa que por

experimentos e simulações podem apresentar condições de necessidade de maiores

evoluções ou mesmo uma nova coleta de dados e inserção de novos atributos ao

projeto.

O estudo de massa se refere a uma parte essencial na tomada de decisão no

desenvolvimento de um empreendimento imobiliário que é a sua concepção como

produto que atenda aos desempenhos requeridos e adequados durante seu ciclo de

vida. Como atividade podem ser

,

elencados segundo Obata (2015, p.43) através de

alguns atributos como:

• Auxiliar na escolha, composição e aquisição do terreno, na definição de seu

uso, dos produtos e tipologias a serem construídas.

• Parte de uma análise da legislação do local, conhecimento do entorno, ne-

cessidades do mercado, alternativas de implantação.

• Trata-se de uma ferramenta de viabilização e capaz de conduzir e conside-

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 50

rar as características necessárias para o um empreendimento imobiliário se

tornar possível, com menores riscos e maiores chances de sucesso.

• Ser o conjunto de esboços e informações representadas por dados essen-

ciais e que possam fornecer em pouco tempo uma definição essencial quan-

to ao atendimento de desempenho requerido e eficiência energética que

tem como respostas ao mercado fornecer preliminarmente o custo da cons-

trução que servirá de base durante o processo de projeto e contratos.

Para as etapas de modelagem como um processo de simulações do modelo

que, no início do projeto é representada por um volume definido por especificações

preliminares, denominado de massa, é preciso destacar que há que se identificar as

atividades estabelecendo as relações de precedência entre as atividades, ou seja, como

se realiza a gestão do processo projetual que depende da identificação das informações,

sejam elas: para o próprio desenvolvimento das atividades, para a modelagem como

dados do produto e as informações que possibilitarão o desencadeamento do fluxo do

projeto.

Os métodos de modelagem e identificados como métodos de parametrização

por Obata (2015, p.42) são baseados em obtenção de dados e prioridades que visam

fornecer as seguintes condições:

• Entrega de maior quantidade de itens de valor como, por exemplo, o atendi-

mento econômico do melhor preço (competitivo).

• Equilíbrio entre extremos aplicando-se diretrizes de Engenharia de Custos.

• Engenharia de custos e estimativas têm como base uma coleta completa

de dados e anseios como, por exemplo: a eficiência energética, a busca por

certificações verdes, selos de eficiências, entre outros.

4 | EXPERIMENTOS E SIMULAÇÕES - CASOS E RESULTADOS

No curso da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana

Mackenzie, o 10º semestre tem como uma das finalidades a apresentação de

experimentos que representem de alguma forma os conhecimentos obtidos ao longo

dos 10 semestres.

Assim, o componente disciplinar TFG 4-2 trata do desenvolvimento de trabalhos

finais de graduação. Os alunos deverão demonstrar por meio desses experimentos os

conceitos apreendidos nas áreas técnicas ministrados no curso

Dessa forma, e por opção própria, devem desenvolver experimentos que lhes

permita avaliar as propostas de projeto, baseados no conhecimento do assunto

conceitualmente, sem a necessidade de uso de equipamentos muito sofisticados

de laboratórios. A própria concepção do experimento de forma empírica faz parte da

avaliação.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 51

Etapas didáticas básicas dos experimentos e simulações

As metodologias e procedimentos, após a fundamentação teórica são

apresentados aos alunos como etapas e que seguem uma diretriz comum composta

por: (a) definição do problema projetual; (b) formulação da hipótese; (c) execução do

experimento; (d) interpretação aderida a solução do problema projetual através dos

resultados; (e) evolução e entendimento sistêmico da ciência técnica praticada.

Dada a condição de aprendizagem e indução do protagonismo e da superação de

etapas projetuais pelas experiências não formais e não desenvolvidas previamente no

curso, fornece-se a condição dos alunos buscarem por temas de disciplinas anteriores

e identificarem quais podem ser desafiados e experimentados.

Assim é fornecida uma lista temática e indicado que façam um “brainstorming”.

Esta lista contempla palavras chaves como: insolação; acústica; sistemas estruturais;

conforto térmico; paisagismo, sistemas tecnológicos complementares, sustentabilidade,

etc. Portanto nesta etapa, se ofertam temas, mas que devem ter fundamentos

desenvolvidos na monografia (TFG 1-2) e projeto (TFG 2-2).

A próxima etapa contempla a apresentação de potencialidades e particularidades

das experimentações por modelos físicos e por modelos virtuais, simulações, bem

como, se privilegiam os resultados e as forma de apresentação, uma vez que devem

ser retratados também pela representação gráfica.

Resultados de trabalhos orientados

Para a obtenção dos resultados e análises descritos neste artigo foram tomados

os procedimentos experimentais colhidos da biblioteca de experimentos FAU-

Mackenzie de autoria das alunas Ingra Tofetti (TOFETTI, 2017), Bruna Marrucci

Sampaio (SAMPAIO, 2018) e Luma Cury Romantini (ROMANTINI, 2016).

Trabalho de autoria de Ingra Tofetti

O estudo abrangeu o projeto de uma edificação com o tema de “Remodelação

de vizinhança com foco na capacitação e integração”, com proposição de sistema

composto de madeira laminada colada. Nas primeiras etapas do experimento, foram

definidas as dimensões de peças pré-estabelecidas de modo empírico (Figura 6).

Figura 6: Dimensionamento através de tabelas com parâmetros empíricos - vigas em madeira

laminada colada

Fonte: TOFETTI, 2017

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 52

Para a estrutura proposta as quais se atribui como de massa reticulada e que

pode ser tomada como parte do processo de tomada de decisão no desenvolvimento

de um projeto de arquitetura de múltiplos pavimentos. Na Figura 7 são apresentados

croquis de estudos para elaboração de detalhes construtivos e ligações entre as peças,

como busca de respostas experimentais quanto a uma concepção de estrutura que

atenda aos desempenhos requeridos quanto ao conforto e estabilidade.

Figura 7: (a) Estudos das ligações entre peças de madeira laminada colada e (b) Propostas

das ligações entre peças para experimentações.

Fonte: TOFETTI, 2017

O experimento contemplou assim o desenvolvimento de uma materialidade

proposta de projeto com uso de estrutura com peças em madeira laminada colada, e

para a qual se destaca que aluna demonstrou certa proficiência no dimensionamento

da estrutura. Por meio de cálculos específicos e para maiores entendimentos sobre a

forma como iria se comportar a estrutura, a mesma foi orientada na busca através de

observações das ligações e principalmente a maior compreensão das possibilidades

que as tipologias de nós propostos quanto a resistência e vibrações.

Figura 8: Aspectos do modelo físico antes as vibrações e o modelo com pontos

colapsados entre o 2o pavimento e o pavimento de cobertura.

Fonte: TOFETTI, 2017

Para a consecução do experimento contou-se assim com a adequação do modelo

físico, maquete, que também foram supervisionados por professor especialista em

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 53

Física e com laboratorista respectivamente, prof. Dr. Fábio Raia e Sr. Edson (Figura 8)

- Responsável pelo laboratório de mecânica da Universidade Presbiteriana Mackenzie,

que proporcionaram aos experimentos condições e aspectos de maior reciprocidade

quanto ao estudo do problema e obtenção dos resultados.

O procedimento para simulação do modelo físico contou com a fixação do mesmo

sobre uma tábua e contando com um aparelho que transmite vibrações sem conduzir

esforços para que se possa caracterizar uma situação de vibração do solo, como, por

exemplo, um terremoto. Para o experimento foi definido o incremento na magnitude

das vibrações a cada 2 Hertz (Figura 10).

Com o desenvolvimento das vibrações com o supracitado aumento gradual,

notou-se que o nó entre pilar e viga que não estava contraventado de modo adequado

através da observação do deslocamento entre barras no nó, fato que gerou o desmonte

do modelo físico. Contatou-se que até 12 Hertz o modelo permaneceu com sua forma

estável

,

e, sob a ação de 14 Hertz ocorreu a ruptura e colapso do modelo.

Trabalho de autoria de Bruna Marrucci Sampaio

A experimentação tinha como objetivo o estudo da insolação nas fachadas do

hotel, analisando quais orientações receberiam mais carga térmica proveniente da

radiação incidente, e então o projeto de dispositivos de sombreamento (brises) em

resposta à esta demanda.

Neste sentido, foi desenvolvido o estudo da carta solar utilizando o software

de simulação Sol-Ar, desenvolvido pelo Laboratório de Eficiência Energética em

Edificações da UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina (LABEEE, 2009). As

orientações estudadas foram 27,30° (predominante nordeste); 117,30° (predominante

sudeste); 207,30° (predominante sudoeste) e 297,30° (predominante noroeste).

Figura 9: Estudo da carta solar para as fachadas do projeto.

Fonte: SAMPAIO, 2018

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 54

O Software Sol-Ar permite que sejam plotados os dados de temperatura do ar

sobre a carta solar de determinado local. Utilizando como critério os horários com

temperaturas mais elevadas (horários críticos), foram definidas as máscaras de

proteção (sombreamento) para cada fachada, (Figura 9).

A determinação dos horários a serem protegidos resultou nos ângulos que foram

utilizados no projeto dos dispositivos de sombreamento. Nesta etapa também foi

definido o tipo de dispositivo de sombreamento, neste caso o muxarabi, por permitir o

controle pelo usuário sobre a quantidade de sol que adentra o recinto.

Figura 10: Estudos de insolação de fachadas – uso do “relógio solar” para latitude 23,5°.

Fonte: SAMPAIO, 2018

Por fim, verificou-se se o dispositivo projetado atendia às necessidades de

sombreamento por meio de um módulo em escala e “relógio solar” para latitude 23,5°,

orientados de acordo com o projeto de arquitetura (Figura 10).

Trabalho de autoria de Luma Cury Romantini

O projeto da referida aluna tinha como desafio assegurar a qualidade e conforto

acústico do auditório de uma escola profissionalizante de dança, trabalhando conceitos

de isolamento e condicionamento acústico.

O primeiro ponto a ser definido no projeto foi a curva de visibilidade. Em se

tratando de um ambiente voltado para espetáculos de dança, há de se definir como

foco visual a ponta do palco, isto é, o ponto mais baixo a ser avistado por qualquer

ponto da plateia (Figura 11). A partir da definição do foco visual, são traçadas as visuais

da fileiras subsequentes, usando como referência as distâncias antropométricas da

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 55

circunferência da cabeça (raio de aproximadamente 12,5 centímetros).

O auditório possui 16 fileiras de poltronas, conforme Figura 11a. Sabe-se que a

energia sonora decai com o aumento da distância, na proporção inversa do quadrado

da distância percorrida, definição conhecida como “Lei do Inverso do Quadrado”. Desta

forma, destacou-se a necessidade do estudo de distribuição da energia sonora a partir

da utilização de placas rebatedoras que reforçassem os níveis de pressão sonora

para as posições mais afastadas da fonte sonora (orador no palco). Com o auxílio do

software Microsoft Excel as variáveis envolvidas no cálculo são relacionadas - potência

da fonte; distância da fonte ao ponto, nível sonoro à distância d, diferença entre o nível

ideal no ponto d – resultando no número de placas a serem instaladas.

(a)

(b)

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 56

(c)

(d)

(e)

Figuras 11: (a) Corte longitudinal da sala e cálculo da curva de visibilidade; (b) cálculo da

quantidade de placas refletoras; (c) corte longitudinal com cálculo das placas refletoras; (d)

Modelo com abrangência da 1ª placa refletora; (e) Modelo com abrangência da 2ª placa

refletora.

Fonte: ROMANTINI, 2016

Após a definição do número de placas necessárias para reforço sonoro – 2

(duas), é iniciado o processo de desenho das mesmas, baseado nos conceitos físicos

da Óptica do Espelhos Planos. A partir do estudo geométrico (curva de visibilidade

da plateia e raios incidentes e refletidos sobre as superfícies refletoras) foi definido o

posicionamento e dimensionamento adequado dessas superfícies para raios sonos de

1ª reflexão (Figura 11c).

Por fim, verificou-se se as placas projetadas estavam atendendo às necessidades

acústicas colocadas, estudando-se os elementos por meio da analogia com o raio

luminoso. Foi construído um modelo em escala (Figura 11d e 11e) utilizando pedaços

de superfícies espelhadas como as placas refletoras obtidas pelo método geométrico.

Os “raios sonoros” (incidentes e refletidos) foram obtidos com a utilização de

fonte de feixe de laser posicionada no lugar correspondente à fonte sonora no palco.

Para as posições da plateia onde se recomendava o reforço sonoro, foram visualizados

os raios refletidos nas superfícies espelhadas e que incidiram nas posições onde

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 57

deveriam atingir, atendendo à região de abrangência definida em projeto.

5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS

Atualmente o grande desafio dos projetos arquitetônicos e urbanísticos vem a

ser o maior comprometimento com o desempenho e com a sustentabilidade e esta

relação é o encontro e equilíbrio entre conforto, custo e impacto ambiental.

Conforme revisão teórica e exemplos práticos apresentados, a experimentação

compreende uma busca de possibilidades, sob o viés do encontro das melhores

soluções, enriquecida hoje pela variedade de alternativas tecnológicas, sejam elas

impressão 3D, instrumentos de medição, softwares ou aplicativos para smartphones.

Cada categoria, invariavelmente, possui pontos positivos e negativos que devem ser

considerados quando da concepção do experimento visando o atendimento e intenção

do mesmo.

Como prática integrada de desenvolvimento de projetos de arquitetura, a

experimentação auxilia na evolução das soluções em direção às mais adequadas/

oportunas, considerando o contexto colocado. Como instrumento didático, auxilia

também no processo formativo por meio da fixação do conhecimento através do

questionamento e desenvolvimento de capacidades e habilidades complementares,

instigando o protagonismo estudantil dentro e fora de sala de aula.

Por fim, a prática da experimentação destaca ainda a possibilidade de

desenvolver os trabalhos de graduação com a inter-relação com outras faculdades da

universidade, de forma a que instituições distintas possam contribuir para o mesmo

objetivo: o aprimoramento do conhecimento e sua disseminação, ou seja, o conceito

de UNIVERSIDADE, reduzindo “guetos” do conhecimento.

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Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 4 58

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ROMANTINI, Luma. Experimentos –AT4 do 10oSemestre. Prancha digitalizada do trabalho

apresentado para a disciplina do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana

Mackenzie., São Paulo, 2016.

SAMPAIO, Bruna. Experimentos –AT4 do 10oSemestre. Prancha digitalizada do trabalho apresentado

para a disciplina do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie., São

Paulo, 2018.

TOFETTI, Ingra. Experimentos –AT4 do 10oSemestre. Prancha digitalizada do trabalho apresentado

para a disciplina do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie., São

Paulo, 2018.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 59

CAPÍTULO 5

doi

REPENSANDO O ESPAÇO CONSTRUÍDO DA EDIFICAÇÃO

ESCOLAR COM AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

INOVADORAS

Roberta Betania Ferreira Squaiella

Universidade Presbiteriana Mackenzie, Faculdade

de Arquitetura e Urbanismo

São Paulo – SP

Roberto Righi

Universidade Presbiteriana Mackenzie, Faculdade

de Arquitetura e Urbanismo

São Paulo – SP

RESUMO: Enquanto os avanços tecnológicos

mudam muito e rapidamente, a educação e as

escolas permanecem com poucas alterações.

Sincronizar os avanços do mundo digital com o

aprendizado formal é um dos maiores desafios

na atualidade. Questionando as formas

tradicionais de aprendizagem, os educadores

propõem metodologias ativas que possuem

potencial para incorporação das teorias do

desenvolvimento e da aprendizagem que

mais contribuem para educação. Tais teorias

apresentam caminhos que possibilitam avançar

no conhecimento profundo, bem como nas

competências sócio emocionais e em novas

práticas educativas, o que impacta no espaço

construído da edificação escolar. Nesse contexto,

o presente artigo evidencia a necessidade de

transformação do ambiente escolar tradicional

para se adequar às atividades e às propostas

pedagógicas mais contextualizadas com a

era das tecnologias digitais, que demanda

novas características como: flexibilidade,

personalização, compartilhamento,

colaboração, criatividade e inovação. Baseado

em referencial teórico, discute-se a necessidade

de se redesenhar o espaço escolar, diante do

impacto das tecnologias digitais, e se apresenta

dois estudos de casos como exemplificação de

espaços de aprendizagem inovadores. Dentre

as profundas mudanças necessárias para que

a escola possa garantir a convergência digital,

a infraestrutura do espaço escolar se apresenta

como importante recurso para se proporcionar

um aprendizado inovador.

PALAVRAS-CHAVE: Espaços de

Aprendizagem; Inovação; Metodologias Ativas;

Convergência Digital; Escola.

RETHINKING THE BUILT SPACE OF

SCHOOL BUILDING WITH INNOVATIVE

PEDAGOGICAL PRACTICES

ABSTRACT: While technological advances

change a lot and quickly, education and schools

remain with few changes. Synchronizing

the advances of the digital world with formal

learning is one of the biggest challenges today.

Questioning the traditional forms of learning,

educators propose active methodologies that

have the potential to incorporate theories of

development and learning that contribute more

to education. These theories present paths that

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 60

make it possible to advance in deep knowledge, as well as in socio emotional skills and in

new educational practices, which impacts on the built space of the school building. In this

context, this article highlights the need to transform the traditional school environment to

suit the activities and pedagogical proposals more contextualized with the era of digital

technologies, which demands new features such as: flexibility, customization, sharing,

collaboration, creativity and innovation. Based on a reference, it is discussed the need

to redesign the school space, given the impact of digital technologies, and presents

two case studies as an example of innovative learning spaces. Among the profound

changes necessary to ensure that the school can guarantee digital convergence, the

infrastructure of the school space is an important resource to provide an innovative

learning.

KEYWORDS: Learning Spaces; Innovation; Active Methodologies; Digital Convergence;

School.

1 | INTRODUÇÃO

Com o avanço das tecnologias digitais as experiências educacionais de alunos

e professores estão se alterando para se adequarem à realidade atual e futura da

sociedade. Entretanto, os edifícios escolares e seus ambientes de aprendizagem

permanecem relativamente estáticos ao longo do tempo. A maioria das instituições

escolares já existem há décadas, sem passar por uma grande transformação desde que

foram originalmente construídas. Dessa maneira, possuem salas de aula configuradas

para o modelo tradicional de ensino, com carteiras enfileiradas, onde o ensino está

baseado na oralidade do professor e na passividade do aluno. Esse modelo, que

possui suas raízes na Revolução Industrial, tinha como ideal a fabricação em larga

escala. Um sinal que indique o tempo de permanência nas salas de aula, como uma

produção em massa, não condiz com as abordagens de aprendizagem mais atuais

(LANGE, 2016).

A dinâmica das mudanças sociais influencia a maneira de utilização das

edificações, sendo necessário reavaliar a qualidade do ambiente escolar para que se

possa atender as demandas reais dos estudantes, que devem assumir papéis criativos

e produtivos na sociedade. Além disso, os avanços tecnológicos transformaram

os hábitos da sociedade de modo que analisar, exibir e disseminar conhecimento

geralmente envolve os recursos da tecnologia da informação e comunicação (TIC).

Esses recursos trouxeram capacidades únicas para aprender, e isso altera os espaços

de aprendizagem (OBLINGER, 2006), a medida que se compreende que o ambiente

escolar contribui para a produtividade do aprendizado.

As novas configurações dos edifícios escolares devem ser mais propícias para

a aplicação e o desenvolvimento das teorias do desenvolvimento e da aprendizagem

mais atuais. Assim, apresenta-se breve estudo sobre as seguintes teorias: cognitivista

de Jean Piaget, histórico-cultural de Lev Vygotsky, afetividade de Henri Wallon e,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 61

aprendizagem significativa de David Paul Ausubel.

Ressalta-se que as considerações sobre a configuração da sala de aula não

devem ser limitadas às quatro paredes do ambiente físico tradicional, pois com

,

o grande

crescimento da aprendizagem em ambientes virtuais a definição de uma sala de aula

deve se expandir para incluir o espaço digital. Nesse sentido, Diana Oblinger (2006)

afirma que a configuração do espaço, seja físico ou virtual, impacta na aprendizagem,

que pode ocorrer nos espaços formais ou informais. A organização do espaço pode

juntar as pessoas e encorajar a exploração, a colaboração e a discussão, ou pode

proporcionar uma mensagem de silêncio, de individualização e desconexão.

Como exemplificação de escolas inovadoras, são apresentadas duas experiências,

uma nacional e uma internacional, de ambientes escolares onde já se considera a

grande integração com as inovações tecnológicas em ambientes preparados para as

metodologias ativas.

2 | FUNDAMENTOS DAS TEORIAS DE APRENDIZAGEM E DO

DESENVOLVIMENTO

Para se compreender as transformações no processo de aprendizagem, estuda-

se as mais recentes teorias produzidas pelos diversos teóricos da psicologia, que

influenciaram a educação. Filatro (2009) ressalta que é difícil esgotar o assunto sobre

as teorias pedagógicas, com suas inúmeras implicações e desdobramentos, devido

grande discussão entre os especialistas da educação nos últimos anos. Dessa forma,

destacam-se algumas discussões atuais, que mais influenciaram e continuam a

contribuir com a educação.

Considerado o precursor do cognitivismo, Jean Piaget criou a teoria da

epistemologia genética ou teoria psicogenética, a qual define que o conhecimento é

resultante da interação entre o sujeito e o objeto, por meio de um processo contínuo

de construção e reconstrução na formação dos saberes, como um desenvolvimento

biológico. Para o ensino, a sua concepção construtivista implica na disponibilização de

ambientes mais interativos, que estimulem a experimentação e o desenvolvimento das

habilidades existentes (FILATRO, 2009).

Para Lev S. Vygotsky as funções psicológicas superiores – como a atenção

voluntária, a percepção, a memória e o pensamento – eram consideradas como o

resultado do desenvolvimento cultural, e não do desenvolvimento biológico. Sua teoria

atribui à cultura e à história um papel de destaque nos processos de aprendizagem

(COSMO, 2018). Uma das grandes contribuições de Vygotsky foi o conceito de zona de

desenvolvimento proximal, que considera o nível de desenvolvimento atual do sujeito

e o que ele poderá desenvolver, sob a orientação e a colaboração de outros mais

capazes. Para o ensino, isso implica no desenvolvimento de ambientes colaborativos

e de desafios apropriados para cada aluno, que possam encorajar a experimentação

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 62

e o compartilhamento de descobertas (FILATRO, 2009).

Henri Wallon atribuiu importância para a afetividade no processo evolutivo,

considerando-se tanto a capacidade biológica do sujeito quanto o ambiente (SALLA,

2011). Dessa maneira, ele considerava que o professor deveria desempenhar o

papel de líder do grupo, estabelecendo uma boa relação com o aluno e permitindo

o desenvolvimento da sua autonomia. Crítico da competição e da rivalidade comum

no ensino tradicional, Wallon valorizava o trabalho em equipe e a cooperação para

o desenvolvimento de uma sociedade democrática, mais justa e solidária (COSMO,

2018).

David Paul Ausubel formulou a teoria da aprendizagem significativa, na qual

defendeu que novos conhecimentos se relacionariam significativamente com as

ideias e informações já existentes na estrutura cognitiva do aluno. Assim, para que

a aprendizagem significativa ocorra numa situação social, como em uma sala de

aula, os conhecimentos prévios e a sequência de conteúdos são essenciais para o

aperfeiçoamento da aprendizagem e para a solução de problemas (FILATRO, 2009).

Os avanços nas teorias de aprendizagem e do desenvolvimento têm implicações

em como a aprendizagem ocorre, sendo que atualmente a ênfase é dada às teorias

construtivistas, como a de Piaget, de Vygotsky, de Ausubel e de Wallon, nas quais o

aluno tem participação ativa na construção do seu conhecimento. Nessas teorias, os

ambientes que apoiam a aprendizagem devem fornecer o suporte para: a experiência,

o estímulo aos sentidos, a troca de informações, a oportunidade para o ensaio, o

feedback, a aplicação e a transferência de conhecimentos. Na conformação tradicional

de uma sala de aula não há estímulos para essa experiência, pois os arranjos entre os

assentos geralmente não permitem a troca de informações entre os alunos e não há o

acesso individual à informação por meio da tecnologia.

A disposição do sujeito e a forma como o conhecimento aparece são fatores

importantes que devem ser considerados no processo de sua construção (OBLINGER,

2006). Para tanto, considera-se a organização do espaço escolar um fator essencial

para a motivação do aprendizado. Destaca-se que, a medida que a sociedade se

depara com as tecnologias, a educação pode ganhar novas possibilidades, com

melhorias e maior facilidade para a aplicação das teorias pedagógicas mais recentes

e adequadas ao processo de aprendizagem.

3 | OS NATIVOS DIGITAIS E O ENSINO HÍBRIDO

Na década de 1990, Seymour Papert já evidenciava a grande desigualdade

do progresso nas diferentes áreas do conhecimento e das atividades humanas,

destacando a necessidade de uma revolução tecnológica na educação. Por meio de

uma parábola ele comparava a reação de um grupo de viajantes do tempo, oriundos

do final do século XIX, que visitariam o mundo no final do século XX. Enquanto os

médicos cirurgiões ficariam espantados com os avanços tecnológicos na medicina e,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 63

dificilmente conseguiriam exercer a sua profissão com os conhecimentos adquiridos

anteriormente, os professores do ensino básico não teriam dificuldade em assumir

uma aula (PAPERT, 1994).

Apesar de ocorrer em um processo lento, o uso da TIC na sala de aula tem sido

cada vez mais crescente e isso traz tensões, novas possibilidades, além de grandes

desafios para o processo de aprendizagem (MORAN, 2018). As tensões ocorrem

devido ao descompasso entre as gerações de professores e alunos, que de acordo

com Marc Prensky (2001) são caracterizadas, respectivamente, como imigrantes e

nativos digitais. As novas possibilidades se devem à abertura que as conexões por

meio da Internet propiciam, expandindo as relações formais e informais, e os grandes

desafios são os meios para a aumentar o acesso às informações e transformar as

relações sociais, econômicas e culturais.

Neste cenário, uma educação híbrida pode resultar em uma estratégia

interessante para o desenvolvimento do aluno, pois de acordo com Bacich, Tanzi Neto

e Trevisani (2015) no ensino híbrido parte-se do pressuposto de que não existe uma

única forma de aprender e, por consequência, não existe uma única forma de ensinar. A

aprendizagem, que é um processo contínuo, pode ocorrer em diferentes espaços e de

diferentes formas. Isso torna possível a personalização, inviável de ocorrer no tempo e

no espaço da sala de aula tradicional. Entretanto, com o uso da TIC para a educação

é possível adaptar as atividades de estudos com a seleção dos recursos que mais se

aproximam do modo de aprender e da necessidade de cada aluno, garantindo-se a

sua participação ativa na construção do seu conhecimento (BACICH; TANZI NETO;

TREVISANI, 2015).

4 | REDESENHAR OS ESPAÇOS DE APRENDIZAGEM

De acordo com a organização norte americana New Media Consortium (NMC),

a necessidade de repensar os espaços de aprendizagem está entre as principais

tendências que aceleram a adoção de tecnologia nas escolas. Com a evolução das

metodologias de ensino e a emergência das tecnologias digitais, as salas de aula

exigem uma atualização para refletir as práticas do século XXI que ocorrem dentro

delas (ADAMS BECKER et al., 2016; FREEMAN et al., 2017).

De acordo com Freeman et al. (2017), em todo o mundo há escolas que estão

repensando como

,

INOVADORAS

Roberta Betania Ferreira Squaiella

Roberto Righi

DOI 10.22533/at.ed.5281910075

CAPÍTULO 6 ..............................................................................................................71

CLASSE HOSPITALAR E BRINQUEDOTECA: PLANEJAMENTO NA INTERNAÇÃO

PEDIÁTRICA

Joceline Costa de Almeida

DOI 10.22533/at.ed.5281910076

CAPÍTULO 7 ..............................................................................................................84

MÉTODO DE AVALIAÇÃO E ANÁLISE PARA REFORMAS EM UNIDADES DE

SAÚDE MUNICIPAIS SEGUNDO PRIORIDADES DE EXECUÇÃO

Carlos Eduardo Gomes Engelhardt

Edison Luiz Leismann

Ana Paula Vansan

DOI 10.22533/at.ed.5281910077

SUMÁRIO

CAPÍTULO 8 ..............................................................................................................96

EFICIÊNCIA E SUSTENTABILIDADE NOS AMBIENTES DE SAÚDE

Eleonora Coelho Zioni

DOI 10.22533/at.ed.5281910078

CAPÍTULO 9 ............................................................................................................107

ARQUITETURA E SUSTENTABILIDADE: OS “SELOS VERDES”

Mônica Santos Salgado

DOI 10.22533/at.ed.5281910079

CAPÍTULO 10 .......................................................................................................... 119

UMA ANÁLISE DIACRÔNICA DO TECIDO URBANO: O ESTUDO DE CASO DE SÃO

JOSÉ DO RIO PARDO-SP

Rafael Augusto Silva Ferreira

Renata Baesso Pereira

DOI 10.22533/at.ed.52819100710

CAPÍTULO 11 ..........................................................................................................140

HETEROGENEIDADE DA FORMA DE UM SETOR URBANO NO DISTRITO DO

TREMEMBÉ

Adilson Costa Macedo

Rodrigo Luz Damasceno

DOI 10.22533/at.ed.52819100711

CAPÍTULO 12 ..........................................................................................................156

GOIÂNIA EM AGLOMERADOS: DESAJUSTES ENTRE O PLANEJADO E O

CONCRETO

Lídia Milhomem Pereira

Ricardo Alexandrino Garcia

Carlos Fernando Ferreira Lobo

Paulo Eduardo Alves Borges da Silva

Nayhara Freitas Martins Gomes

DOI 10.22533/at.ed.52819100712

CAPÍTULO 13 ..........................................................................................................168

ENTRE CIDADE E CIDADANIAS: UMA REFLEXÃO SOBRE REFUGIADOS URBANOS

NO RIO DE JANEIRO A PARTIR DA ÓTICA TERRITORIAL

Natália da Cunha Cidade

Marize Bastos da Cunha

João Guilherme Casagrande Martinelli Lima Granja Xavier da Silva

DOI 10.22533/at.ed.52819100713

CAPÍTULO 14 ..........................................................................................................180

INSTRUMENTOS URBANÍSTICOS E A PRODUÇÃO NEOLIBERAL DO ESPAÇO:

O TRATAMENTO DA QUESTÃO HABITACIONAL NAS OPERAÇÕES URBANAS

CONSORCIADAS DA CIDADE DE SÃO PAULO/SP

Aline de Lima Zuim

Carolina Maria Pozzi de Castro

DOI 10.22533/at.ed.52819100714

SUMÁRIO

CAPÍTULO 15 ..........................................................................................................196

TRABALHO SOCIAL NO PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA: EVOLUÇÃO

NORMATIVA E DESAFIOS

Maria Gabriela Bessa

Ruth Jurberg

DOI 10.22533/at.ed.52819100715

CAPÍTULO 16 ..........................................................................................................208

A CONSTRUÇÃO DA CIDADE PELAS LUTAS DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DE

HABITAÇÃO: O CASO IZIDORA E A RESPOSTA DO PODER PÚBLICO

Mariza Rios

Renata Cristina Araújo

DOI 10.22533/at.ed.52819100716

CAPÍTULO 17 ..........................................................................................................226

A POBREZA INVISÍVEL

Tales Lobosco

DOI 10.22533/at.ed.52819100717

SOBRE A ORGANIZADORA ...................................................................................240

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 1

CAPÍTULO 1

doi

A ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA E SUA INFLUÊNCIA

EM RESIDÊNCIAS DE SANTO CRISTO/RS

Tais Elisa Schmitt

Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia Farroupilha

Santa Rosa - RS

Cornelia Kudiess

Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia Farroupilha

Santa Rosa - RS

Graciele Hilda Welter

Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia Farroupilha

Santa Rosa - RS

RESUMO: Este texto tem por tema a influência

da arquitetura contemporânea em residências

situadas na cidade de Santo Cristo/RS.

Justificamos a escolha do tema pela importância

da atual escola arquitetônica e pelo fascínio

que o estilo provoca, tanto em leigos quanto

em profissionais da área, mesmo tendo formas

geométricas e linhas simples. O principal

objetivo é apresentar características marcantes

da arquitetura contemporânea e relacioná-las

com as casas das famílias. Ainda, temos o

intuito de evidenciar o modo como edificações

do mesmo estilo podem ser tão diferentes

entre si, mesmo com elementos similares. A

metodologia consiste em pesquisa de campo,

pesquisa bibliográfica com base em livros da

área de arquitetura e arte, e produção gráfica

(desenhos em grafite, pinturas em aquarela e

fotografias). Como resultado, apresentamos a

relevância da pesquisa e produção científica

no meio acadêmico e a construção do

conhecimento da forma, arte, movimentos

artísticos e da pluralidade cultural. Além disso,

marcas da arquitetura pós-moderna são ligadas

às casas das famílias em elementos como

o vidro, sobreposições e uso de materiais

tradicionais.

PALAVRAS-CHAVE: Arquitetura

contemporânea; Residências; Arte.

ABSTRACT: This text has the theme of the

influence of contemporary architecture in

residences located in the city of Santo Cristo

/ RS. We justify the choice of theme for the

importance of the current architectural school

and for the fascination that the style provokes,

both in laymen and in professionals of the area,

even having geometric shapes and simple

lines. The main objective is to present striking

features of contemporary architecture and relate

them to the homes of families. Furthermore,

we intend to show how similar buildings can

be so different from one another, even with

similar elements. The methodology consists

of field research, bibliographic research based

on books in the area of architecture and art,

and graphic production (graphite drawings,

watercolor paintings and photographs). As a

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 2

result, we present the relevance of research and scientific production in the academic

environment and the construction of knowledge of form, art, artistic movements and

cultural plurality. In addition, brands of postmodern architecture are linked to the homes

of families in elements such as glass, overlays and use of traditional materials.

KEYWORDS: Contemporary architecture; Residences; Art.

1 | INTRODUÇÃO

Construímos casas desde os primórdios da humanidade. A agricultura fez com

que o ser humano se tornasse sedentário, dando mais atenção ao lugar que morava.

Erguíamos moradias cada vez mais estilizadas, ao passo que as classes sociais

começavam a aparecer. Passando por casas de pau a pique, de ossos e galhos ou

feitas de barro, o conceito de moradia sempre esteve presente com o mesmo objetivo:

a proteção.

A arquitetura foi evoluindo junto com todas as outras questões que envolvem a

construção de uma edificação. Materiais melhores, diferentes necessidades, culturas

e classes sociais guiaram mudanças estéticas. Assim surgiram estilos arquitetônicos

distintos.

A funcionalidade e solidez romana, as abóbadas e os arcos ogivais da arquitetura

gótica, a suntuosidade e imponência do barroco, a inovação do modernismo: todos os

estilos serviram para formar o conceito do que é o contemporâneo.

A arquitetura, junto com a arte do século XX, se intensificou com a expansão

e a pluralidade cultural. A negação à arquitetura antiga, que regrava claramente a

tipificação das construções, ganhou forças, iniciando o desabrochar do que hoje

conhecemos como arquitetura contemporânea. O estilo é marcado por detalhes em

vidro e geometrização das formas,

,

usar os espaços existentes, enquanto as escolas emergentes

estão incorporando projetos com novas formas de ensino e aprendizagem, onde as

tecnologias são levadas em consideração. Os novos espaços de aprendizagem são

modulares e dispostos de forma a apoiar a aprendizagem desejada, considerando-

se que os gestores e líderes na área da educação concordam que esses espaços

devem passar de um modelo industrial para um modelo mais centrado no aluno. Para

isso, a sua configuração espacial deve ser maximizada para propiciar a colaboração,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 64

a aprendizagem autodirigida, a aprendizagem ativa, a pesquisa e a criação. Nesse

sentido, os ambientes de ensino se assemelham cada vez mais ao ambiente de

trabalho do mundo real e sociais, na resolução de problemas interdisciplinares.

As propostas pedagógicas que utilizam a tecnologia, como as metodologias

ativas, estão impactando na configuração dos espaços de aprendizagem, que

passam a ser mais abertos, com mobiliários móveis, ambientes flexíveis e dispositivos

eletrônicos conectados. Entretanto, ressalta-se o cuidado necessário para o conceito

de flexível. Geralmente relacionado à escolha do mobiliário ou de paredes móveis,

o redesenho das salas de aula do século XXI é muito mais profundo do que apenas

alcançar flexibilidade física, sendo o maior desafio dos prédios escolares acompanhar

o ritmo das grandes transformações tecnológicas e sociais (MADDA, 2017).

Dessa maneira, os arquitetos e os gestores que planejam os espaços educativos

devem estar conscientes de como um ambiente de aprendizagem responde às

necessidades dos alunos (FREEMAN et al., 2017). Uma equipe multidisciplinar deve

estar envolvida no planejamento de um espaço escolar, considerando-se que a

aprendizagem ocorre em todo espaço e o envolvimento da comunidade é essencial

para sua criação (BICKFORD; WRIGHT, 2006).

Apesar da arquitetura das escolas não ser uma resposta para a transformação

necessária na educação, o ambiente escolar tem um enorme potencial para criar e

apoiar os hábitos diários de escolas bem-sucedidas (LANGE, 2016). Nesse sentido,

Kowaltowski (2011) aponta que há uma relação fundamental entre aprendizado e

arquitetura, sendo que a qualidade do desempenho escolar é influenciada pelo edifício

e suas instalações.

As características físicas de qualquer ambiente de aprendizagem interferem na

aprendizagem, podendo causar diferentes emoções nos alunos e trazer importantes

consequências cognitivas e comportamentais. Os ambientes que provocam respostas

emocionais positivas podem melhorar a aprendizagem e levar a um apego emocional

a esse espaço. Em contraposição, os ambientes que desestimulam o aprendizado

se tornam repulsivos e não trazem boas recordações. Dessa maneira, as variáveis

ambientais como a luz, a temperatura e o ruído produzem alguns resultados previsíveis.

Por exemplo, quando a iluminação é inadequada, as temperaturas são extremas e os

ruídos são altos, a aprendizagem parece ser afetada negativamente (GRAETZ, 2006).

Considerando que os alunos passarão grande parte da sua vida acadêmica

em salas de aula, laboratórios e bibliotecas, Lomas e Oblinger (2006) destacam a

importância de se alinhar esses espaços com os hábitos dos alunos, para que se possa

incentivá-los ao aprendizado, aumentando o seu engajamento e retenção. Imersos no

mundo tecnológico, os alunos de hoje preferem experiências de aprendizagem que

são digitais, conectadas, experienciais, imediatas e sociais.

Para garantir um ambiente criativo e inspirador é necessário ter, inclusive, a

preocupação com a escolha adequada de suas cores. Entretanto, as considerações

sobre a configuração da sala de aula não devem ser limitadas às quatro paredes do

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 65

ambiente tradicional, pois com o grande crescimento da aprendizagem em ambientes

virtuais a definição de uma sala de aula deve se expandir para incluir o espaço

digital. A qualidade dos equipamentos tem impactos significativos nos resultados

de aprendizagem dos alunos, sendo importante a escolha adequada para garantir

qualidade nas telas e na reprodução de áudio e de imagens (MANNO, 2016). Os

instrumentos e os laboratórios remotos são exemplos de possibilidades para os alunos

e os professores executarem experimentos ou controlarem um dispositivo sem sair da

sala (LOMAS; OBLINGER, 2006).

Considerando-se que o aprendizado pode ocorrer tanto nos espaços formais

quanto nos espaços informais, toda configuração do espaço, seja físico ou virtual,

pode ter impacto na aprendizagem pois a sua organização pode juntar as pessoas e

encorajar a exploração, a colaboração e a discussão, ou pode levar uma mensagem

de silêncio, de individualização e de desconexão. É cada vez mais notório o poder

da pedagogia construída, ou seja, a capacidade do espaço para definir como ocorre

a ação de ensino e aprendizagem nas instituições escolares (OBLINGER, 2006;

THOMAS, 2010).

Para Thomas (2010), a definição de espaços de aprendizagem física e virtual

se torna mais difusa, pois eles acabam convergindo para locais onde a tecnologia da

informação atua. Isso traz grandes implicações para o aprendizado e conforme Siemens

(2004), as teorias de aprendizagem e do conhecimento mais utilizadas na criação

de ambientes instrucionais, como o behaviorismo, o cognitivismo e o construtivismo,

foram desenvolvidas em um momento em que o aprendizado não era impactado pela

tecnologia. A partir da década de 1990, a tecnologia reorganizou a sociedade, sendo

necessário o desenvolvimento de novas teorias de aprendizagem (SIEMENS, 2004).

5 | ESPAÇOS CRIATIVOS: COLABORAÇÃO E PERSONALIZAÇÃO

De acordo com Robert Kelly (2016), a criatividade é um ingrediente chave para

o sucesso na economia do conhecimento do século XXI, com habilidades como a

colaboração, a comunicação e o pensamento crítico. Para Lange (2016), além dos

espaços inovadores não serem padronizados, eles são mais inspiradores, saudáveis

e frisam que o aluno é importante. Espaços personalizados e orientados para o aluno

dão o suporte para as atividades distintas. Teixeira e Reis (2012) destacam que a

disposição do mobiliário em uma sala de aula influencia no tempo e no modo de

aprendizagem.

Bickford e Wright (2006) ressaltam que as pesquisas sobre as teorias de

aprendizagem e neurociência mostram que as atividades colaborativas facilitam

a aprendizagem ao melhorarem o envolvimento dos alunos. A tecnologia deve ser

considerada para promover essa comunidade e o intercâmbio de informações, evitando

a compartimentação.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 66

Casabona et al. (2014) reforçam que atualmente os alunos têm grandes

expectativas para aprender em qualquer lugar e a qualquer momento. Isso é possível

com o aprendizado móvel (do inglês, mobile learning), que se aproveita da tecnologia

do celular, no lugar dos computadores de mesa, para possibilitar um aprendizado

portátil e facilmente acessível. Além do uso dos dispositivos móveis, novas práticas

pedagógicas estão sendo incentivadas por meio de atividades como a STEAM (do

inglês, science, technology, engineering, art and mathematics), em ambientes que

permitem a criatividade e a experimentação. Nos últimos anos têm crescido a ênfase

nestes currículos e programas mais avançados, com integração de atividades voltadas

a aprendizagem multidisciplinar e interdisciplinar (FREEMAN et al., 2017).

De acordo com Walsh (2014), a implementação de espaços de produção (do

inglês, makerspaces) estimula a engenhosidade em campos distintos, para a solução

de problemas. Nesses ambientes físicos são favorecidas as atividades práticas e de

criação, por tecnologias emergentes, para se desenvolver as habilidades do século

XXI, reforçando disciplinas e o pensamento empresarial, com exploração criativa,

para produzir soluções aos desafios do mundo. As ferramentas

,

de criação, como a

impressora 3D, a robótica e os aplicativos da Internet são disponibilizadas aos alunos,

possibilitando que a criatividade, o desenho e a engenharia abram novos caminhos na

área da educação num espaço de produção (FREEMAN et al., 2017).

Apesar das possibilidades pedagógicas inovadoras, a transformação do espaço

escolar ocorre de maneira morosa e inadequada, com improvisos na organização,

mantendo-se as práticas pedagógicas ultrapassadas com configuração tradicional

e obsoleta. A seguir, são apresentados dois estudos com espaço de aprendizagem

inovador, adequado às metodologias ativas e as atuais teorias de aprendizagem e

desenvolvimento.

6 | ESCOLAS INOVADORAS

Há escolas que estão abandonando a configuração tradicional da sala de aula e

incorporando todos os locais do edifício como locais de aprendizagem. Considerando

a tecnologia nas propostas pedagógicas, é dado o suporte para a obtenção de energia

e a conexão dos dispositivos eletrônicos, contribuindo-se para a personalização da

aprendizagem, conforme demonstram os estudos de casos a seguir.

A Avenues: The World School é uma rede de escola norte americana com objetivo

internacional. Sua segunda unidade, projetada pelo escritório Aflalo e Gasperini,

localiza-se na cidade de São Paulo/Brasil. Com um aprendizado baseado em diálogo,

os alunos são instigados a pensar e a inovar, por meio de atividades interdisciplinares.

Para isso, os ambientes facilitam a participação e a interação entre os alunos e os

professores, por meio da combinação da formação presencial com o poder das

tecnologias emergentes. Os recursos tecnológicos dão o suporte para a comunicação

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 67

entre professores e alunos de todas as unidades, por meio de videoconferência.

Há espaços específicos como teatro, ginásio, pátio coberto, café, quadras e áreas

externas descobertas. Diferentes cores diferenciam os programas de cada espaço

e estimulam os alunos, dando a sensação de pertencimento. Nos laboratórios de

ciências as grandes aberturas têm a função de inspirar e instigar a curiosidade entre

os estudantes. As salas de aula estão configuradas para atividades colaborativas.

A variedade de espaços e mobiliários dos ambientes adapta as atividades às

necessidades educacionais das diversas faixas etárias. Os espaços de circulação,

amplos e espaçosos, preveem também locais para a permanência informal, visível na

figura 1.

Figura 1: Avenues: The Word School / São Paulo

Fonte: Aflalo e Gaperini (2014).

A Khan Lab School é uma escola de ensino médio, localizada em Mountain View,

na Califórnia/Estados Unidos, que atende 100 crianças. Possui educação baseada em

experimentação, visando testar diferentes cursos e experiências, onde todos aprendem

e todos ensinam. A filosofia da escola é o aprendizado personalizado, onde os alunos

são agrupados por nível de habilidade em vários domínios, independentes da idade. As

práticas pedagógicas preveem o uso dos dispositivos móveis, que se conectam com

as telas disponíveis em diversos ambientes. Tendo a tecnologia como parte integrante,

o arquiteto Danish Kurani projetou a escola voltada à evolução tecnológica. Assim

como as maiores empresas de tecnologia do mundo estão reinventando produtos de

consumo, a Khan Lab School faz com a educação (MADDA, 2017).

Três laboratórios com grandes aberturas internas permitem a visualização dos

experimentos do: Make Lab, para projetar, construir e prototipar; Ideate Lab, para

brainstorming; e Chat Lab, para discussão de ideias e resolução de problemas em

voz alta (MADDA, 2017). Na figura 2 se visualiza dois laboratórios utilizados para

atividades distintas. A escola também possui salas de descanso, espaços comuns e

café para o compartilhamento de experiências.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 68

Figura 2: Khan Lab School

Fonte: Danish Kurani (2017).

As escolas apresentadas mostram novas propostas de aprendizado que se

alinham com as teorias de aprendizagem mais atuais, como a de Vygotsky, de Piaget, de

Wallon e de Ausubel. A pedagogia é centrada no aluno, com a instigação à criatividade

e à inovação, adaptada à evolução tecnológica. Assim, a tecnologia, sempre presente,

é incorporada de modo que a escola se adapte à evolução tecnológica e possibilite um

aprendizado contextualizado para os alunos.

7 | CONSIDERAÇÕES FINAIS

No contexto atual, verifica-se que os alunos têm atitudes, expectativas e

comportamentos que os diferem dos alunos de 10 anos atrás. Entretanto, a maioria

dos espaços de aprendizagem ainda reflete as pessoas e a aprendizagem do passado.

Os espaços projetados antigamente não estão adequados para os alunos de hoje.

Diferentemente da educação tradicional, as propostas pedagógicas ativas atuais

visam preparar melhor os alunos para o mundo contemporâneo, de rápida mudança,

onde eles precisam ter conhecimentos e habilidades para serem bem-sucedidos no

futuro complexo que os aguarda.

O impacto das tecnologias na configuração e uso dos ambientes é inevitável

e, as escolas precisam se inovar para acompanhar as constantes inovações. Não

é possível manter os ambientes de aprendizagem estáticos, com uma conformação

tradicional, que não condiz com a realidade atual, e necessita de espaços adaptáveis,

flexíveis e fluidos.

Com o avanço das tecnologias digitais as experiências educacionais de alunos

e professores devem se alterar, para que se possa se adequar a nova geração à

realidade atual e futura da sociedade. A nova organização do espaço escolar necessita

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 5 69

de uma transformação para se adequar às metodologias ativas. Diante deste cenário,

muitas escolas estão transformando os seus espaços de aprendizagem para dar

suporte às práticas pedagógicas inovadoras, que demandam maior flexibilidade,

colaboração e participação ativa dos alunos. Além do processo de transformação,

destaca-se que as escolas emergentes já estão surgindo dentro deste novo contexto,

com ambientes escolares inovadores, preparados para as novas práticas pedagógicas

e com grande infraestrutura tecnológica, que possibilita a ampliação do ambiente

escolar para o mundo virtual, além de aumentar as conexões e as redes colaborativas

de aprendizagem.

A educação no século XXI não se restringe ao edifício educacional, pois com

a propagação das tecnologias da informação e comunicação, o planeta pode tonar-

se a escola do século XXI. Apesar de perder o seu papel primordial de formação de

saberes, diante do seu quadro atual, essa instituição deve se manter como formadora

de profissionais para o mercado de trabalho e/ou com outras funções econômicas,

sociais ou políticas, não desaparecendo da nossa sociedade. Neste contexto ganha

importância a educação corporativa que emerge nas próprias empresas e instituições

interessadas em formar seus quadros.

Os estudos de casos apresentam a transformação do espaço escolar, com a

reconfiguração das salas de aulas e dos ambientes institucionais, adequadas às

metodologias ativas e, às inovações nas suas atividades e na integração com o uso

das tecnologias. As escolas precisam inovar o seu ambiente construído aos alunos

da geração atual, tecnológica e conectada, que demandam maior flexibilidade,

personalização e colaboração nas atividades educativas, no ambiente físico e virtual.

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GRAETZ, Ken A. The Psychology of Learning Environments. In: OBLINGER, Diana G (Org.).

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maker-centered education. Usable knowledge, Harvard Graduate School of Education, 2014.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 71

CLASSE HOSPITALAR E BRINQUEDOTECA:

PLANEJAMENTO NA INTERNAÇÃO PEDIÁTRICA

CAPÍTULO 6

doi

Joceline Costa de Almeida

Universidade Estadual de Ciências da Saúde de

Alagoas - UNCISAL

Maceió, AL

RESUMO: Unidades de internação usualmente

classificadas pelo tipo de pacientes que recebem

ou pelo grau de complexidade do atendimento,

sendo possível separar por faixas etárias,

adultos, pediátrica, berçários, neonatologia e

idosos. No planejamento hospitalar deve agregar

ambientes quantificados e dimensionados

de acordo com a RDC50/2002. O projeto

arquitetônico que contempla internação

pediátrica deve conter quarto e enfermaria

destinados a crianças e adolescentes. A criança

tem atividades interrompidas, brincadeiras e

vida escolar, durante a hospitalização, havendo

privação de companhias. A educação no

ambiente hospitalar é um direito de toda criança

ou adolescente hospitalizado. Mesmo havendo

a obrigatoriedade legal, observa-se que os

estabelecimentos voltados para internamento

pediátrico não contemplam em sua totalidade

classe hospitalar e brinquedoteca como espaços

distintos. Quando não há a possibilidade de

excluir a internação, para diminuir o desconforto

da hospitalização, as atividades lúdicas têm

surgido para fins de minimizar o estresse dos

procedimentos e proporcionar momentos de

atividades construtivas à criança: salas de

recreação, brinquedoteca, classes hospitalares

ou oficina pedagógica. Trata-se de pesquisa

explicativa, exploratória, descritiva, bibliográfica

e infográfica com referencial teórico e empírico.

Buscou-se exposição descritiva da infraestrutura

do espaço físico necessário a uma internação

pediátrico, estabelecimentos no Rio de Janeiro e

em Brasília. Posteriormente expostos ambientes

de classes hospitalares e brinquedotecas de

estabelecimentos localizados em 02 regiões

do país, Nordeste e Sudeste. A coleta de

dados por observação de práticas existentes.

Como resultado destaca-se a relevância da

implantação das brinquedotecas e classes

hospitalares nos hospitais e as contribuições

para o processo de aprendizagem da criança

internada.

PALAVRAS-CHAVE: Hospital, Pediatria,

Educação Especial.

HOSPITAL CLASS AND PLAY AREA:

PLANNING IN PEDIATRIC HOSPITALIZATION

ABSTRACT: Inpatient units are usually

classified by the type of patients they receive or

by the degree of complexity of care. Regarding

patients, it is possible to separate the units by

age groups, such as adults, pediatric, nurseries,

neonatology and the elderly. In the planning

of the hospital building should contain the

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 72

environments that must be quantified and dimensioned according to RDC 50/2002.

The architectural design of the hospital that contemplates pediatric hospitalization

should contain room and infirmary for children and adolescents. It should be noted that

even though there is a legal obligation, health care establishments that are focused on

pediatric hospitalization do not include the whole hospital class and toy library as distinct

spaces. The child has his activities interrupted, such as play and school life, during

hospitalization, with the family and colleagues being deprived. Education in the hospital

environment is the right of every hospitalized child or adolescent. Given the scenario

where there is no possibility to exclude hospitalization, to decrease the discomfort of

hospitalization, play activities have arisen with the purpose of minimizing the stress of

the procedures and provide moments of constructive activities to the child, such as:

recreation rooms, toy library , hospital classes or pedagogical workshop. This is an

explicative, exploratory, descriptive research, bibliographical and infographic research

with theoretical and empirical reference. It was sought to complement the theoretical

framework with the support of the empirical referential, with a descriptive exposition

of the infrastructure component of the physical space necessary for hospitalization,

in the pediatric public, an establishment in Rio de Janeiro and another in Brasilia.

Subsequently, there was an exhibition of hospital class environments and toys of

pediatric care centers distributed in 02 regions of the country, Northeast and Southeast.

Data collection was done through observation of existing practices. As a result, the

importance of the implantation of the toys and hospital classes inside the hospitals and

the contributions to the process of learning of the interned child stands out.

KEYWORDS: Hospital, Pediatric, Special Education.

1 | INTRODUÇÃO

A internação é realizada para viabilizar o diagnóstico e tratamento de doenças

mais complexas, por meio de recursos técnicos e acompanhamento integral. Ao estar

hospitalizado ocorre uma ruptura na rotina familiar. Internado se depara com um

espaço incógnito, pouco acolhedor, com procedimentos que se tornam atemorizantes

(injeções, punções, biopsias, curativos, sondagens) e, consequentemente, podem

distanciar o

,

ser criança, do momento lúdico, do brincar e de tudo que faz parte da

infância. A criança tem suas atividades interrompidas, como as brincadeiras e a vida

escolar, havendo supressão da companhia dos familiares e dos colegas. Para atenuar

o desconforto da hospitalização, as atividades lúdicas surgem com a finalidade de

minimizar o estresse dos procedimentos e proporcionar momentos de atividades

construtivas, como: salas de recreação, brinquedoteca, classes hospitalares ou oficina

pedagógica.

Para amenizar o sofrimento da internação, nada mais atrativo do que jogos,

brinquedos e brincadeiras inserindo-a num contexto “natural“ dela, que é o brincar,

que surge como uma possibilidade de transformar o cotidiano da internação. A

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 73

programação físico-funcional dos estabelecimentos assistenciais de saúde delimita e

delineia no seu conjunto a listagem de atribuições de cada estabelecimento de saúde

do sistema, define-se um estabelecimento específico. A arquitetura é mostrada como

um espaço virtual, que à medida que coopera na performance das atividades em um

estabelecimento de saúde, confirma o caráter de lugar, designando ou robustecendo

um intercâmbio entre usuários e ambiente construído (OLIVEIRA, 2012).

A implantação de classe hospitalar em uma instituição hospitalar é de significativa

importância, prestando atendimento a uma população que tem na educação sua

principal via de cidadania e esperança de ascensão social. Assim, as ações educativas

na classe hospitalar, surgiram como elemento integrador entre as áreas da educação

e da saúde, possibilitando às crianças e jovens hospitalizados o que a lei garante: o

direito a educação. Mesmo referendado pelo Estatuto da Criança e Adolescente de

forma indireta, posto no artigo 11: “o atendimento integral à saúde da criança e do

adolescente”, por vezes até os próprios profissionais da Educação desconhecem a

possibilidade e/ou a existência desse campo de atuação. Ainda há leis federais que

remontam à década de 60 do século passado, a exemplo da Lei nº. 1.044/69, referente

ao atendimento domiciliar àqueles impossibilitados de frequentarem o ensino regular

são pouco conhecidas e muitas vezes negligenciadas.

O brincar é direito da criança defendido por lei, a Constituição da República de

1988, no artigo 227, destaca que: “É dever da Família, da Sociedade e do Estado

assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, a

saúde, a alimentação, à educação, ao lazer”.

Trata-se de uma pesquisa explicativa, exploratória, descritiva, pesquisa

bibliográfica e infográfica com referencial teórico e empírico. A coleta de dados foi

feita através de observação de práticas existentes. E como resultado destaca-se a

importância da implantação das brinquedotecas e classes hospitalares dentro dos

hospitais e as contribuições para o processo de aprendizagem da criança internada.

2 | PLANEJAMENTO FÍSICO HOSPITALAR

Planejar cobre uma ampla variedade de atividades, das mais simples às mais

complexas, desde a solução de problemas correntes até a determinação de ações que

uma organização deve considerar para enfrentar o futuro incerto. Pode-se considerar

como processo de tomada de decisões que permite a uma organização, atuar hoje

com vistas a produzir resultados a posteriori (GONÇALVES, 1976).

2.1 Hospital

A arquitetura de ambientes em saúde ultrapassa a composição técnica ao

considerar questões não tangíveis, delimitadas por um espaço-tempo e vivenciadas

por semelhantes, que incluem valores culturais e relações sociais dos indivíduos

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 74

assistidos. Assim, incorpora a indigência de promover a autoestima dos usuários

e propor condições que estimulem relações múltiplas e benéficas entre usuários

(pacientes, acompanhantes e funcionários) a fim de contextualizá-los no tempo e no

espaço social do qual fazem parte.

Segundo a RDC 50/2002, há 08 (oito) atribuições de Estabelecimentos

Assistenciais (EAS), dentre as quais está a PRESTAÇÃO DE ATENDIMENTO DE

ASSISTÊNCIA À SAÚDE EM REGIME DE INTERNAÇÃO, que se trata do atendimento

a pacientes que necessitam de assistência direta programada por período superior a

24 horas (pacientes internos).

2.2 Internação

Definida pela RDC nº 50/2002, como:

“unidade que atende a pacientes que necessitam de assistência direta programada

por um período superior a vinte e quatro horas, a unidade de internação obriga o

edifício hospitalar a possuir uma infraestrutura complexa, que vai dos cuidados

de alimentação e rouparia aos mais avançados equipamentos de diagnóstico”.

(BRASIL, 2004, p. 38)

A unidade de internação caracteriza o edifício hospitalar com aparente

simplicidade e semelhança com a hotelaria. As atividades referentes a PRESTAÇÃO

DE ATENDIMENTO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE EM REGIME DE INTERNAÇÃO

são elencadas: 1- Internação de pacientes adultos e infantis; 2-Internação de recém-

nascidos até 28 dias (neonatologia); 3-Internação de pacientes em regime de terapia

intensiva; 4-Internação de pacientes queimados em regime intensivo. A atividade

Internação de pacientes adultos e infantis objetiva-se a proporcionar condições de

internar pacientes, em ambientes individuais ou coletivos, conforme faixa etária,

patologia, sexo e intensividade de cuidados; executar e registrar a assistência médica

diária; - executar e registrar a assistência de enfermagem, administrando as diferentes

intervenções sobre o paciente; prestar assistência nutricional e distribuir alimentação a

pacientes (em locais específicos ou no leito) e a acompanhantes (quando for o caso);

prestar assistência psicológica e social; realizar atividades de recreação infantil e de

terapia ocupacional; e prestar assistência pedagógica infantil (de 1º grau) quando o

período de internação for superior a 30 dias.

Segundo a Portaria nº 1.101/2002, o tempo médio de permanência hospitalar

em dias por ano por internação, varia de 3 a 45 dias, a depender da especialidade

envolvida. Torna-se importante, portanto, aprimorar os ambientes hospitalares a fim

de minimizar as intercorrências indesejáveis relacionadas ao espaço físico e contribuir

com a redução de dias de internação.

Quanto a localização, a unidade de internação necessita do apoio de outras

unidades funcionais do hospital, se relacionando essencialmente com o apoio ao

diagnóstico e à terapia, notadamente aos setores: Centro cirúrgico; Imagenologia;

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 75

Métodos gráficos; Medicina nuclear; Patologia clínica; Nutrição e dietética;

Processamento de roupa; Farmácia (LEMOS e SAPUCAIA, 2006).

2.3 Pediatria: Crianças e Adolescentes

Considera-se criança o indivíduo até doze anos de idade incompletos, e

adolescente aquele entre doze e dezoito anos de idade. Nesta fase de vida, ambos

estão em formação e desenvolvimento, tanto físico quanto psicossocial.

Quando a criança e o adolescente passam por uma internação, o curso de

seu desenvolvimento é modificado, bem como a sua maneira de vivenciar o mundo,

sendo que “a hospitalização na infância pode se configurar como uma experiência

potencialmente traumática” (MITRE e GOMES, 2004).

A figura 01 elucida a inter-relação dos ambientes da unidade de internação

Pediátrica na incumbência do projeto contemplar a área de lazer (brinquedoteca) e a

sala de aula (classe hospitalar).

Figura 01: Relação funcional Internação - Criança/Adolescente

Fonte: Adaptado, SOMASUS (2013).

Diante das dificuldades passadas pelos pacientes pediátricos e seus familiares

durante a hospitalização, afloram necessidades que solicitam espaço arquitetônico,

que propiciem reelaborarem experiências, ordenando sofrimentos e frustrações e

possibilitando que expressem sentimentos em relação ao momento particular que

estão vivendo. Quando o espaço é projetado para a criança, a hospitalização pode

ser percebida mais positivamente,

,

sendo um auxiliar no processo de cura (BERGAN

et. al., 2009).

2.3.1 Classe Hospitalar

Em conformidade com a Política Nacional de Educação Especial (1994), a Classe

Hospitalar é um dos serviços disponibilizados pela Modalidade da Educação Especial,

que visa o atendimento pedagógico às crianças e aos adolescentes que, devido às

condições especiais de saúde, encontram-se hospitalizados. As atividades numa

Classe Hospitalar sempre devem iniciar-se com o levantamento do censo de pacientes

internados, suas respectivas idades e condições para ir ou não à classe. O trabalho

pode ser desenvolvido conjuntamente com a escola que a criança frequenta, através

do acompanhamento das tarefas pela professora da classe hospitalar, ou na sala de

classe preparada para tal fim, ou ainda no próprio leito, conforme a necessidade.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 76

2.3.2 Brinquedoteca

A função da brinquedoteca, que se configura como um espaço destinado à

brincadeira, onde a criança brinca sossegada, sem cobrança e sem sentir que está

perdendo tempo, estimulando sua autoestima e o processo sóciocognitivo (CUNHA,

2001).

Tratando-se de um espaço caracterizado por uma variedade de brinquedos, ou

poucos brinquedos, ou até mesmo sem brinquedos, desde que outros estímulos às

atividades lúdicas sejam proporcionados, ligadas aos jogos de correr, cantigas de

roda, esconde-esconde, entre outros, cujo proposito é oferecer a criança/adolescente

um ambiente agradável, cheio de magia, alegre e colorido, onde mais importante que

o brinquedo é o ato lúdico que proporciona ao público infantil. A obrigatoriedade legal

da lei federal nº. 11.104/2005 refere-se à instituição das Brinquedotecas Hospitalares

como obrigatórias a todos os hospitais que tenham atendimento pediátrico, em

consonância com o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar, de

2001, e com a Política Nacional de Humanização, de 2005.

3 | PROJETO ARQUITETÔNICO, REQUISITOS E RESTRIÇÕES

O Ambiente do Estabelecimento de Assistência a Saúde é entendido na RDC

50/2002 como o espaço fisicamente determinado e especializado para o desenvolvimento

de determinadas atividades, caracterizado por dimensões e instalações diferenciadas,

observados no quadro 01.

Unidade/Ambiente Dimensão (mín.) Observações

Quarto

Criança

9,0m² Área média: 10,8m²

Enfermaria 5,0m²/leito Área média: 31,7m² (04 leitos)

Quarto

Adolescente

10,0m² Área média: 11,m²

Enfermaria

7,0m²/leito (até 2) Área média: 32,15m² (04 leitos)

Distancia entre leitos = 1,0m

Leito e paredes: cabeceira = inexistente;

lateral = 0,5m; pé = 1,2m

6,0m²/leito

(3 a 6 - máximo)

Sala de Aula 0,8m²/paciente (aluno) Área média: 25,2m² (20 alunos)

Área de Recreação/ Lazer / Refeitório 1,2m²/paciente

(condições)

Área média: 19,45m²

Sala de Exames e Curativos 7,5m² 1 a cada 30 leitos (enfermaria que não

tenha subdivisão física dos leitos )

Posto de Enfermagem/Prescrição Médica 6,0m² 1 a cada 30 leitos

Quadro 01: Unidade Funcional - Internação Pediátrica

Fonte: Adaptado, RDC 50/2002; Goés (2011).

O dimensionamento é expresso pela quantificação e dimensões espaciais do

ambiente, ou seja, o tamanho do ambiente (superfície e dimensão), em função do

equipamento e/ou usuários. Deverá estar relacionado à demanda pretendida ou

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 77

estipulada. A quantificação refere-se ao número de vezes em que o mesmo ambiente

se repete. Os setores básicos de uma unidade de internação englobam duas áreas:

a de quartos, enfermarias e a área de apoio. O quadro 02 expõe as especificações

mínimas para os ambientes integrantes da unidade de internação pediátrica.

Unidade/Ambiente Características

Quarto

Criança

Piso/Parede: Liso (sem frestas) monolítico, de fácil

higienização e resistente aos processos de limpeza,

descontaminação e desinfecção

Teto: Resistente a lavagem e ao uso de desinfetantes

Portas: revestida com material lavável;

vão mín. = 1,1 x 2,1m; Possuir visor.

Risco de tramissão de infecção: Área semi-crítica

Enfermaria

Quarto

Adolescente

Enfermaria

Sala de Aula

Risco de tramissão de infecção: Área Não crítica*Área de Recreação / Lazer /

Refeitório

Quadro 02: Características do Espaço físico - INTERNAÇÃO PEDIÁTRICA

Fonte: Adaptado, RDC 50/2002; Goés (2011).

Observa-se que há a classificação de área não crítica de risco de transmissão de

infecção*, na área de recreação e sala de aula, contudo pela rotatividade e manuseio

dos objetos componentes do ambiente faz-se necessário a higienização seguindo as

regras/normas do estabelecimento, como o caso de livros de leitura, brinquedos, e

superfícies em geral, conforme orientação da RDC 50/2002.

Procurar e receber a orientação da equipe do Serviço de Controle de Infecção da

unidade. O brinquedista e o paciente devem sempre lavar as mãos ao entrar e sair

da brinquedoteca ou de algum outro ambiente da unidade, para evitar qualquer

possibilidade de transmissão de doenças ou infecção tanto para o brinquedista

quanto para o paciente. (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA DO

MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002).

Os pacientes que estão com infecções altas e que podem transmitir às outras

crianças, ou aqueles que devem manter repouso impossibilitando-os de sair do leito, é

interessante que tenha um transporte para levar o brinquedo até eles. Deve ser sempre

lembrando que após o uso é de extrema necessidade a higienização. Para facilitar a

higienização dos brinquedos é recomendado estabelecer uma rotina de higienização

e armazenamento dos brinquedos.

O produto final do planejamento, que é o projeto globalmente considerado,

deve atender a algumas condições fundamentais, em particular a flexibilidade, a

funcionalidade e a concentração. Assim, como as unidades de internação têm vida útil

muito mais longa do que as unidades de tratamento, aquelas devem ser facilmente

renováveis sem alteração da estrutura das instalações básicas do hospital.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 78

4 | LEVANTAMENTO EMPÍRICO

Buscou-se a complementação do referencial teórico com o suporte do referencial

empírico, com a exposição descritiva da infraestrutura componente do espaço físico

necessário a uma internação, tratando-se do público pediátrico, um estabelecimento no

Rio de Janeiro e outro em Brasília. E posteriormente ilustrou-se os espaços referentes

a classe hospitalar e brinquedoteca em diversos estabelecimentos de assistência a

saúde distribuídas em duas (02) regiões (geográficas) do país, Nordeste e Sudeste.

4.1 Instituto Nacional do Câncer (INCA)/Seção de Oncologia Pediátrica, RJ

Funciona no 11º andar dispõe de diversas clínicas e da área de recreação

infantil. As Enfermarias para pacientes infanto-juvenis estão localizadas no 5º andar,

juntamente a Classe Hospitalar que tem como objetivo proporcionar o atendimento

pedagógico à crianças e adolescentes portadores de neoplasia, em tratamento

quimioterápico ambulatorial e assegurar a manutenção dos vínculos escolares,

devolvendo a criança para sua escola de origem, com a certeza de que ela poderá se

reintegrar ao currículo e aos colegas, sem prejuízo devido ao afastamento temporário. É

realizado o atendimento escolar destinado a crianças da Educação Infantil e do Ensino

Fundamental internadas ou em tratamento ambulatorial (Pediatria / Quimioterapia /

CEMO) no Instituto. As atividades escolares são desenvolvidas diariamente por duas

professoras, que, inicialmente, procura-se descobrir as áreas de interesse do aluno para

viabilizar sua expressão, possíveis dúvidas acadêmicas e a aquisição do vínculo, fator

primordial para o aprendizado. A partir desse contato, são planejadas atividades que

possibilitem a criança superar suas dificuldades e apropriar-se de novas habilidades e

competências. Nas situações em que o paciente estiver inserido numa escola regular,

é solicitado aos responsáveis que tragam para o hospital todo o material

,

escolar da

criança a fim de que seja garantida a continuidade do currículo desenvolvido pela

escola de origem. A classe hospitalar funciona como uma escola comum, com provas,

notas e tarefas, que são repassadas para uma planilha individual de cada paciente

e depois para as respetivas unidades escolares, nos quais eles estão matriculados.

As aulas acontecem de segunda a sexta-feira, das 7h às 11h30. A Brinquedoteca é

um espaço lúdico do Hospital de Câncer I, instalada no mesmo andar onde ficam

os 31 leitos da Oncologia Pediátrica, Cirurgia Pediátrica, Hematologia Infantil e CTI

Pediátrico.

4.2 Instituto do Câncer Infantil e Pediatria Especializada (ICIPE), Brasília

Os pacientes submetidos a internação prolongada, o aluno internado contará com

professora da classe hospitalar para ministrar o conteúdo de sua série nas escolas.

Em caso de paciente submetido a internação curta, mas recorrente, o paciente

receberá auxílio em suas tarefas escolares durante o período que está no hospital; a

professora da Classe Hospitalar faz link com a escola do paciente no sentido de dar

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 79

esclarecimentos sobre sua doença e necessidades de reforços e concessões. E as

brinquedotecas interativas, cujo espaço físico é dividido em “cantos” planejados para

oferecer atividades que possibilitem experiências correspondentes às necessidades

de cada etapa de desenvolvimento cognitivo e emocional, procurando respeitar, além

disso, limitações físicas. 1. O canto dos bebês: destinado às crianças de 0 a 3 anos

de idade com brinquedos que estimulem a percepção sensorial e coordenação motora

além de bonecos grandes, bichos e acessórios; 2. O canto do faz de conta: oferece

material facilitador para o jogo simbólico. Destinado a todas as crianças, oferecendo

brinquedos que representam o mundo dos adultos e estimulam a imaginação

a criatividade, em meio a bonecas, panelinhas, carrinhos, Consultório médico,

supermercado e farmácia, dentre outras; 3. O canto da leitura e teatro: representa

um convite à criança, ao adolescente e aos familiares para descobrirem juntos o

prazer da leitura e da representação, estimulando sua fantasia e imaginação; 4. O

canto da informática e jogos: espaço equipado com computadores, jogos eletrônicos,

programas interativos, vídeo games, jogos de regras, de tabuleiro, cartas, quebra-

cabeças, revistas e livros para diferentes idades.

4.3 Unidades localizadas na região Nordeste

Em estabelecimentos de assistência à saúde, localizados em duas capitais da

região Nordeste, as figuras 02 e 04 representam edifícios concebidos para atendimento

pediátrico exclusivamente, pacientes oncológicos, e a figura 03 expõe um edifício

hospitalar com toda complexidade de uma unidade de internação, adulto e pediátrico,

exceto lactante e neonatal.

Figura 02: Maceió/AL Figura 03: Maceió/AL Figura 04: Fortaleza/CE

4.4 Unidades localizadas na região Sudeste

A inclusão de Classe Hospitalar e Brinquedoteca em unidades de internação

cuja atribuição seja assistência por período superior a 24 horas, atenção contemplada

na região sudeste aqui exposta nas figuras 05 e 06, representada por exemplares de

duas de suas três (03) capitais.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 80

Figura 05: São Paulo/SP Figura 06: Macaé/RJ

4.5 Conceitos: Modelos x Não Padrão

Detalhes arquitetônicos específicos para as unidades de internação pediátrica,

como, por exemplo, os elementos que promovem conforto visual como detalhes

coloridos, iluminações em locais adequados, uso de cores e desenhos nas paredes,

programação visual.

Figuras 07, 08, 09 e 10: Exemplos de propostas Classe Hospitalar/Brinquedoteca

5 | ASPECTOS FÍSICOS DO ESPAÇO, INSTALAÇÕES E EQUIPAMENTOS

Os ambientes são projetados com o propósito de favorecer o desenvolvimento e

a construção do conhecimento para crianças, jovens e adultos, no âmbito da educação

básica, respeitando suas capacidades e necessidades educacionais especiais

individuais. Uma sala para desenvolvimento das atividades pedagógicas com mobiliário

adequado e uma bancada com pia são exigências mínimas, com instalações sanitárias

próprias, completas, suficientes e adaptadas são altamente recomendáveis e espaço

ao ar livre adequado para atividades físicas e ludo-pedagógicas. Além de um espaço

próprio para a classe hospitalar, o atendimento propriamente dito poderá desenvolver-

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 81

se na enfermaria, no leito ou no quarto de isolamento, uma vez que restrições impostas

ao paciente por sua condição clínica ou de tratamento assim requeiram. O atendimento

pedagógico poderá também ser solicitado pelo ambulatório do hospital onde poderá

ser estabelecida uma sala específica da classe hospitalar ou utilizar-se os espaços

para atendimento educacional.

Nas classes hospitalares, sempre que possível, devem estar disponibilizados

recursos audiovisuais, como computador em rede, televisão, máquina fotográfica,

filmadora, videokê, antena digital e aparelho de som, bem como telefone, com chamada

a ramal e linha externa, rede de internet wifi. Recursos que se fazem essenciais tanto

ao planejamento, desenvolvimento e avaliação do trabalho pedagógico, quanto para

o contato efetivo da classe hospitalar, seja com a escola de origem do paciente, seja

com o sistema de ensino responsável por prover e garantir seu acesso escolar. Da

mesma forma, a disponibilidade desses recursos propiciará as condições mínimas para

que o paciente mantenha contato com colegas e professores de sua escola, quando

for o caso. Associadas as atividades desenvolvidas nas brinquedotecas, videotecas,

bibliotecas e quaisquer ferramentas do acervo de estímulo cognitivo.

As brinquedotecas dentro de um ambiente, sobretudo lúdico, com característica

de brincadeira, de jogo e divertimento, devem ser reservado ambiente para cada tipo de

atividade, e conter mobílias infantis, roupas e casinha de bonecas (cozinha com pia de

lavar, louça, geladeira, fogão, mesa, cadeiras, loucinhas, panelinhas e outros utensílios

domésticos); espaço temático como hospital com uniforme de enfermeira, consultório

médico, que serve para estimular hábitos de higiene e saúde; ou supermercado com

carrinho de feira e coisas para comprar; ou camarim com espelho, fantasias, chapéus,

adereços, bijuterias, maquiagem, roupas, sapatos, chalés, gravatas e fantasias.

Também pode reservar espaço para dramatização, onde as crianças com

bonecos e fantoches, fantasias e todo o material “de faz de conta”, farão suas

apresentações. Esse espaço deve ter tapetes e almofadas. Os livros são usados

como brinquedos e não com seriedade com que seriam usados em uma biblioteca

infantil. Estantes com livros, jogos, quebra cabeças que embora guardados estejam à

disposição das crianças; e Estante de Brinquedos, separados de acordo com faixas

etárias, para serem manuseados livremente, sugerindo diferentes formas de brincar.

Com a dinâmica da atualidade, com a diversidade de dispositivos e ferramentas, pode-

se prover espaço para as invenções, disponibilizando brinquedos que estimulem a

criatividade. Ou acrescentar espaço de eletrônicos: computadores, jogos eletrônicos,

criação de desenhos através de softwares.

As Características dos brinquedos, fabricados em material que propicie a assepsia,

devem ser leves e resistentes, seguros e atraentes. A utilização de uma pintura alegre

e com cores vivas é imprescindível para manter a atenção dos pequenos. Pontas

aparentes e salientes devem ser abolidas, optando-se por brinquedos com cantos

arredondados e, portanto, mais seguros.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 82

6 | CONSIDERAÇÕES FINAIS

As instalações de Classe Hospitalar e Brinquedoteca tendem a propiciar a

promoção de sua saúde física e psicológica

,

e da melhor adesão aos tratamentos

médicos. Uma Classe Hospitalar não é (ou não deveria ser) uma sala de aula

tradicional, com bancas enfileiradas e quadro à frente, onde se lecionam disciplinas

sequenciadas, tampouco é uma “salinha de brinquedos”, comumente usuários e até

mesmo profissionais da equipe se referem ao local.

Nos diversos detalhes arquitetônicos devem ser identificadas e analisadas as

vantagens e desvantagens dos materiais de acabamento a serem utilizados nos

locais, para garantir funcionalidade, segurança e humanização. As questões de

acessibilidade, os mobiliários adequados às crianças, as instalações necessárias e os

aspectos do conforto ambiental. A atividade escolar e de lazer (recreação) no hospital

contribuem para a diminuição do estresse causado pelas sucessivas internações,

proporciona integração entre os profissionais e permite que o paciente sinta-se

produtivo no seu papel de aprendiz. Isto favorece a construção do conhecimento e

contribui para a promoção da saúde.

As classes hospitalares existentes ou que venham a ser instituídas deverão estar

em conformidade com o preconizado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação e

pelas Diretrizes Nacionais da Educação Especial na Educação Básica.

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11/05/2018

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Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 6 83

julho de 1990. DOU de 16/07/1990 – ECA. Brasília, DF.

______. Lei nº 9.394. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 20 de dezembro

de 1996. Presidência da República. Brasília, DF

______. Lei Federal Nº. 11.104/2005. Dispõe sobre a obrigatoriedade de instalação de

brinquedotecas nas unidades de saúde que ofereçam atendimento pediátrico em regime de

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______. Ministério da Saúde. RDC nº 50, de 21 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre o Regulamento

Técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de

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______. Ministério da Saúde. Programação Arquitetônica de Unidade Funcionais de Saúde.

Volume 2. Internação e apoio ao diagnóstico e terapia (reabilitação). SOMASUS. Brasília: 2013.

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Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 84

MÉTODO DE AVALIAÇÃO E ANÁLISE PARA REFORMAS

EM UNIDADES DE SAÚDE MUNICIPAIS SEGUNDO

PRIORIDADES DE EXECUÇÃO

CAPÍTULO 7

doi

Carlos Eduardo Gomes Engelhardt

Especialista Em arquitetura Hospitalar INBEC

Universidade São Paulo Arquiteto e Urbanista

UFPR – Curitiba

Cascavel – Paraná

Edison Luiz Leismann

Doutor em Economia aplicada pela UFV. Pós

Doutorado em Administração – UPPE

Professor Associado da Unioeste – Cascavel

Cascavel – Paraná

Ana Paula Vansan

Mestre em Engenharia Civil pela UTFPR

Câmpus Pato Branco

Engenheira Civil – UTFPR – Câmpus Pato Branco

Cascavel – Paraná

RESUMO: Este relato técnico apresenta método

de avaliação e análise de 18 reformas em

unidades de Saúde no Município de Cascavel

– PR utilizando recurso do Governo do Estado

no valor de R$ 2.000.000,00 tendo como teto o

valor de R$ 150.000,00 por unidade. Utilizando

planilha Técnica, questionário para coordenador

e questionário para usuários de maneira que

possibilite priorizar os recursos nas unidades

de maneira mais eficiente possível.

PALAVRAS-CHAVE: Reformas, método de

avaliação, análise, Unidades de Saúde

METHOD OF EVALUATION AND ANALYSIS

FOR REFORMS IN MUNICIPAL HEALTH

UNITS ACCORDING TO EXECUTION

PRIORITIES

ABSTRACT: This technical report presents

a method for the evaluation and analysis of

18 reforms in Health Units in the Municipality

of Cascavel-PR using State Government

resources in the amount of R $ 2,000,000.00

with a ceiling of R$ 150,000.00 per unity. Using

Technical sheet, questionnaire for coordinator

and questionnaire for users in a way that allows

to prioritize the resources in the units in the most

efficient way possible.

KEYWORDS: Reforms, method of evaluation,

analysis, Health Units

1 | INTRODUÇÃO

Nos Municípios Brasileiros a falta de

manutenção nas unidades públicas como no

caso a ser estudado, Unidades de Saúde, se tem

uma grande lacuna de tempo da construção da

unidade até a sua manutenção, não permitindo

um perfeito uso das unidades.

Relatos da precariedade são encontrados

diariamente nos noticiários, sendo sempre

um fato positivo quando se inaugura uma

unidade nova, mas as unidades antigas vão se

deteriorando até conseguirem ser privilegiadas

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 85

com recurso para uma nova obra.

,

Ressalta-se a dificuldade dos municípios fazerem pequenos reparos. Muito mais

difícil fazer grandes intervenções de manutenção. No caso em estudo, é importante

informar que não se tinha quase recursos para reformas menores, que atenderiam

esta manutenção das unidades. Para suprir tal necessidade foi oferecido pelo Estado

do Paraná através de recurso de até R$ 150.000,00 por unidade de saúde, permitindo

que os municípios possam através de projeto básico simplificado de arquitetura de

reforma e com uma planilha orçamentária dentro das especificações da Secretaria

do Estado captar este recurso e fazer a manutenção de pisos, esquadrias, pintura,

telhados e acessos.

A Secretaria de Saúde do Município de Cascavel tem construído uma média de

quatro obras por ano. Mas em 2018, 2019 e 2020, se tem uma previsão muito superior.

Muito advém de alinhamento político nas três esferas, Município, Estado e Federal

que ocasionou recursos extras para novas unidades de saúde. Há previsão de vinte

e duas reformas (manutenção) de unidades de saúde, sendo duas de ampliações de

UPAs (Tancredo e Brasília), uma de ampliação USF Colmeia, uma de construção UBS

Neva e mais dezesseis para unidades novas, das quais quatro Porte II, cinco Porte III

e sete Porte IV.

A grande escala de recursos para novas unidades traz um futuro com praticamente

toda a estrutura do município de Cascavel renovada, mas traz a preocupação de

falta de equipe para executar todos estes projetos e compatibilizar de acordo com

esta demanda. A equipe, que contava somente com o arquiteto e urbanista e dois

estagiários de arquitetura, foi ampliada, o que vai ajudar na execução dos projetos

complementares, sendo antes todos os complementares licitados. Hoje a secretaria

de Saúde conta com um Arquiteto e Urbanista especializado em arquitetura Hospitalar,

um Engenheiro Civil e cinco estagiários de engenharia, arquitetura e administrativo.

Devido a problemas jurídicos, há dificuldade para a contratação de projetos

complementares, o que gera problemas, por exemplo, na captação de recurso para

obras novas através de Recurso Estadual. O Recurso Federal já disponibiliza a

captação do recurso desde que se tenha o projeto arquitetônico aprovado na vigilância

Sanitária.

Diante do exposto, como realizar a priorização de reformas estruturais de

unidades de saúde municipais?

O Município de Cascavel foi contemplado com R$ 2.000.000,00 permitindo que

se fizessem várias adequações ao mesmo tempo. Com isso, essa pesquisa tem como

objetivo apresentar um método de classificação e análise de unidade de saúde para

reformas simultâneas, com determinação das especificações a serem ajustadas.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 86

2 | FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Através da necessidade da licitação da reforma e adequação de 18 unidades

ao mesmo tempo, algo novo pela demanda de pequenas adequações nas unidades

e a grande escala de unidades ao mesmo tempo, procurou-se estudar maneiras de

executar a tarefa de forma que pudessem ser tiradas as informações para futuras

pesquisas sobre a viabilidade ou não destas adequações em grande escala. Mas

como o Brasil já é um país continental que já tem este desafio gigantesco que é o

SUS, Sistema Único de Saúde, As Unidades Básicas de Saúde são de fundamental

importância:

As Unidades Básicas de Saúde – Instaladas perto de onde as pessoas moram,

trabalham, estudam e vivem – desempenham um papel central na garantia à

população de acesso a uma atenção à saúde de qualidade. Dotar estas unidades

da infraestrutura necessária a este atendimento é um desafio que o Brasil – único

país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes com um sistema de saúde

público, universal, integral e gratuita – está enfrentando com os investimentos do

Ministério da Saúde. (Brasil, 2012, p.9).

Buscou-se através de Avaliação Pós Ocupação (APO), entrevistas com

funcionários e usuários para se obter uma leitura melhor do ambiente, segundo Gil

(2008, p.34) “proporcionar maior familiaridade com o problema (explicita-lo). Pode

envolver levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas experientes no problema

pesquisado. Geralmente assume a forma de pesquisa bibliográfica e estudo de caso.”

Tendo o princípio da humanização nas unidades a experiência do arquiteto

vivenciando o dia a dia nas unidades de saúde, permitem verificar ajustes a serem

feitos, cada unidade nova concebida tem alterações, a Secretaria de Saúde já possui

modelos padrões de duas equipes, três equipes e quatro equipes sendo que cada

padrão vai se atualizando, mas as unidades reformadas são as que já têm um bom

tempo de construção e são versões anteriores. O recurso não permite a reestruturação

completa da unidade sendo necessário um estudo diferenciado para cada unidade.

“A questão também aparece no centro da conhecida postulação que estrutura o

campo da saúde coletiva, a o definir a si próprio com o campo de conhecimento

e prática, qual seja, a aliança da ciência e da técnica com a política. É bem

verdade que isto pode ser pensado com o uma aliança a posteriori, isto é, após a

produção do conhecimento... então a prática. Mas também é verdade que temos

tido envolvimentos com a prática em que nem sempre foi possível esperar o

conhecimento científico, produzido com temporalidades diversas das necessidades

políticas de intervenção.” (HARTZ, 2000, P.10).

O Ministério da Saúde considerando a necessidade de aprimorar a estrutura física

das Unidades Básicas de Saúde (UBS) instituiu o programa de Requalificação de UBS

Componente, Construção, Reforma e Ampliação Conforme Amorin et al (2013, p.215):

O recente processo de municipalização da saúde brasileira vem viabilizando

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 87

condições de melhoria, como resultado da participação das comunidades e dos

movimentos sociais, possibilitando, assim, que a atenção primaria seja priorizada,

inclusive com a criação de normas e decretos relativos a novas formas de

financiamentos públicos, e viabilizando aos gestores da saúde o cumprimento do

preceito constitucional da integridade.

Como Donabedian, (1997) relata boas condições de estrutura são pré-condições

para um bom processo, que aumenta a probabilidade da ocorrência de desfechos

(resultados) positivos. Investir em novas unidades para se ter a cobertura é necessário,

mas não se pode esquecer da estrutura existente que aumenta a possibilidade de êxito

nas atividades de promoção a saúde como as Equipes de Saúde da Família (ESF) que

precisam de ambientes adequados para atender pacientes e funcionários.

A ESF é o eixo do SUS e, como tática de organização da APS, tem potencialidades

para resolver até 85% das demandas às unidades de Saúde da Família. Dessa forma,

tem capacidade de racionalizar a demanda originária de seu território para ações

de saúde, o que deve ser viabilizado pela sua característica de primeiro contato dos

usuários com o SUS (ALEIXO, 2002, TAKEDA, 2004).

3 | METODO DO RELATO

Foram analisadas 18 reformas e/ou adequações em Cascavel realizadas com

recursos do Governo do Estado do Paraná. A seleção das unidades foi realizada

com base em uma breve análise nas unidades existentes, listadas em planilha, a fim

de caracterizar a situação das unidades e classifica-las de acordo com os critérios

Péssimo, Regular e Bom ou está previsto nova construção.

Com esta relação fez-se a escolha das unidades junto com o Secretário de Saúde

e corpo técnico. Após a escolha das unidades a serem reformadas e/ou adequadas,

levantou-se, com planilha criada para esta verificação, a situação da unidade por

ambiente, registrando as informações com fotografias e no relatório técnico simplificado.

Foi concebido um questionário para a coordenação da unidade de saúde (Apêndice 1) e

um questionário para os usuários (Apêndice 2), sendo este coletado com dez usuários

escolhidos aleatoriamente. Por se tratar de dezoito unidades a serem reformadas

,

ou

adequadas optou-se por ferramentas de avaliação rápida e com boa assertividade.

A produção das planilhas e questionários foi executada de abril a maio e a

coleta dos dados de junho a setembro de 2017. Os questionários e planilha foram

impressos em papel A4 e preenchidos à caneta. Os questionários foram sintetizados

estatisticamente através de cálculos de frequência entre outubro a novembro de 2017.

Após visita de cada unidade, com auxílio dos relatórios, planilha e fotos, executou-se

o projeto básico de reforma e/ou adequação e a planilha orçamentária.

O Estudo de Caso foi relacionado à planilha de verificação adotada, e a sua

classificação das unidades como um todo, através de avaliação estatística descritiva

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 88

de frequência. Esta análise permitiu uma leitura gráfica geral das unidades, com

questionário para os usuários em uma seleção de 10 usuários de cada unidade e

posterior concentração em uma única avaliação estatística descritiva de frequência,

um questionário técnico por unidade e depois concentrando as 18 em uma única

avaliação estatística descritiva de frequência. Com as duas avaliações, a técnica e

a dos usuários permite-se que se façam as escolhas de forma mais objetiva e maior

índice de acerto. O Cronograma das obras também é um item importantíssimo para

que as obras aconteçam a contento, mas não é tema deste estudo.

Conforme vão ocorrendo as reformas e com seu término será coletado a opinião

de dez usuários sobre a unidade após a pequena reforma (manutenção). Duas

unidades já tiveram a reforma terminada. Nestas unidades só foi feito a pintura, critério

utilizado de intercalar unidades de somente pintura com as que têm trocas de pisos,

acessibilidade, janelas, forros e instalação de divisórias em Dry Wall no local das

divisórias navais. Tal avaliação deve ser tema de próximo estudo comparando o antes

e depois das dezoito unidades, mas o mesmo já apresenta fatos interessantes.

4 | CONTEXTO DA SITUAÇÃO – PROBLEMA

O Município de Cascavel tem crescido consideravelmente no número de USF

para atender a demanda do município, partindo para unidades maiores para que possa

contemplar mais equipes e permitir uma cobertura maior. Atualmente o município está

projetando unidades com quatro equipes de Saúde de Família. Quanto mais recurso

investido na base, ou seja, nas USFs, menos o Brasil irá gastar com recurso nas UPAs

e Hospitais, pois a população estará recebendo atendimento preventivo com cuidados

básicos de saúde, permitindo uma vida mais saudável.

Está prevista instalação de academias de saúde junto das unidades de quatro

equipes, com pista de caminhada e equipamentos para atender desde a criança até

a terceira idade, com profissional de educação física destinada ao acompanhamento

das atividades, atuando em conjunto com a equipe de saúde da USF e permitindo um

treinamento adequado para cada paciente com uma interação benéfica ao usuário. A

ideia é remover o estigma do Posto de Saúde aonde só se vai quando está debilitado

e doente, para um novo estágio onde exista um ambiente que permite a manutenção

de saúde ou melhorar a saúde.

Em 2012 o Município de Cascavel possuía 33 unidades de saúde, em 2018 conta

com 45 unidades, com estimativa de construção de mais 16 unidades até 2020 e

reforma de 23 unidades de saúde e reforma e ampliação de duas UPAS: UPA Brasília

e UPA Tancredo.

Voltando ao tema das reformas das unidades de forma simultânea, para a logística

das reformas minimizar o impacto das reformas de manutenção é importante que seja

utilizada uma comunicação clara à população, enfatizando de que se trata de uma

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 89

reforma parcial, na troca de materiais desgastados, ou seja, não haverá intervenções

nas estruturas. Deverá ocorrer sintonia entre a construtora contratada e o município

para que ocorra a liberação da unidade com a remoção da mobília e equipamentos

para que a construtora possa iniciar o serviço e posterior a reentrada dos equipamentos

e mobiliário por parte da prefeitura para que a mesma possa reiniciar as atividades

na unidade. Muitos itens devem aparecer para ajuste que não estão contemplados

na planilha, mas deverá ser ajustado pelo município quando não contemplado para

que a construtora faça a adequação. Com o baixo recurso desestimula as reformas e

ampliações.

A última licitação encaminhada para reforma e ampliação da USF Colmeia, tem

um valor de R$ 828.572,51. Tal valor é muito superior ao valor repassado pelo Estado

do Paraná como incentivo de Reforma e ou/ Recuperação – APSUS Resolução SESA

n° 198/2016 no valor máximo de R$ 150.000,00. Fica claro que o recurso não é

suficiente para uma reforma completa ou intervenções na estrutura da unidade, sendo

caracterizado como um recurso para a manutenção das unidades, priorizando a troca

de pisos, esquadrias e pintura. Devido o adensamento nas cidades e a demanda do

Município de Cascavel-PR, o mesmo está optando por padrões de porte II, III e IV,

prevendo em algumas o futuro crescimento da região.

As unidades de Saúde estão localizadas no Município de Cascavel no oeste do

Paraná que possui hoje uma população de aproximadamente 320 mil habitantes tem

um contexto de mais de 40 unidades de saúde podendo ter um acréscimo nos próximos

dois anos de mais 16 unidades. Destas unidades existentes mais de 67% precisam

de manutenção e ajustes. Tal intervenção em grande escala em dezoito unidades

ao mesmo tempo, apesar de ser um desafio pode trazer um ajuste nas unidades em

questão de estrutura e conservação, pois passariam de 67% para 23,25% as unidades

que precisam de intervenção.

Sendo assim as unidades com intervenção serão: UBS Aclimação, UBS Cancelli,

UBS Cascavel Velho, UBS Floresta, UBS Los Angeles, UBS Pacaembu, UBS Parque

São Paulo, UBS Santa Cruz, UBS Santa Felicidade, UBS São Cristóvão, USF

Brasmadeira, USF Cataratas, USF Guarujá, USF Interlagos, USF Morumbi, USF

Parque Verde, USF Santo Onofre e USF XIV Novembro.

5 | RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Planilha Técnica de avaliação, desenvolvida através de pesquisa bibliográfica

e experiência profissional, permitiu uma melhor caracterização quanto a qualidade

das Unidades de Saúde avaliadas, classificando cada setor da mesma (Ver Apêndice

4). Sendo assim, os itens avaliados na planilha foram Ambiente Geral, Paredes e

Divisórias, Tetos, Pisos Acabados, Instalações Elétricas, Instalações Telefônicas,

Esquadrias e Equipamentos (quantidade). Com isso é possível classificar a Unidade

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 90

quanto a questões Gerais, com foco na sinalização, conforto, iluminação, acústica e

aparência.

Com base na avaliação prévia, selecionou-se as 18 unidades listadas acima,

bem como pode-se realizar um levantamento orçamentário e um tempo estimado

necessário para a realização de cada uma das adequações. Pode-se observar que

as unidades que demandam maior tempo e investimento foram UBS Aclimação, UBS

Cancelli, UBS Floresta, UBS Los Angeles, UBS Santa Cruz, USF Cataratas, USF

Guaruja e USF XIV de Novembro, isso porque foram as caracterizadas em piores

condições ou necessitando de reparos no custo mais elevado de R$ 150.000,00.

A Figura 1 mostra as dezoito Unidades UBS/USF selecionadas para análise pelo

usuário, com resultados da classificação do piso. Foram classificados como regular

41% dos casos pesquisados, seguidos de 34% classificados como Bom. Esse fator

reflete que a necessidade de reparos no piso em grande parte das unidades avaliadas,

sendo um dos principais fatores elencados para investimento.

Figura 1 – Classificação pelo usuário das condições dos pisos das UBS/USF de Cascavel-PR

Fonte: Autores.

Continuando na avaliação do piso, a Figura 2 ilustra a relação da frequência das

tipologias (revestimento) dos pisos, entre as unidades avaliadas, sendo classificados

como cerâmica 68% dos

,

casos pesquisados. O revestimento ser predominantemente

cerâmica pode estar relacionado com a classificação em grande parte regular por,

apesar de ser de maneira geral, resistente, mas com a limpeza inadequada com

produtos fortes tiram a camada de proteção do piso cerâmico, os tornando difícil de

limpar, o que da um aspecto ruim quanto ao quesito estético.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 91

Figura 2 – Classificação pela planilha técnica das tipologias de pisos das UBS/USF de

Cascavel-PR

Fonte: Autores.

Quanto a classificação da pintura, expostas em forma de frequância na figura

3, observa-se que entre regular (44%) e péssimo (37%) totalizou 81% das unidades

avaliadas, ou seja, um dos quesitos em situação mais crítica entre os avaliados. Essa

classificação já era esperada uma vez que a pintura geralmente é o fator que exige

manutenção com maior frequência devido a durabilidade da tinta ser de, em média 2

a 5 anos.

Figura 3 – Classificação pelos usuários das condições das pinturas nas UBS/USF de Cascavel-

PR

Fonte: Autores.

A figura 4 complementa a avaliação anterior, classifica a conservação da parede

das unidades como 76% entre razoável e ruim. Enquanto na Classificação dos

usuários (nos apêndices) se encontra a conservação das paredes como 72% entre

regular e péssimo. Esse fato confirma a importância do investimento na manutenção

das mesmas. E se possível colocar proteções como revestimento melaminico e bate

macas.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 92

Figura 4 – Classificação conforme planilha técnica da conservação das paredes nas UBS/USF

de Cascavel-PR

Fonte: Autores.

Quanto a Ventilação, a figura 5 mostra as dezoito unidades UBS/USF selecionadas

para a análise dos usuários da classifica através de questionário das dezoito obras

como 40% de péssimo para a ventilação das unidades. O sistema de ventilação é

de alto custo, tanto para implantação quanto para manutenção, o que geralmente

não ocorre investimento em sistemas mais caros como ar condicionado, por exemplo.

Outro fator a se levar em consideração é a parte elétrica com maior demanda quando

se coloca maior quantidade de ar condicionado e as unidades antigas não estão

preparadas para tal.

Figura 5 – Classificação conforme questionário dos usuários das condições de ventilação nas

UBS/USF de Cascavel-PR

Fonte: Autores.

A Figura 6 mostra as dezoito unidades UBS/USF selecionadas para análise,

classifica através de planilha técnica das dezoito obras como bom 80% das. UBS/USF

de Cascavel-PR. Assim, pode-se dizer que é um dos fatores com menor necessidade

de investimento em melhorias, podendo redirecionar a verba para outros fatores mais

precários.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 93

Figura 6 – Classificação conforme planilha técnica das condições de ventilação nas UBS/USF

de Cascavel-PR

Fonte: Autores.

Ao se verificar as 18 unidades, em um contexto geral, observa-se que itens como

pintura, piso, ventilação estão entre as prioridades dos usuários nas unidades como

pode-se ver nas figuras 1 a 3. A questão da ventilação foi interpretada pelos usuários

como climatização também, por isso a avaliação de 74% de péssimo/regular e na

avaliação técnica de 20% ruim/razoável.

Ao avaliar os gráficos verifica-se um padrão dos usuários, onde o emocional

e situacional está mais envolvido, e a visão técnica está focando nos objetivos. Os

usuários não têm a formação na área na sua grande maioria, não avaliam com um

foco técnico, mas sim o que lhe chamou mais a atenção. O piso, por ser um elemento

que serve de ligação e circulação dentro da unidade e se o mesmo não for homogêneo

não permite em muitos casos a acessibilidade adequada, ou o piso inadequado como

o taco de madeira em algumas unidades antigas onde se tinha taco de madeira, o

que não é permitido pela vigilância sanitária, mas como há esta dificuldade de fazer

pequenas intervenções tal recurso permite com que o município corrija estas falhas.

O tratamento das paredes ainda é um grande desafio para as unidades públicas

de qualquer município. A pintura com tinta acrílica acaba se desgastando com o

tempo pelo alto fluxo dos usuários nas unidades, as quais devem sempre passar por

processo de limpeza severo. Será reforçado o barrado em cor mais escura para que

não manche a parede, sendo ideal o uso de revestimento melamínico de alta pressão

quando possível, ou revestimento cerâmico neste barrado.

O uso de divisória naval está sendo substituído também, pois não é permitido

pela vigilância sanitária o uso desta divisória, portanto será utilizado a divisória Dry

wall com pintura látex acrílica semi-brilho.

A ventilação nas Unidades é um fator importante a ser considerado. Uma

boa renovação de ar e iluminação adequada permite um ambiente mais salutar e

agradável para os pacientes e funcionários. Nestas adequações procurou-se ajustar

esta ventilação adequada, com instalação de esquadrias e ajustes das divisórias de

Dry Wall, para corredores mais amplos e ventilação e iluminação adequada. Neste item

é que ocorreu a maior variação de avaliação entre os usuários e o relato técnico. Os

usuários identificaram como ventilação a falta de ar condicionado em alguns ambientes

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 94

e ventiladores sem funcionar, aliados a sensação de desconforto pela quantidade de

pacientes no mesmo ambiente e temperaturas elevadas. Conforme o gráfico 5 com

74% entre regular/péssimo. Já no gráfico 6 feito pelos técnicos se tem 80% com boa

ventilação. Considerando que é a maioria dos ambientes tem ventilação adequada,

mas tem que se melhorar para chegar a 100% neste item para estar totalmente de

acordo. Com ambientes com janelas em todos os ambientes, permitindo ventilação e

iluminação.

6 | CONCLUSÕES

O objetivo da pesquisa é estabelecer e aplicar um método de classificação e

análise de unidade de saúde para reformas simultâneas, com determinação das

especificações a serem ajustadas. O objetivo foi alcançado tendo em vista que as

mesmas foram licitadas seguindo o método de classificação proposto, e já está

servindo de base para novas reformas com pequenos ajustes.

A questão mais complicada nestas 18 reformas foi o valor fixo de R$ 150.000,00

onde não se atinge a reforma no seu contexto pleno, sendo necessários ajustes e

adaptações posteriores por parte da Secretaria de Saúde. O que acarreta confusões

do que está a cargo da empresa e o que vai ser feito posteriormente pela prefeitura,

sendo o mais prudente colocar a contrapartida do recurso do município na mesma

licitação e a mesma empresa executar. A princípio parece complicado utilizar esta

metodologia de planilha técnica, questionário coordenador e questionário usuário com

a planta baixa da unidade. Mas quando surgem questionamentos o porquê de ter

trocado o piso e a esquadria, por exemplo, este embasamento torna-se extremamente

valido, lembrando que as reformas em questão são obras publicas. Apos ter em mãos

a classificação em gráficos torna-se mais evidente onde devem ser adequadas e que

materiais trocados.

Como sugestão acredito prudente não utilizar o recurso limitado sem colocar

contrapartida de recurso do município que possibilite o ajuste básico de forma completa.

Nestas reformas focadas na manutenção da unidade, como há muito tempo não eram

reformadas, se tem a dificuldade de resolver questões estruturais que não estão

contempladas e nem foram pensadas devido à quantidade de unidades a sofrerem

reformas simultâneas. Sendo prudente o município escolher um numero menor de

unidades e adequá-las por completo. Lembrando que muitas unidades tem recurso

para novas unidades o que permitia estas adequações com recurso limitado ao teto de

R$ 150.000,00, prevendo a execução da nova unidade em um ou dois anos.

É muito importante um feed back destas reformas com a população para ver o

que pode ser

,

por vezes com linhas orgânicas.

As duas residências selecionadas são apresentadas para apontar as

características significativas nas residências da cidade de Santo Cristo/RS e exibem-

nas cada uma de forma diferente.

Além disso, nossa indagação é clara: o que define se uma casa é ou não

contemporânea? Como é o uso dos diferentes materiais (vidro, aço, pedra) e como a

forma diferencia uma edificação da outra tendo as mesmas características?

A justificativa da escolha do tema em residências da cidade de Santo Cristo é

muito importante: mesmo com simplicidade, a arquitetura pós-moderna causa fascínio

em bastantes pessoas, mas ganha pouca atenção em cidades pequenas e afastadas.

Tal estilo arquitetônico também é muito relevante para a história da arte, já que une

pequenas particularidades de outras épocas e forma sua identidade.

A revisão bibliográfica, principalmente os livros de ZEVI (2002), PROENÇA

(2010) e CASTELNOU(2015) dão base para o desenvolvimento teórico. A pesquisa de

campo com visita às moradias traz a prática dos conceitos abordados: desenhos em

grafite, pinturas em aquarela e produção fotográfica ilustram aspectos importantes das

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 3

residências para que haja um maior entendimento do tema estudado. Neste texto as

residências estudadas serão identificadas como “casa Ost” e “casa Kleinert”.

Este texto é divido em três partes: a primeira discorre sobre a história da arte

e da arquitetura contemporânea; a segunda, sobre a casa Kleinert; e, por último,

informações sobre a casa Ost, também relacionando-as com as seções anteriores.

Temos como objetivo apresentar marcas da arquitetura contemporânea e

relacioná-las com às casas das duas famílias da cidade de Santo Cristo/RS. Além

disso, destacar como construções do mesmo estilo arquitetônico e mesmos elementos

estéticos podem se diferenciar tanto.

2 | HISTÓRIA DA ARTE E DA ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA

DIANA (2017) diz que o modernismo ergueu-se em um momento de instabilidade

política no Brasil. Em busca de um novo rumo artístico, a Semana da Arte Moderna,

que ocorreu em 1922, surge como um precursor da fuga ao tradicionalismo, mesmo

existindo integrações com costumes anteriores. Isso porque a Semana de Arte Moderna

buscou mostrar novas tendências artísticas principalmente no campo da linguagem,

da arte e da arquitetura.

A arte moderna pregava liberdade de formas e progresso, assim como no

Iluminismo, no século XVIII. A insatisfação com o que acontecia também foi uma

característica em comum. Novas formas de expressão foram produzidas ao passo

que o movimento moderno ganhava pinturas e esculturas com formas geométricas e/

ou deformações (PROENÇA, 2010).

Como a arte e arquitetura contemporâneas têm raízes modernistas, é inevitável

a comparação de uma escola com a outra.

Em exposições artísticas, as obras eram colocadas em pedestais ou paredes

até o fim do modernismo, fazendo o público se distanciar fisicamente da arte. Oposto

a isso, artistas contemporâneos inovaram ao fazer espectadores tocarem, sentirem

e interagirem com as exposições. Assim como CASTELNOU (2015, pg. 71): “a total

interação entre arte e vida.”, demonstra como essa nova percepção dos artistas traz

uma visão, que proporciona novos olhares diante da arte e do contexto sociocultural.

É arriscado prender mudanças ou padrões visuais a um só estilo. Não significa

que cada conjunto de ideias deva se diferenciar totalmente um do outro. A inovação

nunca foi total, mesmo com escolas que surgiram no fim do século XX, quando havia

o desejo de mudança.

Deste modo, percebemos que o movimento contemporâneo e moderno são

interligados. Um conjunto de ideias segue o outro, do mesmo modo que o modernismo

seguiu alguns costumes de períodos anteriores mesmo com a negação total ao antigo.

Características podem ser partilhadas entre os dois sem que percam sua identidade.

No fim da década de 1980, por exemplo, profissionais ligados à arquitetura

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 4

acreditavam que a sobreposição de camadas e a quebra da forma única e lisa de uma

edificação foram marca da arquitetura pós-moderna, embora fossem característica

marcante do Cubismo (PROENÇA, 2010).

Mas não é só de semelhanças que a arquitetura contemporânea é composta. ZEVI

(2002) diz que os projetos arquitetônicos da primeira metade do século XX revelavam

formas geométricas, tinham pouca ornamentação, usavam pilotis e estrutura separada

da vedação. A residência era dividida em um bloco decomposto em seis placas: as

quatro paredes, o teto e a laje do pavimento.

Mesmo com a recusa inicial dos artistas da segunda metade do século XX,

alguns grupos, com diferentes necessidades, seguiram certo padrão arquitetônico que

fez com que um novo estilo surgisse. Deste modo, contrariando as seis placas de

uma moradia moderna, a arquitetura contemporânea dividiu a casa em mais de um

bloco, contendo as seis placas em cada um deles e introduzindo formas orgânicas à

construção.

Muitos dos projetos contemporâneos têm camadas transparentes e detalhes em

vidro e aço e formas do movimento moderno e do Construtivismo Russo. A forma da

residência é manipulada e a iluminação é variada em cada ambiente, de acordo com

a necessidade. Tais marcas estão demonstradas nesta pesquisa.

3 | CASA KLEINERT

Em uma cidade do interior e com características que demonstram influência da

cultura alemã, a casa da família Kleinert esbanja arquitetura contemporânea em cada

traço.

De acordo com PROENÇA (2010, p. 191)

Na arquitetura mantendo a tendência decorativa que aplicara

nos objetos do cotidiano, o principal mérito desse movimento foi

compreender que com o ferro e o vidro era possível criar formas novas.

Em suma, na tendência decorativa da arquitetura do século XX, o maior sucesso

foi compreender que o ferro e o vidro seria a melhor forma de inovação.

A descoberta de novos materiais de construção permitiu cada vez mais obras

com formas ousadas. O vidro dá um toque atual à casa. Na fachada sul (ver figura 1),

a transparência destaca o pé direito alto, característica contemporânea que também

auxilia na iluminação natural do cômodo de maior permanência da casa.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 5

Figura 1 - Fachada Sul

Da autora, 2017

Na fachada sudeste (ver figuras 2 e 3), a circulação vertical fica a mostra e o vidro

arredondado evidencia a curva da parede.

Figura 2 - Fachada Sudoeste

Da autora, 2017

Além da materialidade marcante, o modo com que linhas orgânicas e retilíneas

se integram na escada dão impressão de imponência para um lugar que teria pouca

importância na forma da construção caso seguisse o padrão formal de caixa.

De acordo com Castelnou (2015, p. 77)

A ARQUITETURA PÓS-MODERNISTA alterou a fórmula de que a forma segue

a função, pois, para ela, esta segue a moda, o gosto, a fantasia, a nostalgia, a

memória e o contexto. A solução da forma não nasce do problema utilitário, mas

é criada na imaginação do arquiteto, que estabelece associações simbólicas tão

sutis que, não raro, só ele próprio torna-se capaz de refazer.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 6

Figura 3 - Vista sudoeste, em grafite

Da autora, 2017

Sintetizando, a arquitetura contemporânea deixou o pensamento modernista

de que a forma segue a função. Para o estilo pós-moderno, a forma segue a moda,

gosto do cliente, memórias, contexto, etc. A forma nasce com ideias do arquiteto que

simbolizam associações das características anteriores e é comum que somente o

profissional consiga refazer as linhas da edificação.

Buscando a relação com o presente, a casa Kleinert trata modismos, gostos e

contextos que abrangem uma nova modernidade. Incorpora discernimento ecológico,

tecnologia e identidade cultural e visual, já que a residência é uma das poucas na

cidade com design que integra vidro, curva e linha

,

mensurado que foi atingido apos as reformas. E que ponto melhorou a

classificação das unidades. Como as reformas já tiveram inicio e já se tem unidades

que finalizaram as adequações, já se iniciou a passar o questionário dos usuários para

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 7 95

verificar a visão da população quanto a estas pequenas reformas efetuadas. Tendo em

anexo os gráficos do antes e depois de duas unidades concluídas. Percebe-se que ao

corrigir a pintura de uma unidade, itens que apareciam com avaliação inferior passam

a ser melhor avaliada, mesmo que o piso não foi contemplado na reforma. Mas o

psicológico do usuário já tem uma sensação melhor do ambiente fazendo com que a

unidade seja melhor avaliada.

Seria interessante aumentar as pesquisas no campo empírico com avaliações e

classificações para pequenas reformas e manutenção das unidades públicas. Outro

fator importantíssimo é o custo de aproximado R$ 110.100,00 por unidade em um valor

aproximado de R$ 2.000.000,00 para dezoito unidades, caso fosse fazer dezoito novas

unidades teríamos um custo de aproximadamente R$ 30.600.000,00 levando-se um

valor médio de R$ 1.700.000,00 para cada unidade nova. Sendo sempre interessantes

as novas unidades contendo a estrutura adequada para atender a população.

Mas quando se tem varias unidades em qualidade entre regular e péssima é uma

alternativa de custo reduzido muito interessante e deve ser levada em consideração

pelos governantes.

REFERÊNCIAS

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Saúde, 2012.

BRASIL, Cartilha para apresentação de propostas ao Ministério da Saúde, Brasília: Ministério da

Saúde, 2014.

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2013.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 96

CAPÍTULO 8

doi

EFICIÊNCIA E SUSTENTABILIDADE NOS

AMBIENTES DE SAÚDE

Eleonora Coelho Zioni

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

Universidade de São Paulo

São Paulo- SP

RESUMO: Os ambientes de saúde precisam

abrigam as pessoas já que se vive muito mais

tempo em espaços construídos do que ao ar livre.

É muito importante que os estabelecimentos de

saúde ofereçam qualidade, segurança, eficiência

e sustentabilidade. Neste artigo, a eficiência

é entendida sob o aspecto operacional da

prestação do serviço assistencial com qualidade

e também zelando pela segurança do paciente,

assim como a eficiência da edificação de saúde

no consumo racional de recursos naturais

como energia e água. A eficiência econômica

deve ser atingida para a sustentabilidade de um

negócio tão complexo. Os edifícios de saúde

necessitam de eficiência e alto desempenho,

evitando danos e envolvendo o equilíbrio dos

aspectos econômicos, sociais e ambientais, ou

seja, a abordagem da sustentabilidade. Através

de uma visão rápida dos fatos marcantes

das últimas décadas, são apresentadas as

questões abrangidas pelos 17 objetivos do

desenvolvimento sustentável que constam

na Agenda 2030 elaborada pela Organização

das Nações Unidas (ONU). São apresentadas

algumas ferramentas de como atingir a

sustentabilidade nas edificações através dos

processos de certificações. Sejam certificações

de serviços de saúde como a promovida pela

Organização Nacional de Acreditação (ONA),

ou certificações ambientais para edificações

como LEED e WELL. Organizações a favor

de ambientes de saúde sustentáveis incluem

também: Hospitais Saudáveis e Saúde sem

dano. Em todas as ferramentas é necessária a

concepção dos aspectos ambientais, sociais e

econômicos com sinergia. Através da aplicação

dessas ferramentas de certificação, serão

obtidos ambientes de saúde mais eficientes,

saudáveis e sustentáveis preparados para os

cenários do amanhã.

PALAVRAS-CHAVE: Sustentabilidade,

Edifícios de saúde, Agenda 2030, LEED, WELL.

ABSTRACT: Health environments need to

shelter people as they spend much more time

living in built spaces than in the open air. It is

very important that healthcare facilities offer

quality, safety, efficiency and sustainability. In

the present article, efficiency is understood as

the operational aspect of providing care with

quality and also taking care of the patient safety,

as well as the efficiency of health building in

the rational consumption of natural resources

such as energy and water. Economic efficiency

must be achieved for the sustainability of such

a complex business. Health buildings need

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 97

efficiency and high performance, avoiding damages and involving the balance of

economic, social and environmental aspects, that is, the approach to sustainability.

Through a quick overview of the outstanding events of the last decades, it´s presented

the issues covered by the 17 sustainable development objectives contained in Agenda

2030 prepared by the United Nations (UN). Some tools are presented on how to achieve

sustainability in buildings through certification processes. These are certifications of

health services such as those promoted by the National Accreditation Organization

(ONA), or environmental certifications such as LEED and WELL. Organizations in favor

of sustainable health environments also include: Healthy Hospitals and Healthcare

without Harm. In all the tools it is necessary to design the environmental, social and

economic aspects with synergy. By applying these certification tools, will be achieved

more efficient, healthy and sustainable health environments prepared to tomorrow

scenarios.

KEYWORDS: Sustainability, Health buildings, Agenda 2030, LEED, WELL

1 | INTRODUÇÃO

Os ambientes de saúde devem zelar pelo maior bem do ser humano, a vida! A

vida é desenvolvida a maior parte do tempo dentro de um abrigo, de uma edificação.

O ser humano não consegue viver bem exposto às intempéries. Segundo dados

do World Green Building Council (World GBC) publicados em setembro de 2014 no

relatório denominado Health, Wellbeing & Productivity in Offices: the Next Chapter

for Green Buildings, passamos 90% do tempo total da nossa vida em um ambiente

construído. Só restam 10% do tempo de toda a nossa vida que permanecemos no

ambiente externo; quando vamos ao parque, caminhar ou à praia. (WORLD GREEN

BUILDING COUNCIL, 2016). Como devem se preparar os ambientes de saúde para

os cenários do amanhã?

É muito importante que os ambientes construídos possuam qualidade, sejam

seguros, eficientes e sustentáveis. Quando tratamos de ambientes construídos de

saúde, a importância é ainda maior. Se os ambientes de saúde não promoverem a saúde,

torna-se um grande paradoxo. Infelizmente há alguns anos atrás os estabelecimentos

de saúde eram voltados apenas a curar as doenças.

A mudança de paradigma de focar na saúde e não na doença das pessoas abre a

visão de planejamento dos serviços e de seus edifícios para uma maneira muito mais

holística agregando a complexidade do ser humano e suas diversas necessidades. Os

estabelecimentos devem focar em incentivar a saúde e o bem-estar das pessoas. A

Organização Mundial de Saúde (OMS) define a saúde como o perfeito estado de bem-

estar físico,

,

mental e social, e não apenas a ausência de doenças.

O equilíbrio entre os aspectos físico, mental, social e também espiritual

proporciona a tão procurada qualidade de vida. Sentir-se bem e viver com saúde são

itens essencialmente interligados. Saúde vista segundo a perspectiva de que os seres

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 98

humanos e outros organismos funcionam como unidades completas e integradas e

não um agregado de partes separadas.

Hipócrates, já dizia no século V a.C. que o atendimento aos pacientes deve

“primeiro não causar dano”. Infelizmente os ambientes estavam trazendo danos às

pessoas. As pessoas fumavam dentro dos hospitais, muitas infecções eram adquiridas

nos próprios ambientes de saúde, os produtos de limpeza irritavam os olhos dos

empregados, os equipamentos médicos eram feitos com materiais potencialmente

cancerígenos...

2 | ASPECTOS DA EFICIÊNCIA

Não causar danos é um dos objetivos do serviço de saúde. A eficiência deve- se

inserir junto à lista de inúmeros requisitos de desempenho necessários à prestação

de serviços em saúde e também do seu edifício e seus recursos físicos. Conseguir

o melhor rendimento com o mínimo de erros e dispêndios é a meta de implantar a

efetividade. Afinal os erros no serviço de saúde afetam a segurança do paciente e a

percepção da qualidade.

Uma revolução sobre a segurança e qualidade vem ocorrendo nas instituições de

saúde. Após a publicação do estudo de erros na saúde e eventos adversos, a segurança

do paciente passou a ser um atributo da qualidade dos serviços. O Ministério da Saúde

publicou a Política Nacional de Segurança do Paciente em 2014 devido à mudança na

forma de prestar os cuidados em saúde, com o avanço dos conhecimentos científicos.

Conforme a publicação do Instituto Brasileiro de Segurança do Paciente, o

Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar de 2017, produzido pela Faculdade de

Medicina da UFMG, no Brasil todo dia, 829 brasileiros falecem em decorrência de

condições adquiridas nos hospitais, o que equivale a três mortos a cada cinco minutos.

Observatório Nacional de Segurança Viária indica que ocorrem cerca de 164

mortes violentas (por homicídio e latrocínio, entre outros) por dia; o câncer mata 480 a

520 brasileiros por dia, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA). Isso significa

que os eventos adversos nos hospitais matam mais do que a soma de acidentes de

trânsito, homicídios, latrocínio e câncer! Os hospitais precisam ser ambientes mais

seguros.

Os dispêndios de recursos físicos e econômicos são altos para qualquer

estabelecimento dentro de um sistema único de saúde que possui como princípios

de universalidade no atendimento, integralidade e equidade para todas as pessoas.

Propiciar a assistência à saúde em todas as suas fases: promoção, prevenção,

reabilitação. O aumento da expectativa de vida brasileira atingiu 76 anos em 2018, a

maior média da história, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

(IBGE). Com o envelhecimento populacional, a pirâmide etária se inverterá a partir de

2030. O Brasil terá muito mais adultos e idosos do que jovens. Os estabelecimentos

de saúde precisam se preparar para essa demanda.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 99

O financiamento da assistência à saúde está um desafio cada vez mais difícil devido

à crise econômica financeira. Houve uma diminuição de 3,1 milhões de beneficiários

de planos de saúde no Brasil entre 2014 e 2017, segundo os da Associação Nacional

dos Hospitais privados (ANAHP). O impacto nos setores de saúde pública e privada é

significativo. Devemos evitar o desperdício seja de tempo, ou de recursos na saúde.

3 | O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Os hospitais são grandes consumidores de água e energia já que funcionam

24 horas por dia, 7 dias por semana e 365 dias no ano. A própria função hospitalar

demanda recursos energéticos com reserva constante, como para as áreas críticas.

A infraestrutura, os materiais e equipamentos não podem desperdiçar recursos no

hospital de hoje em dia. Inserido dentro de um contexto de melhoria na utilização

destes recursos essenciais deve-se implantar nos ambientes de saúde a eficiência

energética e consumo racional de água.

Inseridos nesse contexto bastante intrincado, quando são analisados os estudos

científicos relacionados às mudanças climáticas no nosso planeta. Os cenários do

amanhã podem não ser muito animadores... Portanto os edifícios de saúde devem

se preparar se preocupando com os aspectos econômicos, sociais e ambientais.

(SADLER, HAMILTON, PARKER, BERRY, 2006).

Vários fatores colaboram para agravar a situação como a urbanização acelerada,

o desperdício, o desmatamento, a poluição, as ligações clandestinas de água e esgoto,

a produção desenfreada de resíduos, a falta de planejamento e gestão consciente,

além do fator ambiental principal da escassez no volume de chuvas e os efeitos do

aquecimento global. Há décadas estudos comprovam que o aquecimento global

afeta irregularmente o regime de chuvas produzindo secas e enchentes mais graves

e frequentes, tende a aumentar a frequência e a intensidade de ciclones tropicais,

furacões e outros eventos meteorológicos extremos como as ondas de calor e de frio

que nós temos vivenciado.

A organização metereológica mundial (World Meterological Organization, WMO)

confirmou que a temperatura da terra continua aumentando e 2017 bateu o recorde

de mais quente seguindo depois de 2016 e 2015. As calotas polares estão derretendo

devido ao aquecimento global e aumentando o nível dos mares, ilhas do Pacífico

podem ser submersas e os corais estão ameaçados.

Os efeitos das mudanças climáticas repercutem não apenas na esfera econômica,

mas inclusive na ambiental e social, por consequência exigem superação das diversas

instituições de saúde. As pessoas sofrem devido às mudanças climáticas, doenças

são emergentes ou re-emergentes, a onde de calor na Europa provoca muitas mortes

não identificadas, as plantações de comida na Índia são devastadas gerando fome,

a poluição devido à industrialização na China causa muitas doenças respiratórias à

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 100

população.

Em 1987, na reunião da ONU, a Comissão Brundtland definiu o conceito de

Desenvolvimento Sustentável como:

‘Satisfazer as necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das

gerações futuras de satisfazer as suas próprias necessidades”.

Em 1972, o Clube de Roma formado por grandes pensadores para discutir política,

economia e meio ambiente, contratou o renomado instituto americano Massachusets

Institute of Technology (MIT). O relatório produzido pelo MIT utilizando modelos

matemáticos chegou à conclusão de que o Planeta Terra não suportaria o crescimento

populacional devido à pressão gerada sobre os recursos naturais e energéticos e ao

aumento da poluição, mesmo tendo em conta o avanço tecnológico. A publicação

foi nomeada ‘Limits to Growth’. Em 2006, foi publicado pela editora britânica o livro:

‘Limits to Growth: the 30-year update’. As constatações do livro retomam as questões

do buraco na camada de Ozônio e analisam as ferramentas para a transição global de

maneira sustentável.

Em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o

Desenvolvimento, também conhecida como Eco-92, a Cúpula da Terra, ou RIO 92, foi

uma conferência de chefes de estado organizada pelas Nações Unidas na cidade do

Rio de Janeiro para debater as questões ambientais. O encontro RIO +20 aconteceu

20 anos depois e estabeleceu o planejamento do futuro que queremos.

Em 2015, a Resolução 70/1 da Assembleia Geral das Nações Unidas instituiu:

“Transformando o nosso mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”,

que depois foi encurtado para ”Agenda 2030”. As metas são amplas e interdependentes,

mas cada uma tem uma lista separada de metas a serem alcançadas. Atingir

todos os 169

,

alvos indicaria a realização de todos os 17 objetivos. Os objetivos do

desenvolvimento sustentável (ODS) abrangem questões de desenvolvimento social

e econômico, incluindo pobreza, fome, saúde, bem-estar, educação, aquecimento

global, igualdade de gênero, água, saneamento, energia, urbanização, meio ambiente

e justiça social.

Os recursos naturais são bem finitos e a intervenção humana está provocando

consequências muito danosas ao planeta, ao meio ambiente e à população. Os

ambientes e as edificações de saúde precisam ser eficientes e sustentáveis e promover

saúde e bem-estar, alinhados aos objetivos do desenvolvimento sustentável.

4 | FERRAMENTAS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Os hospitais que estão olhando para os cenários do amanhã devem almejar

o conceito promovido pelo instituto americano de melhoria nos serviços de saúde,

Institute for Healthcare Improvement (IHI), os três grandes objetivos atuais (triple aim)

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 101

das instituições hospitalares envolvem a saúde, o bem-estar e a produtividade.

Nos Estados Unidos existe uma organização não governamental chamada Patient

Experience Institute que trabalha em parceria com The Beryl Institute para promoção,

divulgação, treino e também certificação de profissionais para atuar com a experiência

do paciente. Segundo The Beryl Institute: ‘Nós definimos experiência do paciente

como a soma de todas as interações, moldadas pela cultura de uma organização, que

influenciam a percepção de pacientes em todo o continuum de cuidados.’

A introdução do conceito de experiência das pessoas demonstra que o significado

da experiência de cada indivíduo no edifício de saúde depende da percepção pessoal,

e podemos inferir que almeja o resultado positivo. Esse aspecto está relacionado ao

conceito de bem-estar, que também é subjetivo, depende da satisfação com a vida

pessoal, mas pode ser entendido pelos afetos positivos (as emoções e a capacidade

cognitiva), descontados os fatores negativos. A sensação de segurança, conforto e

tranquilidade gera o bem-estar nos seres humanos.

Como nos ensina a Geometria, três pontos definem um plano. Para esses novos

conceitos se sustentem precisam do terceiro ponto, que é a produtividade. A equação

se fecha quando é viável financeiramente. Erros são desperdícios e não são bem-

vindos na saúde, pois podem aumentar os riscos de morte. A experiência é positiva

para todos os envolvidos e para o negócio quando se consegue reduzir os custos per

capita.

A abordagem de otimização da performance e melhoria no desempenho

dos edifícios de saúde é perseguir simultaneamente as três dimensões: saúde da

população, experiência com o cuidado e custos per capita.

O espaço físico colabora diretamente com os três grandes objetivos atuais

dos hospitais: com a saúde, o bem-estar das pessoas e com a produtividade. Estas

relações servirão como orientações para um planejamento e operação de um hospital

eficaz, consciente e eficiente. (SADLER, DUBOSE, MALONE, ZIMRIG, 2008).

Os estabelecimentos de saúde estão acostumados com ferramentas de

controles de qualidades que enfocam as avaliações de produtividade dos serviços

de saúde envolvendo a estrutura, o processo e os resultados. Visando melhorar

a ‘ciência da avaliação’ dos hospitais, a produtividade recorre a indicadores como

ferramentas ISO, Qualidade Total- TQM- Total Quality Management, CQI- Melhoria

Contínua da Qualidade- Continuous Quality Improvement, assim como aos processos

de acreditação de padrões assistenciais da qualidade de serviços de saúde nacionais

– ONA, Organização Nacional de Acreditação. Entre os sistemas de acreditação

internacionais para edifícios de saúde mais conhecidos são a Joint Commission

International - JCI ou o Canadian Council on Health Services Accreditation-CCASS.

O mercado da saúde está acostumado em aplicar ferramentas de qualidade nos

ambientes construídos. Existem vários outras ferramentas com processos de qualidade

como: Qmentum, Magnet, American Association of Blood Banks (Departamento de

Hemoterapia), American College of Radiology (Departamento de Imagem), College of

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 102

American Pathologists (Laboratório), assim como processos nacionais: Selo do Idoso

Intermediário e Projeto Hospitais Sentinela da ANVISA. Programas de qualidade para

evitar desperdício como o LEAN e Six Sigma, que se originaram na indústria, também

têm sido muito utilizados no mercado da saúde.

Dentre as certificações ambientais existentes atualmente no mundo, existem

várias entidades certificadoras de prédios projetados e construídos com consciência

ambiental e redução do impacto. O LEED- Leadership in Energy and Environmental

Design, é uma certificação para edifícios sustentáveis de origem americana, que possui

seu escritório no Brasil desde 2007, o Green Building Council Brasil, o GBC Brasil.

A Certificação internacional LEED possui nove dimensões a serem avaliadas

nas edificações. Todas elas possuem pré-requisitos (práticas obrigatórias) e créditos,

recomendações que quando atendidas garantem pontos a edificação. O nível da

certificação é definido, conforme a quantidade de pontos adquiridos, podendo variar

de 40 pontos, nível certificado a 110 pontos, nível platina. Os aspectos avaliados na

certificação são localização e transporte ao edifício, espaço sustentável, eficiência do

uso da água, energia e atmosfera, materiais e recursos, qualidade ambiental interna,

inovação e processos e prioridades regionais de cada edificação. (GREEN BUILDING

COUNCIL BRASIL, 2016).

O sistema LEED é o único vigente no Brasil que tem uma tipologia específica

para edifícios de saúde: LEED BD+C: Healthcare. Aplica-se para novas construções

ou grandes reformas em prédios que atendem pessoas que procuram tratamento

médico, incluindo Edifícios de Assistência a Saúde- EAS para pacientes internados,

serviços de assistência ambulatorial, e de longo prazo. Opcionalmente, pode ser usado

para edifícios com outros tipos de usos relacionados com a área da saúde, tais como

prédios de ambulatórios, consultórios médicos, odontológicos e veterinários, clínicas,

laboratórios, centros de reprodução, centros de terceira idade, prédios de educação

médica e centros de pesquisa.

Existem outras certificações ambientais para edifícios vigentes no Brasil, como:

a AQUA- HQE que foi desenvolvida baseada no modelo francês, Procel Edifica, Selo

Caixa Azul, além de certificações internacionais como: a norte-americana Living Building

Challenge (LBC), alemã DGNB, inglesa BREEM, japonesa CASBEE, chinesa CEC,

etc. A tendência é que essas ferramentas de qualidade se tornem mais desafiadoras

para não só reduzir impacto dos edifícios mas também que os prédios se tornem

restauradores.

A aplicação de ferramentas de qualidade e certificação ambiental tornam-

se grandes aliados para tornar os ambientes de saúde eficientes, sustentáveis e

saudáveis.

A organização Saúde Sem Dano representa no Brasil a Healthcare Without Harm

que é uma coalizão internacional de mais de 500 membros em 53 países que trabalham

para transformar o setor de saúde para que deixe de ser uma fonte de dano para as

pessoas e o meio ambiente. Colaboram médicos, enfermeiros, hospitais, sistemas

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 103

de saúde, associações profissionais, ONGs, governos e organizações internacionais

para promover o desenvolvimento e implementação de práticas, processos e produtos

seguros e ambientalmente saudáveis no setor saúde. (SAUDE SEM DANO, 2016).

A Agenda Global para Hospitais Verdes e Saudáveis (AGHVS) é uma iniciativa

junto do grupo internacional Saúde sem Dano que possui 10 objetivos com metas de

desempenho e otimização de consumo dos hospitais fazendo parte da “Rede Global

de Hospitais Verdes e Saudáveis”. O capítulo 9 trata dos edifícios para ‘Apoiar Projetos

e Construções de

,

Hospitais Verdes e Saudáveis.’ (HOSPITAIS SAUDAVEIS, 2016).

O programa Projeto Hospitais Saudáveis PHS é o parceiro estratégico no Brasil

da “Rede Global de Hospitais Verdes e Saudáveis” e adotou o “Desafio 2020 a Saúde

pelo Clima”. Em 2018, no Brasil existem mais de 150 estabelecimentos de saúde

participando entre ambulatórios, centros de especialização, hospitais públicos e

privados (GLOBAL GREEN AND HEALTHY HOSPITALS, 2016).

O “Desafio 2020 a Saúde pelo Clima” é uma iniciativa para mobilizar instituições

de saúde em todo o mundo para proteger a saúde pública das alterações climáticas

causadas pelo aquecimento global. Os cuidados com a saúde estão singularmente

posicionados para desempenhar um papel de liderança no combate às alterações

climáticas, que o relatório The Lancet chamou a maior ameaça à saúde do século XXI.

(2015- CLIMATE HEALTH COMISSION, 2016).

O conceito de sustentabilidade é definido como o plano de equilíbrio entre as três

esferas, um plano definido com três pontos: o equilíbrio entre os aspectos, ambiental,

social e econômica, também conhecido como ‘tripé da Sustentabilidade.’ Em inglês se

usa muito a expressão ‘The Triple Bottom line’ ou 3P: Planet, People, Profit”, ou ainda

3E: Ecologia, Economia e Equidade. (RODRIGUEZ, ROMAN, STURHAHN, TERRY,

2002), (SAVITZ, 2006).

Figura 1: Adaptada do conceito da Universidade de Michigan, 2002.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 104

É inevitável a comparação entre os três grandes objetivos dos Hospitais (triple

aim) e o tripé da Sustentabilidade:

• A experiência do paciente e o bem-estar estão na esfera social.

• A saúde da população se insere na esfera ambiental e do planeta

• Os custos per capita e a produtividade fazem parte da esfera econômica.

(MACALLISTER, 2016)

Os espaços influenciam no bem-estar e na saúde alterando o conforto ambiental

e a qualidade do ar interno. Por exemplo, os cheiros de cola de carpete ou tinta em

espaços recentemente reformados podem produzir dores de cabeça, náuseas e dor

nos olhos nas pessoas devido à emissão de compostos orgânicos voláteis. Assim

como, um hospital não consegue ser produtivo se for mal planejado. Segundo Pompeu,

os projetos dos espaços hospitalares tradicionalmente tinham o intuito de atender

adequadamente todos os serviços oferecidos. (POMPEU, 2005). Havia uma grande

preocupação com as soluções de adequações físicas do espaço como: flexibilidade,

modulação e funcionalidade.

Com a evolução das certificações notou-se a necessidade de um sistema de

qualidade com o foco nos seres humanos. A certificação WELL foi desenvolvida

em 2014 pelo International WELL Building Institute. A certificação WELL é um novo

padrão e ferramenta de qualidade voltada inteiramente para a saúde e o bem-estar

dos ocupantes do edifício. A aplicação de métricas e mensuração de resultados é uma

parte importante para impulsionar o movimento de saúde e bem-estar. O World Green

Building Council tem incentivado as empresas a se concentrar mais em como o design

pode melhorar estes 3 pilares (saúde, o bem-estar e a produtividade) do colaborador, e

sugere incorporar métricas que abordem resultados físicos, perceptíveis e financeiros.

Figura 2: WELL promove integração entre resultados físicos, perceptíveis e financeiros.

Em 2018, a certificação WELL se atualizou na versão 2 e ampliou para 112

elementos da sua ferramenta organizados em 10 conceitos avaliados na edificação:

qualidade do ar, qualidade da água, iluminação, alimentação, movimento, conforto

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 8 105

térmico, acústica, materiais, mente e comunidade. (INTERNATIONAL WELL BUILDING

INSTITUTE, 2018).

5 | CONCLUSÃO

Ao serem constatados os eventos recentes como furação no Japão e o tsunami

na Indonésia são comprovados os efeitos das mudanças climáticas e do aquecimento

global. Os ambientes de saúde precisam se alinhar aos objetivos do desenvolvimento

sustentável para mudar essa situação descontrolada. A construção civil e o mercado

da saúde são importantes segmentos da sociedade e devem ser motivadores de

mudanças de paradigma. As certificações ambientais são ferramentas úteis para

prover o controle das ações de sustentabilidade. Hoje as certificações podem ser

diferenciais para as edificações, mas logo serão essenciais! (ZIONI, 2018).

Ambientes de saúde exigem bom planejamento físico funcional somado aos

projetos arquitetônicos e de instalações adequados e devem ter como meta os efeitos

da sinergia, de cooperação e do equilíbrio entre a forma, a função e também a sensação

das pessoas que ocupam o ambiente construído de maneira sinestésica. O equilíbrio

entre os aspectos ambientais, sociais e econômicos são notáveis na eficiência e nas

certificações. Os ambientes de saúde devem se preparar para os cenários do amanhã

com qualidade, segurança, eficiência e sustentabilidade.

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Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 107

CAPÍTULO 9

doi

ARQUITETURA E SUSTENTABILIDADE:

OS “SELOS VERDES”

Mônica Santos Salgado

Programa de Pós-Graduação em Arquitetura

PROARQ

Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ

Rio de Janeiro – Rio de Janeiro

RESUMO: A discussão sobre sustentabilidade

na arquitetura ganhou maior força a partir do ano

2000 com a chegada ao Brasil das certificações

ambientais para as edificações. Desde então,

alguns métodos se tornaram populares a partir da

disseminação do termo “edifício verde”. Quase

20 anos depois – e após mais de uma década

desde a emissão do primeiro certificado para

uma edificação brasileira – parece pertinente

avaliar as lições aprendidas com os métodos e

quais informações ainda estão confusas. Esse

capítulo apresenta

,

o panorama das certificações

ambientais no Brasil considerando os dados

até dezembro de 2018, e analisa os próximos

passos rumo à arquitetura sustentável.

PALAVRAS-CHAVE: Arquitetura Sustentável;

Construção Sustentável; Selos verde; Gestão

de Projetos; Certificações Ambientais

ARCHITECTURE AND SUSTAINABILITY:

“GREEN CERTIFICATION”

ABSTRACT: The discussion around architecture

sustainable construction principles have gained

greater strength from the year 2000 with the

arrival in Brazil of the environmental certifications

for the buildings. Since then, some methods

have become popular from the dissemination of

the term “Green Building”. Almost 20 years later -

and after more than a decade since the issuance

of the first certificate for a Brazilian building - it

seems pertinent to evaluate the lessons learned

from the methods and what information is still

unclear. This chapter presents an overview of

environmental certifications in Brazil with data

up to December 2018, and analyzes the next

steps towards sustainable architecture.

KEYWORDS: Sustainable Architecture;

Sustainable construction; Green Buildings;

Design management; Environmental Rating

Systems

1 | INTRODUÇÃO

A discussão sobre sustentabilidade teve

início a partir da divulgação dos resultados

da reunião das Nações Unidas para o meio

ambiente, em 1987. O relatório produzido nessa

reunião, liderada pela então primeira ministra

da Noruega, Gro Brundtland, ficou conhecido

pelo seu sobrenome – Relatório Brundtland –

e recebeu o título: “Nosso Futuro Comum”. A

partir daquele momento, passou a ser difundido

o conceito de desenvolvimento sustentável, ou

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 108

seja, o desenvolvimento capaz de atender às necessidades das atuais gerações sem

comprometer as gerações futuras.

Em 1992, a Conferência foi realizada no Rio de Janeiro, e o principal documento

produzido pelos representantes de cerca de cento e setenta e dois países participantes

foi a Agenda 21, com princípios, estratégias e propostas para o desenvolvimento

sustentável.

A construção civil ganhou um documento específico sobre o tema em 1999

com a divulgação da Agenda 21 para a Construção Sustentável que apresenta

recomendações tomando por base as práticas de construção adotadas nos países

europeus. Resultado de um trabalho iniciado em 1995, o texto apresentou os principais

desafios a serem enfrentados pela arquitetura e engenharia, tais como:

- busca do consenso em torno do que se deseja em relação à construção

sustentável, de forma a permitir a comunicação e o entendimento sobre o

tema;

- garantia da participação de todos (interessados atuais e futuros) na busca

das melhores soluções;

- desenvolvimento dos métodos de avaliação que pudessem estabelecer

referências para o acompanhamento do progresso do setor;

- incentivo à educação ambiental junto aos profissionais envolvidos no processo

de construção.

Em 2002 foi produzido outro documento mais específico: Agenda 21 para a

Construção Sustentável nas Nações em Desenvolvimento. Este documento apresenta

diretrizes que consideram as práticas construtivas adotadas no Brasil, e destaca a

necessidade de uma radical transformação organizacional, que envolve questões

relacionadas às características das edificações a serem produzidas, à gestão do

processo de projeto e ao setor da construção civil como um todo.

No que se refere especificamente às edificações, este documento destaca

a necessidade de se definir padrões para a melhoria da qualidade ambiental. Foi

justamente com o objetivo de atender a esta demanda que surgiram os métodos para

auxílio ao projeto com qualidade ambiental – conhecidos como “selos verdes”.

Mas cabe lembrar que a sustentabilidade se baseia num tripé: ambiental,

econômico e social. Não será possível atender plenamente aos objetivos pretendidos

se um desses aspectos não for contemplado. Nas palavras de Cangussu et al (2012,

p.25, tradução nossa):

“Sem desenvolvimento econômico não pode haver progresso social. Sem a

proteção do meio ambiente, o desenvolvimento econômico não pode ocorrer. E

sem justiça social, não pode haver acordo coletivo para proteger o meio ambiente.”

De qualquer forma, embora os chamados “selos verdes” apresentem metas

majoritariamente relacionadas ao aspecto ambiental da sustentabilidade, certamente

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 109

podem auxiliar os profissionais na etapa de desenvolvimento de projetos, e por isso é

fundamental sua compreensão.

2 | GESTÃO SUSTENTÁVEL DA CONSTRUÇÃO

Pode-se entender o desenvolvimento de projetos em arquitetura que consideram

os requisitos ambientais dividido em duas etapas distintas: (1) definição de parâmetros,

e (2) concepção projetual. A primeira fase também possui duas etapas (CASTELLS,

2010):

a) estudo do potencial ambiental do terreno

b) pré-programação com a hierarquização das metas ambientais.

Esse mesmo autor acrescenta que os produtos da fase de “Definição de

parâmetros” podem ser, entre outros documentos, a apresentação de um caderno de

exigências e um caderno de recomendações a serem considerados pelos arquitetos

na concepção do projeto.

Considerando que o processo de projeto em arquitetura passa por diferentes

fases, desde a avaliação da viabilidade arquitetônica até a fase de entrega da

edificação, entende-se que o potencial para atender às metas ambientais será mais

ou menos forte dependendo da etapa, sendo recomendável que a definição das metas

seja estabelecida antes mesmo do início da concepção arquitetônica, quando os

profissionais definem o perfil de qualidade ambiental desejado.

Há que se fazer a distinção entre a gestão sustentável da construção, e a qualidade

ambiental da edificação. A primeira depende da adequação das práticas em canteiro

de obras – relacionadas com a gestão ambiental do processo de construção. Nesse

sentido, existe normalização específica para orientar as empresas na organização

do seu sistema de gestão ambiental, a NBR ISO 14001 que está na sua versão 2015

(periodicamente as normas passam por uma revisão e atualização). A empresa que

implantou um sistema de gestão ambiental identifica e avalia os impactos ambiental dos

seus processos, considerando aspectos de magnitude, probabilidade de ocorrência,

legislação ambiental aplicável, entre outros requisitos definidos na norma.

Com base nesta análise são estabelecidas as ações de gerenciamento e controle

que tem a finalidade de prevenir e evitar danos ao meio ambiente, e a empresa passa

a gerenciar melhor os seus resíduos, controlar suas emissões atmosféricas, controlar

seus efluentes, relacionar, em seu plano de emergência, definir ações preventivas que

minimizam efeitos danosos ao meio ambiente em caso de acidentes, entre outros.

A qualidade ambiental da edificação, por outro lado, está relacionada à

incorporação de requisitos que possam conferir ao edifício a capacidade de operar

de forma sustentável, com medidas visando à: conservação da água; economia de

energia; adoção de métodos passivos de ventilação e iluminação dos ambientes;

utilização de materiais de construção de baixo impacto ambiental; entre outras medidas

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 110

que visam a melhoria do desempenho ambiental do produto-edificação.

Daí a importância de se compreender a diferença entre uma construtora

ambientalmente responsável e uma construtora que executa edificações com

qualidade ambiental. A construtora que executa uma edificação com “selo verde”, não

necessariamente tem seu sistema de gestão ambiental certificado. O “selo verde” se

refere à edificação (trata-se de uma certificação de produto) enquanto a certificação do

sistema de gestão ambiental refere-se ao processo de produção da empresa (ou seja,

a certificação do processo).

3 | CERTIFICAÇÕES AMBIENTAIS PARA AS EDIFICAÇÕES

No Brasil, dois métodos de auxílio

,

ao projeto com qualidade ambiental se

destacam: o Selo Azul da Caixa Econômica Federal (CAIXA) e o Selo PROCEL-

Edifica. O Selo Casa Azul foi lançado em 2010, e desenvolvido para disseminar boas

práticas de construção sustentável e consiste numa “classificação socioambiental de

empreendimentos habitacionais”. O método define seis dimensões e 53 requisitos

a serem cumpridos para se obter a qualificação. As dimensões consideradas neste

método são: Qualidade Urbana; Design e Conforto; Eficiência energética; Conservação

de Recursos Materiais; Gerência de água; e Práticas sociais.

Embora seja conhecido como “Selo Azul”, na verdade não concede um “certificado”

uma vez que o banco não é um agente certificador, mas oferece a “qualificação” dentro

do método, considerando três níveis de classificação: BRONZE (atendimento mínimo),

PRATA e OURO (o mais abrangente) Um dos aspectos que merece destaque no “Selo

AZUL” são os requisitos relacionados às “Práticas Sociais”. Este aspecto diferencia

o método dos demais, pois acena para o atendimento às metas da sustentabilidade

social ao listar como obrigatórios o atendimento a requisitos como (SELO CASA AZUL,

2018):

- Educação para a Gestão de Resíduos de Construção e Demolição – RCD:

tem como objetivo realizar atividades educativas e de mobilização para a

execução das diretrizes do Plano de Gestão de RCD com os empregados

envolvidos na construção do empreendimento.

- Educação Ambiental dos Empregados: A meta é prestar informações e

orientar os trabalhadores sobre a utilização dos itens de sustentabilidade do

empreendimento, notadamente sobre os aspectos ambientais.

- Orientação aos Moradores: Visa prestar informações e orientar os moradores

quanto ao uso e manutenção adequada do imóvel considerando os aspectos

de sustentabilidade previstos no projeto.

Outra certificação brasileira é o “PROCEL Edifica” – Programa Nacional de

Eficiência Energética em edificações. Este programa tem uma característica bem

diferente, uma vez que consiste num método para promover o projeto e a construção

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 111

de edifícios com baixo consumo de energia. Nos edifícios comerciais, de serviços e

públicos são avaliados três sistemas: fachadas, iluminação e ar condicionado (PROCEL

Edifica, 2017). O selo pode ser concedido parcialmente, desde que sempre contemple

avaliação de entorno. Para edificações residenciais deve-se considerar a envoltória e

o sistema de aquecimento de água, além dos sistemas presentes nas áreas comuns

dos edifícios multifamiliares, como iluminação, elevadores, bombas centrífugas entre

outras.

Com relação às iniciativas estrangeiras, embora o número de métodos propostos

seja elevado, até 2019 apenas quatro sistemas de avaliação chegaram ao Brasil:

- a metodologia LEED™ para avaliação do desempenho ambiental de

edificações (The Leadership in Energy and Environmental Design Green

Building RatingSystem) desenvolvida pelos norte-americanos;

- o método HQE® (Haute Qualité Environmentale) – desenvolvido pelo

governo francês, que especifica metas ambientais a serem perseguidas no

desenvolvimento do projeto da edificação. No Brasil esse método deu origem

à certificação AQUA;

- BREEAM-UK - Metodologia de Avaliação Ambiental do Establishment

Research Building;

- DGNB (Deutsche Gesellschaft für Nachhaltiges Bauen - Sociedade Alemã

para a Construção Sustentável).

As certificações LEED e HQE foram as primeiras adotadas pelos empreendedores

brasileiros. Dada a natureza de cada uma, a escolha dependerá do tipo de edificação

e do objetivo do empreendedor.

Observa-se, no entanto, certo desconhecimento em relação ao real significado

de se obter um “selo verde”. Muitos confundem a “classificação” da avaliação com o

“escopo” da avaliação, e a percepção acaba equivocada. Por exemplo, as empresas

divulgam o recebimento de um selo “PLATINA” para determinada edificação, mas

não divulgam o escopo da avaliação que concedeu a classificação “PLATINA”. Como

para cada “Selo verde” existem escopos mais ou menos abrangentes, a classificação

se refere ao escopo escolhido não sendo possível comparar edificações com selo

PLATINA que tenham escopos distintos.

Portanto, para compreender a abrangência da certificação “verde” auferida a

determinado empreendimento, é necessário, conhecer o escopo da certificação. Os

métodos de auxílio ao projeto com qualidade ambiental apresentam diferentes escopos

conforme será discutido.

3.1 CERTIFICAÇÃO LEED – ênfase na economia de energia

A metodologia LEED™ foi a primeira a certificar uma edificação brasileira, com

a emissão do primeiro certificado em 2007, para o projeto de uma agência bancária,

localizada na Granja Viana em São Paulo. O método já apresentou quatro versões,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 112

sendo no Brasil a versão 3 responsável pelo maior número de certificações até 2018.

A certificação LEED, em sua versão 3, apresentava os seguintes escopos (GREEN

BUILDING COUNCIL, 2018):

- LEED-NC: certificado para novas construções e ou grandes reformas. Nesta

categoria, a certificação é realizada considerando o terreno e a edificação

como um todo;

- LEED-OM: certificado para edificações existentes, visando auxiliar o

proprietário na medição das operações durante o funcionamento (registro de

atividades) orientando a realização das melhorias;

- LEED-CI: certificado para interiores de edificações comerciais;

- LEED-CS: certifica toda a envoltória do empreendimento, suas áreas comuns

e, internamente, o ar condicionado e elevadores;

- LEED for schools: certificado para escolas;

- LEED for retail: certificado para centros comerciais e lojas departamentais;

- LEED for healthcare: certificado para hospitais;

- LEED for homes: certificado para residências. Nesta categoria estão inclusos

residências unifamiliares e prédios multifamiliares de até três pavimentos;

- LEED-ND: certificado para comunidades e bairros.

A classificação dada ao empreendimento depende do resultado da avaliação

que considera um grupo de requisitos relacionado ao escopo da certificação, e

atribui determinada pontuação a esses requisitos. Conforme a pontuação obtida,

o empreendimento pode ser classificado como PLATINA, OURO, PRATA ou

CERTIFICADO (respectivamente desde a classificação mais alta – com maior número

de pontos – até a mínima necessária para ser certificada – conforme determinações

do organismo certificador)

Como os escopos de certificação são muito diferentes, não é possível, por

exemplo, comparar o desempenho ambiental de uma edificação certificada no nível

Platina do LEED NC com uma edificação certificada no nível Platina do LEED CS,

embora certificadas pelo mesmo organismo – o U.S. Green Building Council (USGBC).

Isso porque o escopo da certificação ND (Novas Construções) é mais abrangente

do que o escopo da certificação CS (Core & Schell). Dessa forma, embora ambos

tenham recebido a mesma classificação PLATINA certamente um empreendimento

terá atendido a um número superior de requisitos quando comparado ao outro, pois os

escopos das certificações são distintos.

A versão 4 alterou os escopos, passando a ter a seguinte configuração:

- LEED BD + C: NC: Projeto e construção de edifícios (novas construções);

- LEED BD + C: WDC: Projeto e construção de edifícios (armazéns e centros

de distribuição);

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 113

- LEED ID + C: CI: Design de Interiores e Construção (Interior Comercial);

- LEED ID + C: Design de Interiores de Retalho e Construção (Retalho);

- LEED O + M: Operações e Manutenção do EB

As análises ambientais na versão 3 consideraram sete dimensões: Sítios

Sustentáveis, Eficiência Hídrica, Energia e Atmosfera, Materiais e Recursos, Qualidade

Ambiental Interna, Inovação em Design ou Inovação em Operações e Créditos

Prioritários Regionais. A essas dimensões, a versão 4 acrescentou: pensamento

integrativo,

,

saúde e experiência humana, impactos regionais e aspectos globais /

regionais / locais.

3.2 CERTIFICAÇÃO AQUA HQE – Adaptação Da Certificação Francesa

Dois anos após a concessão do primeiro certificado LEED no Brasil, ocorreu a

primeira certificação AQUA (em 2008): uma loja localizada em Niterói (Estado do Rio

de Janeiro). Na proposta do método AQUA-HQE, o perfil QAE (Qualidade Ambiental

do Edifício) é definido a partir das características do local e da hierarquização das

categorias ambientais propostas pelo método através do SGE (Sistema de Gestão

do Empreendimento), identificando o nível de desempenho pretendido para cada

categoria e subcategorias associadas, aproveitando e considerando o potencial da

região.

Para a obtenção da certificação AQUA-HQE, todas as categorias devem ser

consideradas. O perfil mínimo exigido para a emissão da certificação da edificação

deve incluir no mínimo três requisitos avaliados com nota máxima (excelente) e no

máximo sete requisitos no nível menos exigente (bom).

O AQUA HQE apresenta dois escopos – edificações comerciais e não-comerciais

– ambos estabelecem requisitos relacionados às 14 dimensões assim estabelecidas:

Relação do Edifício com o seu entorno; Adaptabilidade e escolha integrada de

produtos, sistemas e processos construtivos; Canteiro de obras de baixo impacto

ambiental; Gerenciamento de energia; Gerência de água; Gestão de Resíduos de

uso e operação do edifício; Manutenção - permanência do desempenho ambiental;

Conforto Higrotérmico; Conforto acústico; Conforto visual; Conforto Olfativo; Qualidade

dos ambientes; Qualidade do ar sanitária; e Qualidade da água.

3.3 CERTIFICAÇÃO BREEAM – ainda pouco adotada no Brasil

O Método BREEAM (Building Research Establishment Environmental

Assessment) define o padrão para as melhores práticas do projeto para produção da

edificação sustentável a partir da atribuição de créditos, em dez categorias, conforme

o desempenho alcançado pela proposta. A maioria dos requisitos é negociável, o que

significa que é permitido à equipe de projeto escolher a quais requisitos vão atender,

de forma a obter a pontuação necessária à certificação.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 114

O método BREEAM iniciou suas atividades no Brasil em 2011. O sistema propõe

a avaliação considerando diferentes categorias, desde a conservação de energia até a

ecologia. Cada uma dessas categorias aborda fatores como: design de baixo impacto

e redução de emissões de carbono; durabilidade e resiliência do design; adaptação

às mudanças climáticas; e valor ecológico e proteção da biodiversidade.

Neste sentido, as categorias BREEAM incluem: economia de energia, saúde e

bem-estar, inovação, uso da terra, materiais, gestão, poluição, transporte, resíduos e

água. Essas categorias são avaliadas de acordo com o escopo de certificação:

- BREEAM para bairros (masterplanning)

- BREEAM para infraestrutura;

- BREEAM para novas construções (edificações residenciais ou comerciais)

- BREEAM Em-uso (edificações comerciais)

- BREEAM para reformas (edificações residenciais ou comerciais)

A classificação BREEAM varia de EXCEPCIONAL a NÃO CLASSIFICADO, de

acordo com a pontuação: excelente (≥ 85); excelente (≥ 70); muito bom (≥ 55); bom (≥

45); passe (≥ 30) ou não classificado (<30). Dependendo do escopo, há uma classe

adicional (“ACEITÁVEL”) entre “aprovado”(“pass”) e “não-classificado” (“Unclassified”).

Esta classificação é oferecida no BREEAM In-Use (Em-uso) e tem uma pontuação

diferente.

3.4 CERTIFICAÇÃO DGNB – iniciando suas atividades no Brasil

O método DGNB Deutsche Gesellschaft für Nachhaltiges Bauen eV (German:

German Sustainable Building Council) foi lançado no Brasil em 2012 (DGNB, 2018)

através de uma parceria entre o DGNB e as empresas alemãs do setor. O processo

de certificação considera a classificação em quatro níveis: BRONZE, PRATA, OURO

e PLATINA. O método considera seis dimensões para avaliação: qualidade ecológica,

qualidade econômica, qualidade sociocultural e funcional, qualidade técnica e

qualidade do processo.

Alguns autores destacam como vantagem do Sistema de Certificação DGNB a

possibilidade de ser adaptado às particularidades climáticas, constitucionais, legais e

culturais dos diferentes países.

4 | SOBRE AS CERTIFICAÇÕES AMBIENTAIS NO BRASIL

Apesar da diversa gama de opções oferecidas, ainda são poucas as edificações

certificadas. O SELO AZUL, elaborado por especialistas por solicitação da Caixa

Econômica Federal, embora tenha sido lançado desde 2008, apresentava, em

dezembro de 2018, apenas 14 edifícios reconhecidos pelo método. Isso ocorreu,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 115

provavelmente, porque o sistema de avaliação existe apenas no Brasil, e não possui

reconhecimento internacional. Da mesma forma, embora a certificação do PROCEL

EDIFICA, exista desde 2003, até 2018, apenas 16 edifícios foram certificados em fase

de projeto, e 29 edifícios construídos em todo o país. Novamente atribui-se a baixa

procura pelo fato de não ser uma certificação internacional.

Em oposição aos baixos números alcançados pelas certificações brasileiras,

a certificação LEED, onze anos após a primeira certificação emitida no Brasil, já

recebeu cerca de 1340 registros (que corresponde ao número de empreendimentos

interessados na certificação). Ressalte-se que, embora o número de registros seja

elevado, nem todos os empreendimentos registrados obtiveram a certificação uma vez

que o atendimento aos requisitos exige a adoção de medidas desde a fase de projeto

até a execução da obra. Como resultado tem-se desse total o percentual de 39%

(525 prédios) com o certificado no Brasil até dezembro de 2018 (GREEN BUILDING

COUNCIL, 2018).

O escopo LEED CS (para Core & Schell – envoltória e áreas comuns) é o mais

amplamente adotado no Brasil, embora não seja o mais abrangente. Uma possível

explicação para esta escolha pode estar relacionada com a similaridade com os

requisitos do selo PROCEL promovido pelo Governo Federal e voltado à redução no

consumo de energia. A análise também indica que, no Brasil, os edifícios certificados

LEED concentram-se em uma região (Sudeste) - principalmente instalações comerciais

ou corporativas – o que pode sinalizar a intenção dos empresários de agregar “valor

verde” às empresas por meio do selo verde de sua sede. (SALGADO, 2017)

A certificação AQUA HQE ocorre por etapas, conforme o desenvolvimento dos

projetos (desde o planejamento até a execução da obra). Por esse motivo, observa-se

que o número de certificados emitidos é bem superior ao número de empreendimentos

certificados uma vez que um mesmo empreendimento pode receber diversos

certificados. Até dezembro de 2018 a certificação do sistema de classificação AQUA-

HQE alcançou com 286 empreendimentos e 615 certificados emitidos, conforme dados

analisados a partir das informações disponibilizadas no site da Fundação Vanzolini

(2018).

Sobre o selo BREEAM, em 2018, uma edificação brasileira (Centro de

Sustentabilidade do SEBRAE) recebeu o Prêmio BREEAM Américas 2018 em duas

categorias: “Melhor edifício sustentável” na categoria “Novas Construções em Uso

nas Américas” e “Melhor Construção Sustentável do Mundo” eleito pelo voto digital

popular (SEBRAE, 2018). Apesar do prêmio, o último relatório público disponível

indicava apenas 3 empreendimentos com certificado (BREEAM, 2014). O método

alemão (DGNB, 2018) até dezembro de 2018 não tinha emitido nenhum certificado

para edificação brasileira.

Portanto, observa-se que os sistemas de classificação estrangeiros –

particularmente o LEED e o AQUA HQE – certificaram um número de edifícios superior

aos demais métodos apresentados. Isso ocorre provavelmente pelo interesse dos

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 116

empreendedores em associar sua marca à visão internacional da sustentabilidade, e

também pelo fato de terem sido os primeiros

,

a desembarcar no Brasil.

Cabe lembrar que não é preciso necessariamente adotar um dos “selos verdes”

para considerar os aspectos de sustentabilidade ambiental no projeto e execução das

edificações. Os profissionais interessados nas metas da sustentabilidade, mas sem

interesse na certificação, podem consultar a norma internacional ISO 21929-1:2011

(ainda sem tradução para o português) que apresenta os Indicadores de sustentabilidade

na construção de edifícios. De qualquer forma, considera-se pertinente conhecer o

número de edificações com “selo verde” no Brasil como um indicativo sobre a forma

como o tema vem sendo considerado pelo setor.

5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS

De maneira geral, entende-se que a principal vantagem das ferramentas e

dos métodos de avaliação reside na orientação aos empreendedores, projetistas e

construtores quanto aos requisitos de sustentabilidade. Mas a principal questão a ser

discutida é quanto à contribuição desses sistemas para a produção de edificações

e cidades sustentáveis, e o papel da arquitetura nesse processo. Ou seja, o mais

importante não é certificar o projeto “verde”, mas projetar considerando o tripé da

sustentabilidade (ambiental, social e econômico).

Apesar dos benefícios evidentes do investimento nas construções sustentáveis,

ainda se observa certa resistência por parte dos construtores e incorporadores, que

muitas vezes não consideram vantajoso o investimento nas soluções que visam o

atendimento aos requisitos da sustentabilidade por entenderem que a possível elevação

nos custos da construção não trariam benefícios econômicos para a empresa, pois

seriam percebidos apenas pelos usuários finais, com a economia de recursos na fase

de uso-operação e manutenção.

Mas a produção de empreendimentos imobiliários que considerem a

sustentabilidade ambiental deve ser analisada não apenas pelo aspecto evidente

dos benefícios que as construções sustentáveis trazem para o meio ambiente, mas

também pela possibilidade de realizar negócios lucrativos. Nas palavras de Friend

(2010, tradução nossa) “não é preciso escolher entre fazer dinheiro e fazer sentido”.

A proposta em discussão trata da visão empreendedora da construção sustentável

como caminho para a obtenção de lucro de forma consciente, protegendo o meio

ambiente e a sociedade.

Em trabalho desenvolvido anteriormente (SALGADO, 2013), identificou-se que

algumas empresas já perceberam que o investimento na sustentabilidade ambiental

do empreendimento em construção civil pode garantir a sustentabilidade econômica

da empresa, através da integração projeto-produção-uso/operação/manutenção. Entre

os benefícios citam-se:

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 9 117

- redução dos custos da administração do condomínio, uma vez que medidas

economizadoras foram definidas na fase de concepção do empreendimento;

- geração de novos empregos, a partir do investimento em pesquisa e

desenvolvimento de tecnologias inovadoras para a construção – de forma a

atender às demandas dos usuários e do meio ambiente;

- benefícios econômicos para usuários e gestores, gerando economia de

recursos para a sociedade e proteção ao meio ambiente;

- marketing “verde” da empresa (formação de imagem) em consequência da

satisfação dos usuários tanto em decorrência da sustentabilidade ambiental,

como pela redução dos problemas na fase pós ocupação.

De qualquer forma, independentemente da decisão por adotar ou não uma

certificação ambiental, ao profissional comprometido com a realização de um projeto

com qualidade ambiental será necessário conjugar diferentes aspectos, desde a

escolha consciente de materiais e componentes até a compatibilização de soluções

visando ao conforto dos usuários e eficiência energética – para citar apenas dois

aspectos.

Diante deste cenário, fica evidente que a produção de uma arquitetura sustentável

não depende da decisão de adotar uma certificação ambiental. Torna-se necessário

repensar a gestão do processo de projeto, que deverá ser feito de forma colaborativa,

com a participação dos profissionais das diferentes especialidades envolvidas,

discutindo a qualidade da solução proposta a partir dos requisitos e diretrizes de

sustentabilidade.

AGRADECIMENTOS

A autora agradece ao CNPq – Conselho nacional de Pesquisa Científica – pela

Bolsa de Produtividade em Pesquisa

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Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 119

CAPÍTULO 10

doi

UMA ANÁLISE DIACRÔNICA DO TECIDO URBANO: O

ESTUDO DE CASO DE SÃO JOSÉ DO RIO PARDO-SP

,

Rafael Augusto Silva Ferreira

PUC Campinas, doutorando pelo Programa de

Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo.

Campinas – SP

Renata Baesso Pereira

PUC Campinas, professora titular do Programa de

Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo.

Campinas – SP

RESUMO: O núcleo urbano de São José do Rio

Pardo, localizado na porção nordeste do Estado

de São Paulo, foi fundado em meados do

século XIX, através da doação de uma parcela

de terras de uma fazenda para um orago de

devoção, formando o patrimônio religioso. Sua

fundação integra uma rede urbana formada por

outros municípios relacionados à uma rede de

caminhos na fronteira entre as Províncias e

depois Estados de São Paulo e Minas Gerais.

O presente artigo tem por objetivo demostrar

a formação do tecido urbano do município

de São José do Rio Pardo – SP, no recorte

temporal 1865 – 1941, a partir da identificação

de fontes primárias (textuais, cartográficas

e iconográficas). O artigo reconstitui a

morfogênese do tecido urbano, em sua relação

com o território, identificando as rotas e caminhos

que estruturam a ocupação da região, além dos

aspectos fundiários que antecederam a criação

do patrimônio religioso. Como método para a

compreender o crescimento do tecido urbano,

utilizam-se fontes textuais e cartográficas,

espacializadas por meio de métodos de

georreferenciamento. O artigo contribui com

uma discussão sobre métodos e ferramentas

para análise do tecido urbano existente, através

do cruzamento de fontes de caráter distinto, em

bases cartográficas, ampliando a compreensão

sobre os processos da formação territorial do

nordeste do Estado de São Paulo.

PALAVRAS-CHAVE: morfogênese; tecido

urbano; georreferenciamento.

ABSTRACT: The urban nucleus of São José do

Rio Pardo, located in the northeastern portion

of the State of São Paulo, was founded in the

mid-nineteenth century, through the donation

of a portion of land from a farm to an oracle

of devotion, forming the religious heritage. Its

foundation integrates an urban network formed

by other municipalities related to a network of

roads on the border between the Provinces

and States of São Paulo and Minas Gerais.

The present article intends to demonstrate the

formation of the urban tissue of São José do Rio

Pardo-SP, in the temporary clipping 1865 - 1941,

defined from the identification of primary sources

(textual, cartographic and iconographic). The

article reconstructs the morphogenesis of the

urban tissue, in its relation with the territory,

identifying the routes that structured the

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 120

occupation of the region, as well as the land aspects that preceded the creation of

the religious patrimony. As a method to understand the growth of the urban tissue, it

uses textual and cartographic sources, spatialized by georeferencing methods. The

article contributes with a discussion about methods and tools for analyzing the existing

urban tissue, through the crossing of distinct character sources, on cartographic bases,

broadening the understanding of the processes of territorial formation in the northeast

of the State of São Paulo.

KEYWORDS: morphogenesis; urban tissue; GIS.

1 | INTRODUÇÃO

O núcleo urbano de São José do Rio Pardo-SP formou-se a partir da fundação da

freguesia paulista de Caconde-SP, em 1775, na região de fronteira entre as Capitanias

e depois Províncias de São Paulo e Minas Gerais. A criação da freguesia em uma

região de fronteira, evidencia a estratégia do Governo de São Paulo para garantir o

controle de importante região de mineração, no século XVIII (CAMPANHOLE, 1979).

O território onde se formaria o núcleo urbano de São José do Rio Pardo esteve, desse

modo, estruturado por uma rede de caminhos em uma região de fronteira, onde as

diversas freguesias e vilas criadas, desempenharam a função de definição dos limites

administrativos. A data de fundação de São José do Rio Pardo, que também marca o

início do recorte temporal do presente trabalho, é a data de doação de seu patrimônio

religioso, em 1865, pertencendo ao termo da vila de Caconde, elevada à essa categoria

em 1864. Já o fim do recorte temporal da pesquisa é o ano de 1941. A outra justificativa

do recorte temporal, é a disponibilidade de fontes primárias.

O trabalho pretende demonstrar a utilização de ferramentas e métodos de análise

do crescimento e desenvolvimento do tecido urbano, a partir da identificação de

fontes documentais e suas possibilidades de espacialização em bases cartográficas,

utilizando inclusive de métodos de georreferenciamento.

Utilizamos o conceito de tecido urbano definido por Philippe Panerai, como uma

metáfora da tecelagem, uma imbricação entre vias, parcelamentos e edificações. O

conceito designa um caráter de solidariedade entre partes individuais formativas de

seu conjunto.

Aplicado à cidade, o termo ‘tecido’ evoca a continuidade e a renovação, a

permanência e a variação. (...) Essa definição põe em evidência os elementos que

permitem que as diferentes partes da cidade evoluam, ao mesmo tempo em que

são mantidas a coesão de conjunto e a clareza de sua estrutura (PANERAI, 2014,

pp. 77-78).

Os documentos primários de natureza textual, cartográfica e iconográfica,

permitem uma apreciação dos aspectos físico-ambientais e a identificação de períodos

morfológicos, procurando demostrar as permanências no traçado urbano atual. A

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 121

abordagem impõe a necessidade, de um lado, da consideração do papel do suporte

físico natural na modelação do traçado urbano e, de outro, da abordagem diacrônica

da consolidação do tecido. Para Coelho (2014), a leitura da forma urbana, cristalizada

em um momento específico da sua existência, permite apenas uma compreensão

parcial, pois deixa de fora o tempo que se expressa na permanente evolução física do

objeto, “tanto o tempo longo como no imediato” (COELHO, 2014, p. 33).

A leitura morfológica do espaço, possibilita a visualização do processo de ocupação

territorial através das estruturas básicas (rotas, assentamentos, protonúcleos e núcleos

urbanos), e produz um diagnóstico acerca das permanências no traçado urbano atual

que permitem entrever o processo de ocupação territorial. A partir do referencial teórico

adotado, nos propomos a utilizar métodos e ferramentas da morfologia urbana para

definir a morfogênese do núcleo urbano, o modo de crescimento e as permanências

desse processo identificadas na atualidade, construindo cartografias regressivas.

2 | MORFOGÊNESE DO TECIDO URBANO: ROTAS, ASSENTAMENTO E A

FORMAÇÃO DO PATRIMÔNIO RELIGIOSO.

Guerreiro (2002), em sua dissertação, definiu o processo típico de assentamento

dos aglomerados urbanos portugueses, e sua relação com o sítio em que estão inseridos.

Entre seus referenciais, estão os trabalhos de Gianfranco Caniggia, “que propõe uma

leitura global do ambiente construído, nas suas diversas fases históricas e territoriais”

(GUERREIRO, 2002, p. 57). Para a autora, há nesse caso, uma subordinação do

homem à natureza.

O território, segundo Guerreiro (2002), é estruturado por linhas de festo (cumeeira)

e talvegue, configurando a orografia. Ao agrupamento das linhas, tem-se formações

como montanhas, cordilheiras, espigões, fundos de vale, etc., as quais condicionam

as formas de circulação no território, mediante a abertura de caminhos que, por

sua vez, são a primeira e mais importante estrutura no território, pois dão suporte

às demais ocupações. Localizados em zonas de festo, talvegue ou meia encosta,

o entroncamento dos caminhos define “pontos notáveis” do território (GUERREIRO,

2002, p. 74): centros de distribuição e dispersão. Costa & Netto (2015), argumentam

que as rotas constituem a primeira estrutura urbana, que recebe as séries urbanas e

que, quando cruzadas, originam nós e polaridades.

Recorremos à cartografia história para definir quais seriam as rotas que

estruturaram

,

a ocupação do território em que foi fundado o núcleo urbano de São José

do Rio Pardo. Utilizou-se do mapa da Comarca do Rio das Mortes, de José Joaquim

da Rocha, de 1777 (Fig. 1) como o ponto de partida na identificação dos caminhos e

rotas que deram origem ao território de São José do Rio Pardo. O mapa foi o primeiro

produzido sobre a Capitania de Minas Gerais e seus limites.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 122

Figura 1: Mapa da Comarca do Rio das Mortes, de José Joaquim da Rocha, onde destacamos

em vermelho as rotas que deram suporte à ocupação da região de fronteira entre São Paulo e

Minas Gerais. No quadrado preto, localizamos o recorte do mapa apresentado na Fig. 2.

FONTE: Biblioteca Nacional. Disponível em: http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_cartografia/cart530294/

cart530294.html, acesso em 29/05/2018.

A ocupação da região do Rio Pardo, na divisa das capitanias de São Paulo e

Minas Gerais, deu-se a partir da freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Bom

Sucesso do Rio Pardo (atual município de Caconde-SP), em uma rede de caminhos

que ramificou-se do Caminho dos Goiases, ainda na segunda metade do século XVIII,

interligando-se com o território mineiro, através da freguesia mineira de Nossa Senhora

da Assumpção de Cabo Verde (Fig. 2). A toponímia da localidade guarda a origem dos

achados auríferos, localizados na barra do Rio Bom Sucesso com o Rio Pardo. Nessa

região, foi instalado um registro e uma guarda militar, que faziam, respectivamente, o

controle fiscal sobre o ouro e a defesa do território paulista. A localidade foi alvo de

disputas territoriais entre as duas capitanias, e a criação de freguesias e vilas figurou

como uma estratégia de ambos os governos para delinear a linha de fronteira. A

temática foi detalhada na obra de Adriano Campanhole (1979).

O Caminho dos Goiases foi uma estrada aberta na primeira década do século

XVIII, como acesso às minas de ouro de Goiás. Dessa rota tronco, originou-se uma

rede urbana, cujas derivações conectavam a capitania de Minas Gerais (REIS FILHO,

2014).

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 123

Figura 2: Recorte sobre o mapa de José Joaquim da Rocha (1777). Em amarelo, destacamos

o Caminho dos Goiases; em verde, as ramificações em direção à Capitania de Minas Gerais.

O número 1 indica a freguesia paulista de N. Sr.ª da Conceição do Bom Sucesso do Rio Pardo

(atual Caconde), e o 2 a freguesia mineira de N. Sr.ª da Assumpção de Cabo Verde. Em

vermelho, destacamos a região onde se formaria posteriormente o núcleo urbano de São José

do Rio Pardo. Elaboração dos autores sobre original.

FONTE: Biblioteca Nacional. Disponível em: http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_cartografia/cart530294/

cart530294.html, acesso em 29/05/2018

No mapa da Figura 2, identificamos dois caminhos partindo da altura dos rios

Bom Sucesso e Conceição em direção à Estrada dos Goiases. A presente pesquisa

apresenta a tese de que estas são as rotas tronco que deram origem ao núcleo urbano

de São José do Rio Pardo-SP e de que tais estruturas ainda podem ser reconhecidas

no território em questão.

A permanência do traçado dos caminhos identificados no mapa de José

Joaquim da Rocha, de 1777, pode ser observada no mapa da Comissão Geográfica e

Geológica do Estado de São Paulo, de 1949 (Fig. 3). As rotas destacadas, conectando

a freguesia de Caconde, fundada em 1775, com a Estrada dos Goiases, formaram-se

a partir da escolha dos locais de topografia favorável, e dos pontos onde a travessia

dos rios existentes na região era possível. Os nós e polaridades, ao longo das rotas,

deram origem a municípios a partir da doação de terras para a formação do patrimônio

religioso. O mapa apresenta, ainda, outros núcleos urbanos formados ao longo das

mesmas rotas mas que não constituem objeto do presente artigo.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 124

Figura 3: Identificação dos caminhos do Mapa da Comarca do Rio das Mortes (1777), em um

mapa da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo, de 1949. Em azul, destacamos a

hidrografia principal da região, presente no mapa anterior. Em vermelho, as rotas tronco que

originaram os municípios: 1) Cabo Verde; 2) Caconde; 3)São José do Rio Pardo; 4) Espírito

Santo do Rio do Peixe (atual Divinolândia-SP) e 5) São Sebastião da Grama. O traçado atesta

uma permanência de antigos caminhos em direção à Minas Gerais, que se ramificaram do

Caminho dos Goiases e hoje transformaram-se em rodovias interligando os atuais municípios.

FONTE: Arquivo Público do Estado de São Paulo.

Na formação dos núcleos urbanos coloniais brasileiros, a implantação de uma

pequena ermida e seu posterior reconhecimento pela Igreja, demandava a observância

de condições expressas nas Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia (1719).

A construção deveria se localizar em local elevado, livre de áreas alagadiças e

pantanosas, não podendo ser ermo ou despovoado. A necessidade de se destacar o

templo religioso na paisagem, era uma exigência para que a capela fosse consagrada,

podendo então abrigar ofícios religiosos. A construção da capela necessitava do

patrimônio doado e reconhecido pela Fábrica paroquial, sua administradora. Nesse

sentido, a capela continha o patrimônio e não o oposto. As recomendações ainda

ditavam a necessidade de deixar um adro livre, em torno da capela, para a circulação

de procissões, o que acabava por ser uma condicionante do tecido urbano, na medida

em que adro e capela estariam estruturados por uma via principal que, na escala do

território, modelaria a expansão futura do tecido para além dos limites do patrimônio

(MARX, 1991).

Outra condicionante era a presença de rios e córregos nas proximidades do

patrimônio, por motivo de comodidade e funcionalidade futuras mas, também, pelo

modo pelo qual a porção de terra era demarcada para doação: durante a Colônia

usualmente em légua em quadra e, com o Império, em alqueires, sempre usando

como limites os cursos d’água em ‘forquilha’. Justifica-se assim, a delimitação de

patrimônios religiosos em fundos de vale.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 125

O mapa (Figura 3) permite visualizar a relação territorial entre o local onde seria

formado o núcleo urbano de São José do Rio Pardo-SP e o núcleo urbano de Caconde-

SP. Este último, possuía um termo de grandes dimensões, de onde originaram-se

outros núcleos urbanos. O processo de formação de um núcleo urbano, como bem

indicou Murillo Marx, manifesta o rompimento com o sistema de concentração de

terras por sesmarias, permitindo o acesso à terra por aqueles que não dispunham de

tais privilégios; ao mesmo tempo que expressa a complementaridade, por meio da

diversificação na atuação local das mesmas elites agrárias que viam, na fundação de

novos núcleos urbanos, oportunidades diversas de controle da terra:

os toscos povoados (...), que parecem brotar ‘naturalmente’ da paisagem, não o

fazem, na verdade. Sutilmente, rompem com o mundo rural, expressando, pequenos

e espalhados por entre enormes domínios agrários, um outro processo social”

(MARX, 1991, p. 26).

O campo disciplinar da Morfologia Urbana, apresenta ferramentas para melhor

compreender esses processos. Costa & Netto (2015), apresentam a estruturação

territorial segundo fases distintas. A primeira fase, corresponde às rotas que permitem

o acesso e circulação no território. Nada existe sem o prévio estabelecimento de

caminhos e trilhas. Identificamos essa fase em relação aos caminhos já elencados

nas imagens anteriores (COSTA & NETTO, 2015, p. 202).

A segunda fase estruturante são os assentamentos, implantados com capacidade

de mudar a estrutura natural do território. Eles são descritos como ‘pousos’, locais

que serviam à uma dinâmica própria dos caminhos, de amparo a viagens diárias e,

eventualmente, embriões de povoações. Relacionam-se, em nosso estudo, diretamente

,

reta.

Influências do Cubismo e Modernismo estão no bloco da sala de estar pelas

linhas retas. Longe do racionalismo puro e geometria forte da arquitetura moderna,

a pintura e escultura dessa época interferiram nas linhas orgânicas da casa, grande

característica da contemporaneidade, presentes na parte externa da escada e no

acesso principal.

A residência por inteiro sugere uma versão atual dos elementos da pintura

abstrata de Kandinsky (PROENÇA, 2010), entrelaçando ponto, linha e plano e amplia

a relação da edificação com o espaço que está inserida (ver figura 4).

Figura 4 - Casa Kleinert, em grafite

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 7

Da autora, 2017

A imagem traduzida em grafite demonstra a harmonia eidética produzida pelas

linhas horizontais, verticais e curvas. Os traços orgânicos enriquecem e destacam a

entrada.

4 | CASA OST

Mais sobriamente, no mesmo bairro da casa Kleinert, a casa da família Ost exibe

design contemporâneo com características comuns à primeira residência. Elementos

com formas divergentes e paredes de vidro com aço, fazem as moradias terem o

mesmo estilo arquitetônico sem abrir mão de sua originalidade.

Também com influências cubistas, a arquitetura da Casa Ost dispõe de formas

mais tímidas e não se diferencia muito das construções de seu entorno. Elementos em

vidro na fachada frontal são destaque (ver figura 6). Variados triângulos e retângulos

dão um toque especial à edificação e a iluminação fica diferenciada em cada ambiente.

A sala de estar, de maior convivência, apresenta mais iluminação do que os quartos,

onde há menor tempo de convívio, por exemplo.

Figura 6 - Casa Ost

Da autora, 2017

Já falamos sobre vidro e aço, mas a arquitetura contemporânea não se resume

à esses dois objetos. De acordo com Castelnou (2015, p. 78)

Interessados na produção massiva, os formalistas ainda usam muito o concreto

armado, vidro e aço, materiais estes combinados aos tradicionais, especialmente

a pedra, a cerâmica e a madeira, porém com acentuada artificialidade e colorismo.

Como o autor diz, além desses dois elementos, materiais tradicionais como

a pedra, cerâmica e madeira também foram usados no formalismo, tendência da

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 8

arquitetura contemporânea que visava a aparência da obra, com mais atenção à

fachada, aspecto estético da casa Ost.

A pedra foi o elemento usado para dar diferencial à residência, une material

clássico com cor e forma diferenciada. A coluna, na fachada frontal, dá um aspecto

mais elaborado à lareira. Além disso, o detalhe vertical interage com o jardim em volta

pelo uso do material natural e pela conversação de cores.

Também é um elemento de transição entre o ambiente aberto e o fechado pela

interação com a natureza em volta. A parede de vidro, com a transparência, possibilita

a visão do interior ou exterior, de acordo com o lugar em que se está, e igualmente faz

parte dessa transição (Ver figura 7).

Figura 7 - Elementos de transição: coluna de pedras e paredes e painéis de vidro

Da autora, 2017

Da fachada e para a transição entre o externo e interno, vamos para o jardim da

Casa Ost.

Pela falta de linhas orgânicas e não romantização da natureza em suas formas,

podemos afirmar que a edificação e seu entorno não tem foco no paisagismo. Porém,

seria contraditório analisar essa moradia sem mencionar sua área verde, pela beleza

que apresenta.

Com plantas simples, não podadas para ter a forma desejada, e organizado

para lazer e contemplação, o jardim da propriedade é específico da primeira etapa

do paisagismo do século XX e XXI. Sobre essa fase do paisagismo, REYES (2015)

afirma:

A característica principal dos novos projetos paisagísticos residenciais está

baseada na transparência e visibilidade a ser dada à residência e a formalização do

pátio ou jardim de estar da família, muitas vezes decorado por painéis azulejados,

fontes de formas geométricas ou orgânicas e esculturas de autores do período.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 9

Assim, a principal particularidade do paisagismo residencial está focada no

destaque a ser dado para a obra e a formalização da área verde. Na decoração,

muitas vezes, são usados materiais como painéis de azulejo, fontes e esculturas.

Deste modo, compreendemos que o objetivo do paisagismo da casa Ost é o

mesmo do moderno e contemporâneo: realçar a edificação, sendo o jardim somente

uma parte do conjunto arquitetônico para convivência, mas que não pode ser esquecida.

5 | CONCLUSÃO

A arte moderna surgiu para se desligar totalmente de ideias antigas, inovando

em todas as vertentes artísticas. Já a contemporânea, incluindo a arquitetura, também

teve desejos de mudança, mas sem a negação à estilos anteriores.

Influências cubistas e modernistas estão presentes na arquitetura contemporânea,

mas a mesma não deixa de ser única. Vidro e aço, quebra das formas únicas e lisas,

sobreposições, linhas orgânicas, uso de diferentes materiais e jardins para destacar a

residência são marcas importantes desse estilo.

As casas apresentadas representam muito bem o estilo. Enquanto tem linhas

curvas, com a romantização da natureza, a outra tem aparência mais tímida, sóbria.

Com o vidro e o aço, a Casa Kleinert usa curvas para destacar partes da residência

que não chamariam muita atenção de quem passasse por lá caso não houvesse. O

material na sala evidencia o pé direito alto do primeiro pavimento. Já a Casa Ost

usa o vidro para limitar a passagem de luz em alguns ambientes de menor ou maior

convivência e usa figuras geométricas variadas, diferente da primeira moradia.

As formas também são muito importantes. Enquanto a casa branca integra linhas

curvas e retas, a residência da família Ost é mais tímida e assume formas mais comuns

ao espaço que está inserida. A sobreposição das formas também é diferente, a família

Kleinert dispõe de sobreposições que ficam evidentes com seus diferentes ambientes

(sala, escada e acesso principal), na outra edificação, essa característica é percebida

pelo telhado, que possui muitas águas.

Na questão paisagística a Casa Ost tem toda as marcas específicas da primeira

etapa do paisagismo moderno e contemporâneo, que tem como objetivo o destaque

à casa e plantas simples.

A simplicidade das formas na arquitetura pós-moderna são valorizadas ocorrendo

a harmonia estética em um ambiente sociocultural distante das grandes metrópoles.

Várias influências da Arquitetura Contemporânea estão presentes em elementos

arquitetônicos destas residências na cidade de Santo Cristo, interior do Rio Grande

do Sul. É a arte presente no cotidiano da comunidade e na contemporaneidade pela

arquitetura.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 1 10

REFERÊNCIAS

CASTELNOU, Antonio. Arquitetura contemporânea. Curitiba: Universidade Federal do Paraná -

UFPR, 2015.

DIANA, Daniela. Modernismo no Brasil. 2017, disponível em

modernismo-no-brasil/>. Acesso em 29 de junho de 2017.

PROENÇA, Graça. História da Arte. São Paulo: Ática, 2010.

REYES, Ana. Jardim moderno e contemporâneo. 2015, disponível em

br/blog/post.php?id=57>. Acesso em 23 de junho de 2017.

ZEVI, Bruno. A Linguagem Moderna da Arquitetura: Gui ao código anticlássico. Lisboa: Publicações

Dom Quixote, Coleção Arte e Sociedade, 2002.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 11

CAPÍTULO 2

doi

RESSIGNIFICAÇÃO DA LINGUAGEM COMPOSITIVA

Rômulo Abraão Lima dos Santos

Rodrigues

Centro Universitário Christus – Faculdade de

Arquitetura e Urbanismo

Fortaleza – CE

RESUMO: O presente estudo pretende compor

uma crítica a respeito da obra arquitetônica

“Casa do Cinema Manoel Oliveira”, realizada

pelo arquiteto Eduardo Souto de Moura, a fim

de compreender, de forma minuciosa, como

se desenvolveram os métodos e demais

posicionamentos projetuais assumidos

,

com a estratégia de conversão dos sertões em território pela Coroa, com a afirmação

da posse da terra na região de fronteira das capitanias de São Paulo e Minas Gerais

e com a busca pelo ouro.

Para as autoras, a terceira fase corresponde à apropriação do território para uma

atividade agrícola permanente, fase produtora capaz de transformar a ordem natural

em produção artificial. A fazenda Laje, da qual se desmembra, em 1865, o patrimônio

de São José corresponde então à essa terceira fase de ocupação do território, cuja

natureza iremos explorar na sequência.

Destaca-se que as três fases iniciais correspondem ainda a uma ocupação

nômade e somente a partir da fase de produção é que se viabiliza a fixação no território.

Já a quarta fase, é caracterizada pela formação hierárquica de assentamentos, com

a implementação de centros de atividades. Nessa fase, a ocupação deixa de ser

nômade e passa a fixar-se, delineando progressivamente um protonúcleo ou um

núcleo urbano (COSTA & NETTO, 2015, p. 203). Em termos gerais, corresponde à

fase de consolidação do núcleo urbano, como um pequeno povoado formado a partir

da doação de terras a um patrimônio religioso, que progressivamente vai afirmando

sua hierarquia na rede urbana. Segundo Murilo Marx:

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 126

Os patrimônios constituíam porções de terra cedidas por um senhor, ou por vários vizinhos,

para servir de moradia e de meio de subsistência a quem desejasse morar de forma gregária

e voltada para certas atividades ou que tivesse, no fundo, outro tipo de relacionamento de

trabalho ou de troca com os doadores. (...) Os patrimônios podiam ser religiosos ou leigos,

tendo este último ganho importância e maior frequência nos últimos dois séculos, já sob um

outro quadro imobiliário” (MARX, 1991, p. 38).

O patrimônio religioso de São José do Rio Pardo media 12 alqueires e foi doado

por um grupo de fazendeiros – Antônio Marçal Nogueira de Barros, José Theodoro

Nogueira de Noronha, João José de Souza, Cândido Faria e Cândido Miranda de

Noronha – em 6 de fevereiro e 19 de junho de 1865, em regime de condomínio da

Fazenda Cachoeira do Lajeado, depois denominada somente ‘Laje’. Localizamos no

Cartório de Registro de Imóveis de São José do Rio Pardo a confirmação da doação

do patrimônio. Em 1902, a Fábrica da Matriz de São José do Rio Pardo, responsável

pela administração dos bens, registra em cartório de imóveis a doação de 1865:

Antiga Fazenda de café, hoje patrimônio de São José. Doze alqueires de terras

nesta cidade, outrora pastos da fazenda Laje, e com seguinte demarcação: começa

no Rio Pardo, em um ralho que começa no mesmo rio e por este acima a dobrar em

córrego, até (...) dividindo com João José de Souza, até a porteira da cabeceira de

uma lagoazinha, pela “aguinha” desta abaixo, até desembocar no córrego maior,

até aqui dividindo com Joaquim Gomes Nogueira de Sá e Antônio Marçal Nogueira

de Barros, por este córrego abaixo até a barra do córrego denominado “da Barra”,

até aqui dividindo com os mesmos sócios até frontiar a olaria de Gabriel José de

Souza e d’ali rumo até perder deste primário e desta demarcação (OFICIAL DE

REGISTRO..., LIVRO A-ANTIGO, p. 78).

Espacializamos o patrimônio doado em um mapa georreferenciado atual – a

partir de imagem em Google Earth –, demarcando 12 alqueires de terras (cerca de

290.000,00 m²), o que demonstrou a relação do patrimônio com a hidrografia, como

forma de sua demarcação (Fig. 4). Ficou claro, também, que a demarcação descrita no

registro em cartório não correspondia a 12 alqueires, quando espacializada em uma

base atual. Esse fato mostra que o método cartorial de registro de terras no século

XIX, a partir de referências da paisagem geográfica, incorria em erros nas medidas

reais que, por sua vez, eram de difícil conhecimento.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 127

Figura 4: Patrimônio doado a São José em 1865. Em vermelho, a espacialização do patrimônio,

somando exatos doze alqueires (290.400,00 m²), sobre imagem de satélite de 2017. Em laranja

a linha representando o trajeto da ferrovia e, em azul, o córrego que antes pertencia à fazenda

Laje, de nome Macaúbas. Desenho do autor sobre original.

Fonte: Ferreira, 2017, P. 271.

3 | A EXPANSÃO DO TECIDO URBANO E SEUS PERÍODOS MORFOLÓGICOS

Para Panerai (2014), entender o processo de crescimento urbano pode nos

oferecer uma apreensão global em uma perspectiva diacrônica, onde buscam-se

identificar os pontos fixos das transformações anteriores, para assim identificar as

lógicas do assentamento atual (PANERAI, 2014, p. 55). O método do autor consiste

em interpretar o tecido edificado na busca por referenciais físicos das sucessivas

transformações, que deixaram marcas de uma sedimentação histórica, assumindo que

“estabelecer as relações entre os grandes traçados e o sistema viário principal, com os

edifícios públicos revela a estrutura monumental e seu vínculo com o sítio” (PANERAI,

2014, p. 78). Esse é o método aplicado nos subitens seguintes, onde procedemos à

espacialização da evolução do tecido urbano, ressaltando aspectos de seu processo

formativo. A mesma abordagem encontra-se em Guerreiro (2002) – método tipológico

territorial – cuja vantagem encontra-se na forma de estudo “cíclico”, onde pode-se

saber, pela configuração atual, os estágios anteriores ou futuros do tecido urbano.

3.1 Primeiro período morfológico: a morfogênese

A morfogênese do tecido urbano de São José do Rio Pardo é configurada pela

rota estruturante do território, a partir da qual sesmarias seriam demarcadas. O

patrimônio, doado em 1865, tem, ao centro, sua capela em posição de promontório

cuja delimitação é feita pelos rios circundantes (Fig. 5). Corresponde à quarta fase de

estruturação no território, descrita no subitem anterior a partir de Costa e Netto (2015),

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 128

onde o patrimônio representa o rompimento de uma dinâmica rural preexistente.

Assim, as quatro fases de estruturação do território, segundo Costa e Netto (2015),

antecedem os períodos morfológicos que serão definidos nos subitens sequentes.

3.2 Segundo período morfológico: 1865 – 1905.

O segundo período morfológico define-se pela consolidação do traçado dentro

dos limites do patrimônio religioso. O parcelamento das quadras deu-se a partir do

largo da igreja, na cota mais alta, em direção aos fundos de vale. O arruamento inicial

de São José do Rio Pardo foi, segundo Adriano Campanhole, proposto por Antônio

Marçal Nogueira de Barros, em sessão da Câmara de Caconde em 7 de novembro de

1868. Nogueira de Barros havia sido um dos doadores do patrimônio de São José do

Rio Pardo:

Foi proposto pelo Vereador Marçal que tendo ele, e outros, seus vizinhos, dado

para um patrimônio a São José uma sorte de terras, aconteceu para esse lugar tem

afluído algumas pessoas para morar, e para que aquele lugar que naturalmente

deve se tornar uma povoação não fique arruado com grande defeito (...) o mesmo

Vereador Marçal indicou que estava no caso de servir naquele lugar o cargo de

fiscal o cidadão João de Deus Araújo Lasbínio, o qual deverá servir cumulativamente

o cargo de arruador (CAMPANHOLE, 1979, p.527).

Para Guerreiro (2002), é possível estabelecer uma relação direta entre tipologia

territorial e tipologia edificativa. Os caminhos e o parcelamento fundiário são exemplos

de estruturas produzidas que guardam uma relação com o existente (GUERREIRO,

2002, p. 59). A quadrícula era o modo mais prático de execução do traçado urbano,

pois o módulo básico do lote, e consequentemente da quadra, eram ‘carimbados’

conforme as necessidades e ajustados à topografia. No século XIX, a cidade tem

seu solo estabelecido como mercadoria (GUIRARDELLO, 2010, p. 98) e a forma

de parcelamento do solo transparece essa lógica. As novas vias, traçadas a partir

das antigas rotas, estruturaram os espaços privados

,

(datas e quadras) e os espaços

públicos (largos, cemitérios e praças).

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 129

Figura 5: Mapa hipsométrico demonstrando a rota estruturante no território e sua relação com o

patrimônio doado em 1865. Em destaque o Rio Pardo e os principais cursos d’água da região.

A rota no território foi espacializada através da sobreposição do mapa representado na Fig. 2

sobre Google Earth e, posteriormente, georreferenciado em Qgis.

FONTE: elaboração pelos autores.

Neste período morfológico, São José do Rio Pardo passou de patrimônio (1865)

– com a construção da capela em 1872, curada no mesmo ano – para freguesia em

1874 e foi elevada à vila em 1886. De acordo com Cassassola (2009), ao ser elevada

à condição de vila, em 1886, São José do Rio Pardo contava com 4.225 habitantes,

quatro praças – da Matriz, do Rosário, do Mercado e da Estação –, possuindo ainda

cerca de 800 casas, sendo apenas 3 delas sobrados (TREVISAN apud CASSASSOLA,

2009, p. 52). O tecido, e consequentemente os espaços públicos, era modelado a

partir das principais rotas e caminhos, assim como o primeiro cemitério, construído em

1878, na continuação da rua direita. Segundo o relatório do vigário de São José do Rio

Pardo, feito em 1906,

(...) o cemitério continuou a servir a administração do Governo Municipal, que

ordenou o seu fechamento no ano de 1885, fazendo construir novo cemitério na

parte norte da cidade, na contravertente de uma colina que se eleva no alto do

córrego nas Macahubas (CÚRIA..., Relatório de 1906, Fls.7).

O novo cemitério seria inaugurado em 1881, em uma região ainda não ocupada

do tecido urbano. Como base cartográfica, adotamos o mapa da Comissão Geográfica

e Geológica de São Paulo, folha de Casa Branca (1905) (Fig. 6), para espacializar

o crescimento do tecido urbano, em relação à planta atual do município. Assim,

definimos a ocupação urbana de 1905 sobre mapa hipsométrico georreferenciado

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 130

(Fig. 7), onde elencamos os espaços públicos do tecido urbano, e a constituição da

ocupação das quadras. O caminho estruturante, ao adentrar o largo da igreja, origina a

antiga rua direita, recorrente em todas as cidades do período colonial e imperial. Nessa

figura, ainda podemos identificar que todos antigos caminhos que davam acesso ao

patrimônio – um protonúcleo - estruturaram as principais ruas do tecido.

A ocupação não se deu de forma aleatória: mesmo na definição do patrimônio

religioso quanto no reticulado das quadras e vias, os elementos naturais se fizeram

presentes (rios, córregos e o micro relevo), estabelecendo uma implantação em

promontório. Também com relação à expansão do tecido urbano, observa-se que

as relações com as linhas estruturantes prevalecem. As linhas de cumeeira (festo)

e fundo de vale (talvegue) hierarquizam um sistema de espaços públicos (largos,

praças, edificações). A ferrovia Mogiana, que instalou seus trilhos em São José do Rio

Pardo em 1887, também se apropriou das linhas de talvegue para implantar o leito

ferroviário.

Segundo Carlos D. Coelho:

(...) a ocupação urbana nos locais de fundo do vale ocorre, prioritariamente, depois

da estabilização de um assentamento inicial, quase sempre ribeirinho, a partir do

qual se desenvolve a expansão do núcleo ao longo das vias de penetração no

território, gradualmente apoiadas no percurso natural das linhas de água (COELHO,

2014, p. 48).

Figura 6: Recorte sobre o mapa da Comisão Geográfica e Geológica de São Paulo (1905),

com a identificação, na cor amarela, das rotas estruturantes e sua intersecção, configurando o

núcleo urbano de São José do Rio Pardo. Intervenção dos autores sobre original.

FONTE: Arquivo Público do Estado de São Paulo.

Essa configuração fica clara quando observamos as linhas de expansão do

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 131

tecido urbano de São José do Rio Pardo-SP, seguindo os fundos de vale formados

por rios (Fig. 6). Em um processo de “sedimentação no tempo” (COELHO, 2014,

p. 52), o autor identifica as linhas de cumeeira, do ponto de vista teórico, como a

morfogênese do tecido urbano de Lisboa. Em nosso objeto de estudo, estabelecemos a

diferenciação em relação à escala de análise: no macro relevo, as “linhas estruturantes”

(GUERREIRO, 2002, p. 50) localizam-se nos fundos de vale (talvegues), enquanto

que, no micro relevo, percebemos as linhas estruturantes configuram-se em locais

de cumeada. Elas assumem, portanto, uma dupla natureza, alterando-se a escala da

hipsometria considerada, e traduzem-se em um percurso estratégico de controle do

território envolvente.

Figura 7: Reconstituição do tecido urbano em 1905. Georreferenciamento, a partir do

parcelamento atual, sobre base hipsométrica em Qgis.

FONTE: Elaboração dos autores.

3.3 Terceiro período morfológico: 1905 – 1922

O terceiro período morfológico corresponde à expansão para fora dos limites do

patrimônio doado em 1865. A transposição do Rio Pardo foi realizada pela construção

de uma ponte metálica, inaugurada em 1897 por Arthur de Montmorency, e reconstruída

a cargo do engenheiro Euclides da Cunha, em 1900. O Acesso permitiu a configuração

de uma nova nucleação e uma diversificação do tecido, tema que exploraremos a

seguir.

A expansão do tecido urbano em sentido oeste, transpondo o Rio Pardo, deu-

se, segundo Rodolpho Del Guerra, do desmembramento da Fazenda Açudinho, com

uma doação de terras para formar o patrimônio religioso. A criação desse patrimônio

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 132

ocorreu em 1915 (DEL GUERRA, 2002, p. 273), e deu origem ao bairro Santo Antônio,

cuja igreja de mesmo nome implanta-se em promontório. A superação do obstáculo

físico, representado pelo Rio Pardo, deu origem à uma deformação por ruptura do

tecido (COELHO, 2014, p. 42), deslocando a malha reticulada de forma a adaptá-la

à topografia, ao mesmo tempo que configurava novas rotas estruturais no território.

Segundo o autor: “aqui os acidentes geográficos estão na origem das interrupções

na aplicação da malha, produzindo elementos urbanos singulares que introduzem

excepções no sistema de composição” (COELHO, 2014, p. 42).

Conceitos equivalentes são utilizados por Panerai (2014), que ao definir o

crescimento contínuo (prolongamento do tecido existente) e descontínuo (rompimento

do tecido existente), pontua uma série de elementos reguladores, entre eles a “barreira

ao crescimento” (PANERAI, 2014, p. 67), um obstáculo geográfico (rio, relevo, floresta,

tipo de solo, etc.). Esses elementos atuam tanto como indutores como bloqueadores

do crescimento, a depender de seu papel: o Rio Pardo, depois de transposto, atuou

com um referencial na malha como futuras expansões em ambos os lados; o tecido

urbano também foi seccionado, pela passagem dos trilhos da Companhia Mogiana de

Estradas de Ferro. Estudar o processo de crescimento nos leva às marcas de antigos

usos e, a partir disso, o significado dos espaços é revisto. Identificar antigos usos de

barreiras e limites atuais ajuda-nos a compreender a razão de ser, a configuração do

tecido. Logo, identificamos que, o trajeto da ferrovia, delineado em preto na Figura

8, ainda permanece como uma avenida de fluxo intenso, cujo percurso perimetral

configura-se como um eixo.

Figura 8: Tecido urbano de 1922 sobre mapa atual (2019). Em vermelho as rotas no território,

hoje vias corredores e avenidas

FONTE: elaboração dos autores.

A construção do mapa anterior foi possível pelo cruzamento de fotografias aéreas

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 133

produzidas nos anos 1922 (Fig. 9), que retrataram o tecido urbano em processo de

expansão. Espacializamos o tecido da década de 1920 sobre base cartográfica atual

(2019) com o objetivo de facilitar a leitura da malha parcelar, uma vez que em algumas

quadras tem-se

,

uma ocupação em apenas alguns lotes.

Na imagem, observamos que o tecido urbano tem como eixos de expansão

os antigos caminhos e rotas. Esse tipo de expansão dá-se sobre uma “faixa de

pertencimento” (COSTA & NETO, 2015, p. 186), uma ocupação lindeira à rota matriz

que estruturou inicialmente o território, onde pequenos pontos localizam-se ao fundo,

na via de circulação que conecta São José do Rio Pardo a Caconde e à fronteira de

Minas Gerais (ver Fig 9).

A atual rua Siqueira Campos foi o ponto de chegada a um antigo largo – Praça do

Mercado – atualmente praça Prudente de Moraes. Ali, descansavam as tropas de bois

e realizavam-se as feiras e o comércio (Fig. 10). De acordo com Nilson Ghirardello,

Outro provável local para as edificações privadas era o caminho que se dirigia a

alguma cidade maior, ao sertão ou às fazendas mais importantes, essa via, que

futuramente seria absorvida por uma rua, por causa do movimento, teria prioridade

na escolha daqueles interessados por datas para as construções de cunho

comercial. Em geral, tornava-se a primeira via nomeada, e a mais importante, num

primeiro momento (GHIRARDELLO, 2010, p. 129).

Para o autor, o traçado das cidades paulistas de meados do século XIX difere

das cidades coloniais pois sua matriz deriva da quadra:

(...) no momento em que a quadra, a partir da repetição do lote (ou data), define a

malha, estabelece-se um ‘módulo-base’ para todo o arruamento, num procedimento

novo e típico dessas cidades (GHIRARDELLO, 2010, p. 98).

No mapa da Figura 8, destacamos uma ocupação isolada, a leste do núcleo

central, que não obedece à lógica da quadrícula e destoa do restante do tecido. Ali foi

edificado entre 1915 e 1916, segundo Del Guerra (2001), o Asilo “Vila São Vicente”,

em uma área de 41.000 m².

A implantação de áreas como essas, desmembradas de antigas fazendas

em datas a serem vendidas, que não faziam parte do patrimônio doado em 1865,

direcionaram o crescimento do tecido em sentido leste. Segundo Del Guerra, a porção

leste do centro de São José do Rio Pardo foi loteada a partir da venda da fazenda da

família Pereira da Silva, que limitava-se com o Córrego das Macaúbas, limite do antigo

patrimônio.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 134

Figura 9: Foto aérea do início da década de 1920, representando o tecido urbano e sua relação

com o território. Em verde, destacamos a rota estruturante que originou a povoação, a qual

identificamos na cartografia histórica desde 1777.

Fonte: Centro de Memória Rio-pardense.

Figura 10: Foto do antigo Largo do Mercado, hoje Praça Prudente de Moraes.

Fonte: Centro de Memória Rio-pardense.

3.4 Quarto período morfológico: 1922-1941

O quarto período morfológico é definido pela expansão do tecido urbano

de maneira descontínua, com a criação de novos polos. Essa expansão também

encontrou impedimentos, como o obstáculo representado pelo córrego das Macaúbas,

que direcionou, juntamente com a topografia, a mudança do traçado ortogonal.

Para Panerai (2014), a transposição de uma barreira pode resultar em várias

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 135

situações, entre elas a modificação e intervenção pontual: “ao redor dos locais de

franqueamento, como portas, pontes ou cruzamentos. A ruptura subsiste: a relação

entre os dois lados dá-se somente em certos níveis (por exemplo através de vias

principais, enquanto as ruas secundárias não transpõem a barreira)” (PANERAI, 2014,

p. 70). Esse processo é identificado a partir da análise do tecido urbano da década de

1940 (Fig. 11), usando, para isso, um mapa produzido em 1941 (Fig. 12), assim como

fotografias aéreas (Fig. 13).

Na estruturação do tecido entre 1922-1940, novamente, as rotas ocuparam o

papel de direcionamento dos equipamentos públicos urbanos. Ao analisar a malha

de ocupação urbana, tanto na espacialização (Fig. 11), quanto na planta cadastral do

município, elaborada pelo Estado de São Paulo (Fig. 12), nos detivemos na relação

entre a ocupação inicial (1865), com a formação do protonúcleo e as rotas estruturantes

do território. Podemos afirmar que o território apresenta papel decisivo na expansão

do tecido, motivo pelo qual a porção sul do mesmo foi sendo ocupada nas “faixas de

pertencimento” (COSTA & NETTO, 2015, p. 186) do caminho, ou seja, as faixas de

alinhamento com as rotas.

A ocupação em sentido leste deu-se de forma pontual, localizando pontos

esparsos relacionados a consolidação de novas nucleações.

Figura 11: Tecido urbano de 1941 sobre mapa atual (2019). Em vermelho as rotas no território,

hoje vias corredores e avenidas

FONTE: elaboração dos autores.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 136

Figura 12: Mapa de São José do Rio Pardo, em 1941 (edição de 1950). Optamos por

apresentar o mapa rotacionado, facilitando sua comparação com os mapas anterior.

Destacamos os pontos: 1) 1º grupo escolar e mercado municipal (1924); 2) 2º grupo escolar; 3)

caixas d’água; 4) Santa Casa de Misericórdia; 5) Asilo padre Euclides; 6) Igreja de São Roque;

7) Jardim de Euclides da Cunha e 8) Igreja de Santo Antônio. Em vermelho, destacamos as

rotas estruturantes no território, e sua configuração no núcleo urbano. Intervenção dos autores

sobre recorte do original.

Fonte: Arquivo Público do Estado de São Paulo.

No mapa da Figura 12, elencamos os pontos correspondentes a novos espaços

públicos e igrejas. O nº 1 indica o 1º Grupo Escolar e o Mercado Municipal. O 1º

Grupo Escolar foi edificado por iniciativa de Antônio Cândido Rodrigues, que foi militar

e político brasileiro, estando em 1905 ocupando o cargo de Secretário da Agricultura,

quando do lançamento da pedra fundamental do Grupo Escolar. A inauguração do

edifício deu-se em 22 de abril de 1908 (DEL GUERRA, 2001). O terreno à frente do

Grupo Escolar seria ocupado pelo Mercado Municipal somente em 1924, ano do início

de sua construção. O edifício foi inaugurado em 1926.

Com a edificação do mercado, transladava-se o local de feiras e comércio da

cidade, antes localizado em uma região de várzea, o que evidencia práticas higienistas.

Novamente, as ocupações foram direcionadas pelos caminhos principais do tecido,

antigas rotas estruturantes.

Nessa década ocorre, concomitantemente, a reforma da Estação Mogiana, no

antigo Largo da Estação. A edificação havia sido ampliada em 1913, quando era ainda

um sobrado, de dimensões reduzidas. Em 1927 a edificação foi demolida e deu lugar

ao prédio atual, preservado em todas as suas características. Já o segundo grupo

escolar (nº 2), foi construído entre 1938 e 1940, localizado em um alargamento de via

(rota estruturante), praça Cap. Mário Rodrigues. De acordo com Ghirardello (2010),

“a República se manifestará fisicamente no solo urbano através da construção, pelo

governo estadual, de alguns edifícios relevantes, como o grupo escolar, o fórum e

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 137

a cadeia, caso a cidade fosse sede de comarca, sempre confiados a arquitetos de

renome” (GHIRARDELLO, 2010, p. 213).

No caso de São José do Rio Pardo que destacava-se pela lavoura de café, as

novas obras como grupos escolares e até mesmo as igrejas, incentivadas desde

o início por particulares, eram tidos como símbolos de modernidade e progresso.

Outras simbologias também deram nomes a espaços públicos, como o Parque da

Independência (nº 3), inaugurado em 1922, onde foram construídos os primeiros

tanques para armazenamento da água encanada da cidade. No nº 4, indicamos o

edifício da Santa Casa de Misericórdia, depois hospital São Vicente, instalado em

1930. Todas as obras de construção de novas edificações foram patrocinadas por

elites cafeeiras, que viam no solo urbano, um capital especulativo.

O nº 5 refere-se ao já citado Asilo Padre Euclides, edificado em 1916, ao passo

que outra nucleação, mais a leste, foi configurada pela construção da Igreja de São

Roque (nº

,

6), construída na década de 1930 e inaugurada somente em 1942. O nº 7

refere-se ao jardim público implantado no antigo canteiro de obras da ponte metálica,

inaugurada em 1901 por Euclides da Cunha e que deu nome ao espaço público. O nº

8 indica a Igreja de Santo Antônio, implantada ainda nos anos 1915.

Figura 13: Foto aérea de São José do Rio Pardo, em 1939, tirada pela Empresa Nacional de

Fotos Aéreas (ENFA).

Fonte: Instituto Geográfico e Cartográfico de São Paulo (IGC).

4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente trabalho, demostramos a morfogênese e o crescimento do tecido

urbano de São José do Rio Pardo-SP, através da espacialização de documentação

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 138

primária e utilizando de ferramentas teórico metodológicas presentes em Panerai

(2014), Costa & Netto (2015), Guerreiro (2002) e Coelho (2014) – crescimento do

tecido, fases de formação, períodos morfológicos e estruturação territorial.

O estudo aponta para a permanência de antigas estruturas na paisagem atual

(caminhos, rotas, limites e edificações) construindo uma imagem de sedimentação

histórica, na qual as marcas do passado são lidas em estágios anteriores de mapas

e plantas, ou pela reconstituição a partir de iconografia. Observamos também uma

constante em relação à permanência de antigos caminhos, em detrimento das

demais estruturas, o que também abre precedentes para estudos de conjunto sobre

as cidades paulistas que formaram-se a partir da mesma rede urbana, indicando

aspectos fundiários da morfogênese de seu tecido como método para compreender o

crescimento urbano.

REFERÊNCIAS

Costa, Staël de Alvarenga P.; Netto, M. M. G. Fundamentos de morfologia urbana. Belo Horizonte:

Editora C/Arte, 2015.

Costa, Staël de Alvarenga P. et. al. (2017, Agosto). O resgate da Morfologia Urbana de Bento

Rodrigues. Artigo apresentado 6ª Conferência da Rede Lusófona de Morfologia Urbana, PNUM,

UFES, Vitória (ES).

Cassassola, Luiz Antônio. Família, capitalismo e modernização: um estudo de caso da família

Dias de São José do Rio Pardo-SP (1870-1930). Dissertação (Mestrado em História) - Faculdade

de História, Direito e Serviço Social de Franca, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita

Filho”. Franca, 2009

Coelho, Carlos Dias (coord.). Cadernos MUrb – Os elementos urbanos. Vol 1. Lisboa: Argumentum,

2014.

Cúria Metropolitana de São Paulo. Relatório de 1906. Pasta de São José do Rio Pardo-SP, 1906.

Del Guerra, Rodolpho José. E as sementes florescem. São José do Rio Pardo – SP, Graf-Center,

2001

Ferreira, Rafael Augusto Silva. Entre fronteiras e conflitos: aspectos fundiários da formação do

Sertão do Rio Pardo, 1775 – 1865. Dissertação (Mestrado em Urbanismo) – Pontifícia Universidade

Católica de Campinas, Centro de Ciências Exatas, Ambientais e de Tecnologias, Pós-Graduação em

Urbanismo. Campinas, 2017.

Ghirardello, Nilson. A formação dos patrimônios religiosos no processo de expansão urbana

paulista. São Paulo: Editora Unesp, 2010.

Guerreiro, Maria Rosália P. O território e a edificação. O Papel do Suporte Físico e Natural na

Gênese e Formação da Cidade Portuguesa. ISCTE. Mestrado em Desenho Urbano, Lisboa, 2002

Campanhole, Adriano. Memória da Cidade de Caconde: freguesia antiga de N. S. da Conceição

do Bom Sucesso do Rio Pardo. São Paulo: A. Campanhole, 1979.

Marx, Murilo. Cidade no Brasil: terra de quem? São Paulo: Nobel; Editora da Universidade de São

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 10 139

Paulo, 1991.

Panerai, Philippe. Análise Urbana. Brasília: Editora UNB, 2014.

Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São José do Rio Pardo. Livro A-antigo. 300 folhas.

Reis Filho, Nestor Goulart. O Caminho do Anhanguera. São Paulo: Via das Artes, 2014.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 140

CAPÍTULO 11

doi

HETEROGENEIDADE DA FORMA DE UM SETOR

URBANO NO DISTRITO DO TREMEMBÉ

Adilson Costa Macedo

Rodrigo Luz Damasceno

RESUMO: Este artigo se situa no campo da

Morfologia Urbana onde a história é o pano

de fundo de fatos acontecidos que levaram

a transformação do desenho da cidade.

Trata do tecido urbano de um setor do bairro

do Tremembé, cidade de São Paulo, cujas

diferenças no projeto de urbanização refletem

as desigualdades socioeconômicas dos seus

moradores. Contexto que sugeriu adotar-se

como objeto de trabalho o tipo de constructo

destinado a moradia, onde os edifícios têm altura

de até quatro pavimentos e são implantados

em conjunto com residências térreas ou

assobradadas, isoladas ou em fileira. E, em

conjunto com a identificação destes elementos

urbanos, discutir-se os padrões de configuração

do espaço exterior, o traçado, o relevo do

terreno, a vegetação e a infraestrutura.

PALAVRAS-CHAVE: Bairro periférico, forma

urbana, projeto urbano.

RESUMEN: Este artículo se sitúa en el campo

de la Morfología Urbana donde la historia es el

telón de fondo de hechos ocurridos que llevaron

la transformación del diseño de la ciudad. Se

trata del tejido urbano de un sector del barrio

del Tremembé, ciudad de São Paulo, cuyas

diferencias en el proyecto de urbanización

reflejan las desigualdades socioeconómicas

de sus habitantes. Contexto que sugirió tomar

como objeto de trabajo el tipo de constructo

destinado a la vivienda, donde los edificios

tienen altura de hasta cuatro pavimentos y se

implantan en conjunto con residencias térreas

o silbadas, aisladas o en fila. Y, en conjunto con

la identificación de estos elementos urbanos

se discuten los patrones de configuración

del espacio exterior, el trazado, el relieve del

terreno, la vegetación y la infraestructura.

PALABRAS CLAVE: Barrio periférico, forma

urbana, proyecto urbano.

ABSTRACT: This article is in the field of Urban

Morphology where history is the background of

events that led to the transformation of the city’s

design. It deals with the urban fabric of a sector

of the district of Tremembé, in the city of São

Paulo, whose differences in the urbanization

project reflect the socioeconomic inequalities of

its residents. Context that suggested to take as

object of work the type of construct destined to

dwell, where the buildings have height of up to

four floors and are implanted together with single

or combined single or row houses. And, together

with the identification of these urban elements,

the patterns of configuration of the outer space,

the layout, the relief of the terrain, the vegetation

and the infrastructure are discussed.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 141

KEYWORDS: Peripheral district, urban form, urban design.

HETEROGENEIDADE DA FORMA DE UM SETOR URBANO NO DISTRITO DO

TREMEMBÉ

Preliminares

Demonstra-se a diferença entre três tipos de ocupação do espaço físico que

ocorrem em um setor do distrito do Tremembé, localizado na zona norte da cidade de

São Paulo. O distrito corresponde a superfície de cinco mil seiscentos e trinta hectares

com população aproximada de cento e noventa e sete mil. O setor destacado para

estudo tem a superfície de oitenta e três hectares e população equivalente a nove mil

e quatrocentos. Para a análise da forma urbana deste pequeno setor, face a dimensão

do distrito, é considerada a apropriação do território através das vias, quadras, lotes,

tipos de edificação e de espaços livres, aproveitando as possibilidades oferecidas por

um sítio de desnível acentuado. O pano de fundo da investigação sobre os tipos de

edificar acontece pela história do desenvolvimento da área, que espelha desigualdades

sociais através do arranjo de espaços e da qualidade das construções.

O setor foi subdividido em três subsetores cuja proximidade e por suas

características físicas espelha três diferentes níveis de renda, fato observado no

Tremembé, mas que é constante nos bairros periféricos de São Paulo. A pesquisa,

baseada em trabalho de campo, chega a um resultado contrário à crença corroborada

,

por planejadores urbanos que generalizam o dito de haver um cinturão de pobreza

ao redor da área central da cidade. Afirmação que precisa ser expressa com maior

cuidado, pois existem manchas urbanizadas para um padrão alto e médio de renda

presente nas áreas periféricas de São Paulo. Gente que melhorou o poder aquisitivo por

seu mérito, o empreendimento que cresceu, por estar localizado em ponto estratégico,

e que decidiu não migrar para local de maior prestígio em troca de ficar perto do

trabalho, por laços de família e pelos amigos.

Como base para desenvolvimento do artigo são empregados conceitos

relacionados ao estudo da forma urbana, suporte de onde nasceram os procedimentos

para a pesquisa e obtenção do material ora condensado na forma de artigo.

REFERENCIA A CONCEITOS

O trabalho se desenvolve por procedimentos analíticos aplicados a uma área de

grande dimensão. De modo interativo, busca-se entender a região, a acessibilidade

e o distrito como um segmento do espaço maior. Para finalmente se deter nos oitenta

e três hectares (83 ha) correspondentes ao setor selecionado como área-estudo

(ROSSI, 2001).

O procedimento adotado para conhecer o setor foi o do pesquisador percorrer

o local a pé, com os recursos de fotografar, anotar por textos breves e fazer croquis

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 142

das informações. Procedimento este, integrado ao trabalho de escritório que facilitou

a determinação dos tipos de lote, edificações e logradouros, onde os dados foram

classificados e processados. Apoiado no estudo tipológico se estabeleceu a relação

do espaço construído com a sua implantação. Primeiro o distrito do Tremembé para

caracterizar e diferenciar os setores, com mais detalhes o setor escolhido como área-

estudo.

O tecido urbano é formado por um conjunto de configurações. O terreno natural

se transforma por elementos como o traçado viário formador da malha de quadras, seu

parcelamento em lotes, os diversos tipos de uso e ocupação, do solo. A camada de

tempo sobreposta a esses elementos é o dado que indica as modificações realizadas

na cidade ao longo dos anos, como declara Rossi:

Refiro-me à construção da cidade no tempo. Considero que esse ponto de vista,

independentemente de meus conhecimentos específicos, pode constituir o tipo de

análise mais abrangente da cidade; ela remete ao dado último e definitivo da vida

da coletividade: a criação do ambiente em que esta vive (1966, p.1),

A citação acima discursa sobre a leitura do tecido urbano através de seu

dado último, ou seja, a sua construção mais recente, entendida como aquela em

que a sociedade participa das alterações em curso e atua sobre o tecido histórico

e consolidado através do tempo. Nesta narrativa parte-se do dado último para

a compreensão do setor urbano escolhido para estudo, sem deixar de lado os

constituintes históricos do contexto maior onde ele se situa. Considera-se que desde

os anos cinquenta do século XX, o processo de ocupação do município se tornou

complexo. O deslocamento da classe dominante das áreas centrais no sentido sudoeste,

o deslocamento da indústria automobilística para municípios vizinhos, o crescimento

periférico acentuado, um ambiente de crise e diminuição do poder de compra, bem

como a questão da localização e o preço da terra, são fatores importantes que ajudam

ilustrar a complexidade do tecido urbano da cidade de São Paulo.

O estudo dos tipos de ruas, quadras, edificações, gabaritos, vegetação e uso do

solo, contribuem para o entendimento dos espaços que configuram os lugares das

pessoas e formam a base para eventuais proposições.

O conceito de tecido urbano exprime a realidade da cidade construída, matéria com

existência real e temporal, que inclui indissociavelmente o espaço e o edificado, o

público e o privado, isto é, as ruas, as parcelas, os edifícios, as infraestruturas, et.,

isto é, toda a cidade física (COELHO, 2013, p. 14)

O tecido urbano se refere a cidade construída, tridimensional. Sua representação

como projeto subentende a existência de desenhos, o plano da cidade, o traçado

como se diz em Portugal. O arquiteto-professor Coelho oferece a seguinte definição:

O traçado conceito abstracto e bidimensional é obtido por um processo redutor ao

retirar ao tecido urbano uma das suas três dimensões. Remete para a representação

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 143

do espaço público e da estrutura parcelar, indiferenciado os vários elementos que

os materializam. Ao primeiro componente - o espaço público -estruturador das

parcelas individuais, podemos chamar de Traçado Urbano; ao segundo, menos

perceptível na globalidade, mas pelo contrário mais sujeito ao processo evolutivo,

podemos simplesmente chamar de Parcelário (COELHO 2013, p. 31).

Coelho chama atenção para dois elementos importantes do projeto urbano, o

traçado ou o desenho do viário estruturador das quadras e as quadras como espaços

menores, divididas em partes ainda menores que são os lotes, o parcelário como

chamam os colegas portugueses. Como o professor afirma estes elementos estão

sujeitos a alterações no tempo.

A relação do traçado com o relevo do território, fundamental no projeto urbano,

é descrita pelo arquiteto-professor Sergio Padrão Fernandes, no capítulo 2 do livro

organizado por Coelho, como:

(...) o relevo imprime no traçado urbano os limites naturais do território evidenciando

a transição entre zonas com características morfológicas distintas que se reflectem

na variação morfológica do traçado urbano de acordo com a alteração dos

pendentes das encostas (COELHO 2013, p. 38).

Para a análise da forma urbana, objeto da investigação cujo resultado está

comentado neste artigo, tem-se em consideração três fases de desenvolvimento,

como proposto pelo arquiteto-urbanista Manuel de Solá-Morales:

• Crescimento suburbano: coincide com o início das ocupações na região,

quando no século XIX a abertura de vias ocorreu antes do parcelamento da

área.

• Urbanização geral: quando os caminhos gerados anteriormente se conso-

lidaram e deram lugar a avenidas estruturadoras do distrito, como é o caso

da Avenida Antonelo da Messina e da Rua Maria Amália Lopes de Azevedo.

Mencionadas, pois tem papel importante no setor ora indicado para estudo.

• Urbanização marginal: caso em que o território é parcelado e posteriormente

são comercializadas e construídas edificações. A partir da década de 1950,

com a aceleração do crescimento da mancha urbanizada em direção à peri-

feria, algumas áreas ao norte do distrito passaram a ser identificadas como

de urbanização marginal, onde o território foi parcelado, vindo aos poucos

as edificações e somente mais tarde a urbanização através da implantação

de infraestruturas como um todo, ou quase. A Rua Maria Amália Lopes de

Azevedo atualmente é a principal via que atravessa o distrito do Tremembé

com extensão de 4,3 km. Esta via funciona como o eixo de circulação supor-

te de um corredor de uso misto que se estende no sentido Leste-Oeste do

distrito (MORALES, 1997, p.27).

Como pequena porção de um universo maior de urbanização o setor objeto de

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 144

pesquisa foi estudado desde seu suporte natural visível, ou seja, não considerando os

elementos do subsolo. Entendendo-se que a arquitetura da cidade brota e modifica

a superfície do solo e acima dele, tendo respeito as implicações da infraestrutura e

demais condições devidas ao subsolo. Fica-se no universo do urban design, como

define Jonathan Barnett, disciplina que trata do projeto da cidade sem projetar cada

edifício, ou seja, sem avançar no campo do edifício isolado específico da Arquitetura

(BARNETT, 2003)

O tecido urbano entendido nas suas pequenas partes, que resulta do modo

das pessoas se apropriarem dos espaços indica padrões de uso que acabam por

gerar tipos de construção ou abrigo de atividades das pessoas. E,

,

estes são pontos

interessantes para investigar, que aparecem no Tremembé (ALEXANDER, 2013).

No que se refere a natureza do espaço um sistema de vias se identifica pela

largura e pelo tipo de piso das faixas de rolamento, se há tráfego de ônibus ou outro

veículo pesado, se existe ciclovia, pela qualidade das calçadas, paisagismo, mobiliário

urbano e sinalização. Estes elementos que são atributos de uma via de boa qualidade

a determinam do ponto de vista funcional. As fachadas das edificações, construídas

no alinhamento dos lotes ou acompanhando recuo obrigatório, havendo gradil ou não

no alinhamento da calçada, determinam o limite visual que define o recinto da rua,

enclosure da língua inglesa (EWING, 2013). Portanto, a compreensão do espaço da

via segundo o ponto de vista da forma urbana tem a ver com uma questão de ordem

funcional em conjunto com outra que se refere a percepção visual.

De acordo com sua extensão e funcionalidade as vias são consideradas em

apenas três tipos para efeito de análise da forma urbana: vias que atravessam, vias

que distribuem e vias locais. Isto tendo foco no perímetro do setor urbano que esteja

sendo estudado, ou seja, dependendo da dimensão do setor em estudo e sua posição

relativa, uma via de distribuição na escala da cidade poderá ser considerada como

uma via que atravessa no âmbito do setor.

No desenvolvimento da análise utilizou-se os conceitos de setores definidos pelo

sistema de vias, segundo três categorias:

• Vias que atravessam, aquelas que cortam ou tangenciam a área de estudo;

• Vias que distribuem, que fazem a ligação entre as vias que atravessam, dis-

tribuindo o tráfego das que atravessam para as vias locais.

• Vias locais, são as que acessam os locais mais protegidos do trânsito de

passagem, incluem o tipo loop e cul-de-sac.

Adicionando-se as faixas lindeiras de lotes elas constituem corredores, que

remetem a classificação da via de origem: corredor que atravessa e corredor que

distribui. As vias locais não chegam a ser corredores no sentido dos fluxos de passagem

de veículos e uso do solo. Os corredores do tecido urbano tradicional se interceptam

formando células onde os fundos dos lotes definem uma superfície poligonal chamada

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 145

de subárea (MACEDO, 2002).

O traçado viário resulta da subdivisão do espaço em quadras e do contorno de

espaços livres e verdes. No caso dos espaços livres e/ou verdes o contorno por vias

para veículos e pedestres tem o papel importante de garantir a acessibilidade de todas

as pessoas a estes locais.

DISTRITO DO TREMEMBÉ E O SETOR DE ANÁLISE

O distrito do Tremembé (5.630 hectares) está localizado na Zona Norte do

município de São Paulo e dista 13 quilômetros da região central da cidade. A população

presente no Tremembé é de 197.258 habitantes (dados atuais, Prefeitura do Município

de São Paulo). Devido à presença no distrito de uma parte do Parque Estadual da

Serra da Cantareira, a sua densidade demográfica é baixa, próximo de 35 habitantes

por hectare.

Na ilustração a seguir, destaca-se o município de São Paulo em relação à sua

região metropolitana. O círculo (preenchido) indica a localização da área de estudo

cujo perímetro corresponde a 1,47% (83 hectares) da área do distrito do Tremembé. A

região central de São Paulo está indicada por um anel, figura 1.

Figura 1: São Paulo e a região metropolitana

Fonte: Desenho elaborado pelos autores.

A área selecionada para estudo está indicada no polígono preenchido em preto,

no desenho que mostra o distrito do Tremembé. Nele é possível verificar a mancha

ocupada pelo Parque Estadual da Serra da Cantareira, porção noroeste do mapa,

figura 2.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 146

Figura 2: Distrito do Tremembé, posição relativa do setor de estudo

Fonte: Desenho elaborado pelos autores

O cálculo populacional por estimativa deve-se ao levantamento do número de

residências existentes em cada um dos três subsetores. Foi utilizado o número 3,3

habitantes por residência – IBGE, 2010 - como parâmetro de referência. A somatória

do número de moradores por domicílio leva ao número de 9.417 para a população do

setor, sendo que o subsetor 1 tem 2.778 habitantes (76,50 hab/ha); o subsetor com

5.377 (50,80hab/há) e o subsetor 3 com 1.277 9 (9,67hab/ha).

O projeto de urbanização do setor conta com trinta e três quadras, onde classificou-

se: treze quadras pequenas, com área até 1ha; dezessete quadras médias entre 1ha

e 4ha; 3 quadras grandes, maiores que 4ha. A quadra maior tem 16,5 há, é a ocupada

pelo Conjunto Habitacional Jardim Apuanã.

Sem contar a ocupação irregular dos córregos, nas quadras de tamanho pequeno

e médio observa-se parcelamento em lotes para residências, desde 60,00m² até

maiores que 500,00m² (estes no subsetor 3).

O estudo do tecido urbano do setor é apresentado por temas que compõem a

configuração da cidade, considerados desde o espaço físico natural.

• Superfície do terreno natural ou modificado, seus desníveis, os diferentes

cursos de água ou canais, reservatórios a vegetação nativa ou não.

• Traçado da cidade, as vias que atravessam, as que distribuem e as locais.

• Espaços livres de edificações, parques e praças pavimentadas ou não in-

cluindo as áreas esportivas.

• Espaços construídos cobertos para abrigar as atividades humanas, edifica-

ções térreas e verticalizadas.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 147

• Maneiras de apropriação do espaço dos corredores e das subáreas.

O setor em análise é apresentado na figura 3. Em 3A, foto aérea, pode-se notar

três tipos distintos de ocupação. Em 3B, o diagrama mostra a localização de cada

subsetor. O subsetor 1 (11ha) corresponde a superfície de cor preto; o subsetor 2

(32ha) está representado pelo pontilhado escuro; o subsetor 3 (40ha) pelo pontilhado

claro. Os níveis do terreno variam de pontos mais altos nos subsetores 1 e 3 para os

pontos baixos junto aos córregos existentes. O setor fica em uma situação de meia

encosta com inclinação que favoreceu a construção de casas em fileira.

O sistema de circulação principal se faz por duas vias. A Rua Maria Amália Lopes

de Azevedo (A1) que atravessa o setor no sentido oeste-leste e faz uma inflexão de

noventa graus em direção sul; e a Avenida Antonelo da Messina (A2), parte da Rua Maria

Amália em direção norte tangenciando os subsetores 1 e 2. Estas são consideradas as

mais importantes do setor em estudo, chamadas vias que atravessam. Desenhadas

com espessura média estão aquelas consideradas como vias de distribuição. Elas

distribuem o tráfego para as vias locais e não são realçadas no diagrama. Os córregos

existentes estão assinalados por duas linhas finas.

Figura 3: Características da área de estudo

Fonte: Elaborado pelos autores, Google Earth e Mapa Digital da Cidade.

As vias que atravessam A1 e A2, nas respectivas faixas lindeiras de lotes as

edificações são ocupadas por comércio, serviços e atividades institucionais de interesse

para o setor 3, também para uso das pessoas em trânsito para outros destinos.

Apresentam-se observações sobre cada subsetor, questões de análise urbana e

projeto urbano que serão vistas na prática, na escala do subsetor.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 148

VIAS PÚBLICAS DO SETOR EM ESTUDO E O PARCELAMENTO DO SOLO

No Tremembé, setor em estudo, as vias de cada subsetor têm peculiaridades. Seja

pelo seu assentamento no terreno em declive, seja pela largura do leito carroçável, ou

pela presença ou falta dos elementos urbanos. O que existe não preenche o conjunto

de elementos urbanos que deveriam compor as vias, e lhes auferirem qualidade

conforme os indicadores que classificam as vias por padrão de qualidade (tópico

anterior).

Em cada subsetor se atestam as diferenças, fruto da largueza ou dificuldades

para a construção de cada um dos espaços. É evidente a diferença

,

de qualidade do

espaço público em cada subsetor e observa-se que isto reflete o tipo de tecido urbano

que foi previsto pelo projeto.

Os subsetores 1 e 3 são os que tem melhor qualidade urbana. Vias, passeios

largos, vegetação nas calçadas são algumas das características desses locais, apesar

de que a faixa de renda dos residentes nestes subsetores seja distinta.

O subsetor 2 caracteriza um tipo de loteamento precário, devido a estreiteza das

vias, dos passeios, a falta de espaços livres e descuido com as edificações. Observa-

se o descaso com o cuidar dos espaços comuns, tanto da parte do poder público como

da comunidade, compreensível em locais de baixa renda no Brasil, devido a pouca

civilidade de parte significativa dos moradores.

Nos subsetores as vias deveriam definir o contorno das áreas livres e ou verdes,

inclusive acompanhar faixas de proteção ambiental dos cursos d’agua, com o objetivo

de permissão da acessibilidade pública. No setor em estudo como um todo existe

cobertura vegetal significativa, porém não distribuída de maneira homogênea. Ela se

localiza em dois maciços, ao norte no subsetor 1, ao sul no subsetor 3. O subsetor 2,

é o que apresenta menor quantidade de área vegetada, devido ao traçado da área se

fazer por vias estreitas e lotes de pequenas dimensões, havendo pouca vegetação

nos passeios e no interior dos lotes. A ausência de arborização acontece também

nas duas vias principais. A faixa de mata ciliar ao longo dos córregos, que seria parte

da faixa de proteção ambiental, está comprometida devido a ocupação por moradias

precárias localizadas de forma irregular, figura 4. Em 4A, o sistema viário principal, em

4B, o diagrama mostrando a projeção dos prédios.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 149

Figura 4: plano geral e diagrama figura fundo (figure ground)

Fonte: diagrama elaborado pelos autores

O subsetor 1 possui a maior densidade demográfica devido à verticalização do

conjunto habitacional e a área total ser relativamente pequena. O subsetor 2, devido

aos lotes pequenos para as residências e as residências geminadas. O subsetor 3, por

ser ocupado por residências de classe média.

Subsetores

Edifícios em altura não ocorrem de forma significativa no setor, apenas no subsetor

1, Conjunto Habitacional Jardim Apuanã existem edificações até quatro pavimentos, o

que caracteriza o perfil de horizontalidade do setor. Comparados os três subsetores,

o primeiro deles possui o maior gabarito, tendo sido implantado em local de cota alta.

As demais edificações são do tipo casa térrea ou assobradada, a menos onde se

tirou partido da topografia e se conseguiu mais um ou dois pavimentos. Em diversas

situações o espaço destinado a uma residência no lote, serviu para a construção de

edificação com a finalidade de abrigar mais do que uma família.

No subsetor 1, além dos prédios existem conjuntos formados por casas. No

subsetor 2, quase todo, as moradias são pequenas, construídas em fileira ou são

produto da ocupação informal dos terrenos junto ao córrego. No subsetor 3, as casas

estão isoladas no lote. A seguir apresentam-se os tipos de configuração das moradias

conforme seu projeto responde ao programa de necessidades. Em cada subsetor

demonstra-se de maneira sintética o observado pela pesquisa. A foto aérea e outras

tiradas no local oferecem a ideia do contexto onde se insere cada subsetor.

B

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 150

Subsetor

Neste subsetor destaca-se o conjunto de prédios implantado na cota mais alta, a

ocupação por casas projetadas em fileira (geminadas) e o espaço verde abrangendo

quase metade da área do subsetor. O empreendimento habitacional teve início em

1990, na gestão da Prefeita Luíza Erundina, através da Associação dos Sem-Terra,

tendo sido sua construção executada em mutirão devidamente orientada por projeto

de arquitetura e de infraestrutura. A construção por mutirão foi adotada também para

as partes ocupadas por residências, figura 1.

Figura 5: Subsetor 1

Fonte: Google Earth, diagrama dos autores

Há duas situações distintas de leitos carroçáveis nesse subsetor e que ocorrem

de modo paralelo. A primeira é a Avenida Antonelo da Messina presente em fundo

de vale (à esquerda na figura 5) e a segunda é a Rua Um, na cumeeira (à direita na

figura 5), e que permite acesso ao interior do conjunto. A avenida tem um caráter

de corredor de circulação principal, devido à conexão com as vias de menor escala

no bairro, além de escoar o transporte público da região. A segunda via, ligada ao

Conjunto Jardim Apuanã, possui um caráter apenas de acesso às residências dentro

do empreendimento habitacional, tanto que essa via termina em cul-de-sac.

O subsetor 1 está implantado em uma área de topografia acidentada, contendo

blocos de apartamentos (unidades de 40 m²) e casas geminadas (unidades de 35 m²).

As casas têm uma planta convencional de moradia popular. Os prédios têm um bom

projeto, com planta flexível, e apartamento de dois quartos, figura 6.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 151

Figura 6: Setor 1, apartamentos e casas

Fonte: fotos, arquivo dos autores

As plantas dos apartamentos são bastante funcionais e projetadas para a

construção em alvenaria armada. As plantas são e moduladas, figura 7

Figura 7: Setor1, Conjunto Jardim Apuanã, planta esquemática de uma prumada de

apartamentos

Fonte: desenho dos autores

Subsetor 2

O subsetor 2 abraça o subsetor 1, aproveita ao norte área de pequena declividade,

a leste o loteamento ajusta-se a declividade na direção do córrego por extensos

patamares e na parte leste da área os lotes aproveitam a declividade em relação a

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 152

outro córrego existente. O parcelamento das quadras e feito por lotes de tipo pequeno

e médio. São destinados a residências e a usos mistos (moradia, pequeno comércio

e/ou serviço). As quadras não são regulares. A sua forma resulta da adaptação ao

terreno culminando em lotes de profundidade variada, figura 8.

Figura 8: Subsetor 2

Fonte: Google Earth, diagrama dos autores

No Subsetor 2, há uma incidência maior de ocupações irregulares em lotes que,

geralmente, possuem área de 125 m², de acordo com o que atualmente é estabelecido

como lote mínimo. O que não impede que nestes lotes se construa para abrigar mais

do que uma família. Nesse subsetor é recorrente a identificação de vazios no interior

dos lotes, sendo que muitas vezes o recuo frontal não é adotado. A configuração de

lotes pequenos e estreitos contribui para a ausência de áreas permeáveis dentro dos

terrenos. Bem como, a largura estreita das vias dificulta a plantação de árvores no

passeio. Alguns trechos de cobertura vegetal, neste subsetor, estão concentrados em

lotes desocupados, figura 9.

Figura 9: Setor2, exemplo de imóveis residenciais

Fonte: fotos, arquivo dos autores

O assentamento das edificações nessa área, devido à declividade acentuada,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 153

ocasiona diferenças de gabarito entre os dois lados da via; o tamanho reduzido da

caixa das ruas dificulta a entrada de luz natural e revela um tipo de ocupação que, se

inicia com as edificações e depois vem o acabamento das vias. Diretrizes urbanísticas

básicas, como respeitar o recuo das edificações ou a largura de calçada, não são

respeitadas e isto reflete em uma maneira de construir que materializa a informalidade.

Figura 10:

Fonte: diagrama elaborado pelos autores

Subsetor 3

O subsetor 3 se caracteriza por ter sido implantado ao redor da Associação Atlética

Guapira, um clube privado localizado no topo da colina. Ao seu redor estão distribuídas

casas de alto padrão implantadas em um loteamento que se ajusta bem às curvas de

nível. O clube foi fundado em 1918 por moradores e comerciantes locais, visando a

formação de uma equipe de futebol. O

,

clube instalou-se em diferentes localidades

do bairro do Tremembé até adquirir, em 1964, a parcela de 50 hectares em que está

localizado atualmente. O parcelamento dos terrenos no entorno do clube começa

a ocorrer a partir da década de 1970, segundo dados da Prefeitura de São Paulo.

Neste subsetor, no traçado das vias foram dimensionados passeios de três metros

de largura, permitindo a plantação de árvores nas calçadas. Os leitos carroçáveis

são suficientemente dimensionados, existem canteiros centrais em alguns pontos e

dispositivos separadores de tráfego. figura 11.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 154

Figura 11: Subsetor 3

Fonte: Google Earth, diagrama dos autores

O parcelamento de lotes é feito por lotes variando de 250 a 400 m² de área.

Além disso, as edificações respeitam os recuos obrigatórios de frente laterais e de

fundo, condição que o identifica com um local de classe média. Este subsetor é o

mais privilegiado quanto à presença de vegetação, devido à plantação de árvores no

passeio de três metros de largura, a presença de mata ciliar no Córrego Tremembé,

circundando o subsetor, bem como dentro dos domínios do Clube Guapira. Outro

fator que contribui para a existência de generosa quantidade de vegetação devido a

plantação de árvores nos terrenos privados. Conclui-se que a distribuição do verde

acontece de forma mais homogênea neste subsetor, reforçando o padrão de classe

média.

Figura 12: Subsetor 3, exemplos de imóveis residenciais

Fonte: fotos arquivo dos autores

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O artigo mostra o estudo da forma de um setor do tecido da cidade de São

Paulo, ressaltando o procedimento de aplicação dos conceitos de corredor e subárea.

Procedimento que permite identificar os menores subsetores de um setor em análise,

utilizado no Tremembé para demonstrar a relação das formas construídas com

situações socioeconômicas dispares, porém convivendo próximo uma das outras,

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 11 155

como assentamento urbano. A posição relativa a declividade do terreno e o tipo de

construção, em particular das moradias, demonstram o lado simbólico de representação

desta realidade quanto a disputa por um lugar para viver.

Procurou-se explicitar uma maneira de desenvolver investigação sobre a forma

urbana. Primeiro reportada aos aspectos conceituais da disciplina de projeto urbano,

seus fundamentos teóricos. Depois, o primeiro passo do projeto que é o conhecimento

detalhado do local e o resgate dos propósitos que ensejaram a construção.

Quanto a pesquisa sobre o projeto ora implantado, houve a possibilidade de

transitar livremente nos espaços públicos e grande dificuldade para adentrar os

imóveis, compreensível devido a insegurança que paira no Brasil de hoje. Observada

as inúmeras variações sobre um tipo edificado ou padrão inicial, resultante do modo de

viver (as vezes sobreviver) de uma parte das famílias, ficou reforçada a opção de não

se ir a fundo nas questões individuais e ficar apenas com os tipos gerais, possíveis de

serem percebidos e marcantes como forma edificada. Disto resultou a observação de

padrões de uso dos espaços e o estudo de tipos.

REFERÊNCIAS

ALEXANDER, C. ISHIGAWA, S. SILVERSTEIN, M. (1977). Uma linguagem de padrões. Porto Alegre.

Bookman: 2013.

BARNETT, Jonathan. Redesigning cities: principles, practice, implementation. Chicago. American

Planning Association. 2003.

CHERRY, Nathan; NAGLE, Kurt. Grid, Street, Place, essential elements of sustainable urban districts.

Chicago: Planners Press, 2009.

COELHO, Carlos Dias [coordenação]; CALADO, Maria; COSTA, João Pedro... [et al.]. Coleção

Cadernos MUrb: Morfologia urbana da cidade portuguesa. Os elementos urbanos 1. Lisboa:

Argumentum, 2013.

EWING, R, BARTHOLOMEW, K. Pedestrian & transit-oriented design. New York, Urban Land Institute,

2013

MACEDO, A. C, O espaço urbano por partes. São Paulo. In Revista Sinopses n°38, outubro,

FAAUUSP, P.11 a 16. 2002.

ROSSI, Aldo. A arquitetura da cidade (1966). São Paulo, Martins Fontes, 2001

SOLÁ-MORALES, Manuel de. Las formas de crecimiento urbano. Barcelona, Edicions UPC, 1997

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 156

CAPÍTULO 12

doi

GOIÂNIA EM AGLOMERADOS: DESAJUSTES ENTRE O

PLANEJADO E O CONCRETO

Lídia Milhomem Pereira

Instituto Federal de Goiás, Campus Goiânia,

departamento I. Goiânia-GO.

Ricardo Alexandrino Garcia

Universidade Federal de Minas Gerais. Instituto

de Geociências- IGC,Belo Horizonte-MG

Carlos Fernando Ferreira Lobo.

Universidade Federal de Minas Gerais. Instituto

de Geociências- IGC,Belo Horizonte-MG

Paulo Eduardo Alves Borges da Silva

Instituto Federal de Minas Gerais.Campus

Avançado Conselheiro Lafaiete. Conselheiro

Lafaiete- MG

Nayhara Freitas Martins Gomes

Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em

Geografia Universidade Federal de Minas Gerais.

Belo Horizonte-MG

RESUMO: Goiânia, capital do estado de Goiás

é referência em diversas áreas como a medicina

oftalmológica, oncológica, cirúrgica. Cidade

arborizada que foi planejada, na década de 1930,

inicialmente, para 50 mil pessoas alcançando

um número muito além do previsto em menos

de sessenta anos. Hoje, sua população soma

mais de 1.400.000 habitantes. No entanto, nos

últimos anos, com o crescimento e a valoração

do tecido urbano, verifica-se a presença de

ocupações em lugares antes desvalorizados.

Há um ciclo de interesses, ordenamento e

reordenamento territorial, de projetos por

agentes privados e públicos diante de lugares

antes desvalorizados. A pesquisa é fruto de

investigação acadêmica do programa de pós-

graduação em Geografia, nível doutoramento

da Universidade Federal de Minas Gerais.

Também está apoiada em métodos quantitativos

e programas como o Arc Gis, sendo, pois,

uma metodologia quantitativa, utilizando a

análise exploratória descritiva. Conforme o

procedimento metodológico planejado, haverá

o uso de variáveis censitárias. O trabalho está

pautado nos Indicadores adotados pelo IBGE

(2010), principalmente Renda e Coeficiente

de Gini, bem como a disponibilidade desses

dados censitários. Essa temática é fator

de investigação e averiguação do presente

trabalho. Discutir a cidade, seu planejamento,

visualizar as territorialidades, contextualizando-

as com as realidades dialéticas no contexto

do capitalismo são resultados esperados na

pesquisa e parte deste estudo.

PALAVRAS-CHAVE: Disparidades.

Urbanização. Aglomerados subnormais

ABSTRACT: Goiânia, capital of the state of

Goiás, is a reference in several areas such

as ophthalmological, oncological and surgical

medicine. A tree-lined town that was planned

in the 1930s initially for 50,000 people reaching

far beyond what was predicted in less than sixty

years. Today, its population adds more than

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 157

1,400,000 inhabitants. However, in the last years, with the growth and the valuation

of the urban fabric, the presence of occupations in previously devalued places is

verified. There is a cycle of interests, planning and territorial reordering, of projects

by private and public agents before previously devalued places. The research is the

result of academic research of the postgraduate program in Geography, PhD level of

the Federal University of Minas Gerais. It is also supported by quantitative methods

and programs such as the Arc Gis, and is therefore a quantitative methodology using

exploratory descriptive analysis. According to the planned methodological procedure,

there will be the use of census variables. The work is based on the Indicators adopted

by IBGE (2010), mainly Income and Coefficient of Gini, as well as the availability of this

census data. This theme is a research and investigation factor of the present work. To

discuss the city, its planning, to visualize

,

the territorialities, contextualizing them with

the dialectical realities in the context of capitalism are expected results in the research

and part of this study.

KEYWORDS: Disparities. Urbanization. Subn Agglomerates

1 | INTRODUÇÃO

Em 24 de outubro de 1933, em local determinado por Atílio Correia Lima, em

um planalto onde atualmente se encontra o Palácio das Esmeraldas, na Praça

Cívica, Pedro Ludovico lançou sua pedra fundamental, tendo sido Goiânia planejada

e construída para ser a capital política e administrativa de Goiás, sob a influência

da Marcha para o Oeste, política desenvolvida pelo Governo de Getúlio Vargas para

acelerar o desenvolvimento e incentivar a ocupação do Centro-Oeste brasileiro. Goiânia

foi planejada, inicialmente, para 50 mil pessoas, a cidade faz parte da Mesorregião

do Centro-Oeste e da Microrregião de Goiânia. A metrópole, assim como as demais

capitais brasileiras, ultrapassou demograficamente a previsão do seu número de

habitantes, idealizada para as primeiras décadas. A seguir, na Figura 1, tem-se a

evolução da população da cidade.

Ano de análise Evolução da população da cidade de Goiânia

1940 48.166

1950 53.389

1970 151.013

1980 380.773

1991 717.519

2000 1.090.737

2007 1.244.645

2010 1.302.001

2014 1.412.364

2015 1.430.697

Figura 1 – Crescimento populacional de Goiânia-GO.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 158

Fonte: IBGE, estimativa da população nos anos de 2014 e 2015.

Elaborado por: autores (2017).

Possui uma geografia contínua, com poucos morros e baixadas, tendo terras

planas na maior parte de seu território, com destaque para o rio Meia Ponte. Atualmente,

a barragem do Córrego João Leite também é um dos maiores destaques da hidrografia

da capital goiana, que vai garantir o abastecimento de água até o ano de 2025. O

município sofreu um acelerado crescimento populacional desde a década de 1960,

atingindo um milhão de habitantes cerca de sessenta anos depois de sua fundação.

É a segunda cidade mais populosa do Centro-Oeste, sendo superada apenas por

Brasília. Situa-se no Planalto Central e é um importante polo econômico da região,

sendo considerada centro estratégico para áreas como indústria, medicina, moda e

agricultura. De acordo com o IBGE, é a sexta maior cidade do Brasil em tamanho,

com 256,8 quilômetros quadrados de área urbana. A Região Metropolitana de Goiânia

possui mais de 2,2 milhões de habitantes, o que a torna a décima região metropolitana

mais populosa do País (PREFEITURA DE GOIÂNIA, 2017).

Como aspectos negativos são notáveis as diferenças entre as classes e as

disparidades na capital. No relatório apresentado na abertura do V Fórum Urbano

Mundial da Organização das Nações Unidas (ONU), no Rio, em 2010, revela que

Goiânia é a décima capital Brasileira, Belo Horizonte, a décima terceira, seguidas

de Fortaleza, Brasília e Curitiba. Goiânia é uma das que apresentam as maiores

diferenças de renda entre ricos e pobres no País (JUNQUEIRA, 2010).

No Jornal Opção, em 15 de setembro de 2012, o pesquisador do tema da

desigualdade social, o professor e cientista social Dijaci David de Oliveira, da Faculdade

de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás (UFG), comenta que:

Na verdade, a desigualdade social cresceu desde a década de 1970, quando não

fez a distribuição das riquezas [...]Em Goiânia os 20% mais pobres detém apenas

3,34% da riqueza e os 20% mais ricos 63,06% - dados de 2010 [...] Na opinião de

Oliveira, o melhor a ser feito é intensificar os investimento em educação construindo

novas escolas e melhorando a qualidade do ensino em todos os níveis. Não basta

erradicar o analfabetismo, é preciso também aumentar o tempo de permanência

nas escolas e aumentar o tempo de escolaridade. É sabido que existe uma

relação direta entre a escolaridade e a renda. O professor João Batista de Deus,

professor do Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa), da Universidade Federal

de Goiás (UFG), referindo-se aos dados apresentados pela ONU-Habitat, também

defende que há uma relação estreita entre desigualdade social e nível educacional:

“Como os adultos pobres que moram em Goiás, em geral, têm pouca qualificação

profissional, é preciso, além das ações de governo que já visam reduzir essas

discrepâncias, investir nas escolas”. Temos de ter como meta salvar a geração

seguinte e a educação é fundamental. (SEABRA, 2014,p.78).

Conforme Teixeira (2013), o espaço urbano constitui o centro de acumulação

capitalista, seja por meio da valorização imobiliária para a concentração da riqueza

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 159

social ou por meio dos investimentos públicos. A cidade tornou-se espaço-mercadoria,

privatizada em prol da valorização do capital.

Os indicadores socioeconômicos demonstram os aspectos objetivos de cada

cidade e, também, de Goiânia. É importante refletir sobre a progressão numérica da

educação, bem como a respeito da longevidade e da renda, fatores atrativos para

aqueles que buscam melhorias de vida e acabam migrando para a capital.

O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), O IDHM brasileiro

considera as mesmas três dimensões do IDH Global – longevidade, educação e renda

–, mas vai além: adéqua a metodologia global ao contexto brasileiro e à disponibilidade

de indicadores nacionais. Embora meçam os mesmos fenômenos, os indicadores

levados em conta no IDHM são mais adequados para avaliar o desenvolvimento dos

municípios e das regiões metropolitanas brasileiras. (ATLAS DO DESENVOLVIMENTO

HUMANO NO BRASIL, 2017b). O IDH de Goiânia foi de 0,739 em 2010, números que

a classificam na faixa de Desenvolvimento Humano Alto (IDHM entre 0,700 e 0,799).

O maior índice do IDHM do município encontra-se na característica longevidade, com

pontuação 0,838, seguida de renda, com 0,824, e de educação, com 0,739. A seguir,

dados do Atlas PNUD trazem as características gerais da cidade.

2 | DISPARIDADES

Para Medeiros (2012), não é simples a definição do conceito. A priori, pode-

se dizer que a desigualdade é uma situação na qual não existe a igualdade e,

matematicamente falando, trata-se de uma desigualdade que ocorre quando uma

quantidade é maior ou menor que a outra.

Conforme Ferreira (2000), em um país cujo desenvolvimento econômico colonial

baseou-se nos pilares gêmeos de uma enorme concentração inicial da propriedade

fundiária e da importação maciça de mão-de-obra escrava, não foi preciso censos,

pesquisas amostrais ou um grande número de índices matemáticos sofisticados para

que a existência da desigualdade fosse notada e comentada. Em termos genéricos, as

causas de uma distribuição desigual de renda pertencem a cinco grupos:

a) existência de diferenças de indivíduos com relação as suas características

natas etnia, gênero, inteligência e/ou riqueza inicial;

b) Características individuais adquiridas, como nível educacional, experiência

profissional;

c) Discriminação entre remuneração conforme o gênero por exemplo. Por

segmentação. Mesma ocupação e remunerações diferentes conforme a região

geográfica Projeção -mapa de derivada ;

d) Mercado de capital;

e) Demográfico (fertilidade, coabitação ou separação habitacional.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 160

Essas desigualdades auxiliam na conformação de aglomerados de exclusão,

subnormais e segregação socioespacial. Sposito (2013) destaca que a palavra segregar

é sempre de natureza espacial. É um processo expresso no espaço, resultado de

relações sociais de diferentes grupos que veem a necessidade de separar-se a partir

de seu modo de vida, rompendo o conceito de cidade e a possibilidade de participação

e convívio dos indivíduos que movem a vida urbana.

Assim é preciso sempre questionar quem segrega para realizar seus interesses;

quem a reconhece, porque a confirma ou parece ser indiferente a ela; quem a sente,

porque vive esta condição; quem contra ela se posiciona, lutando ou oferecendo

,

instrumentos para sua superação; quem sequer supõe que ela possa ser superada e,

desse modo, também é parte do movimento de sua reafirmação.

Para Corrêa (1989), a segregação é como par que funciona dialeticamente e

constitui uma região fragmentada, que não compartilha e não convive, apesar de

coexistirem em um mesmo espaço.

Villaça, em um primeiro sentido se entenderá por segregação urbana a

tendência à organização do espaço em zonas de forte homogeneidade social interna

e de forte disparidade social entre elas, estendendo-se essa disparidade não só em

termos de diferença, como também de hierarquia. Ele diz que, segregação é “um

processo segundo o qual diferentes classes ou camadas sociais tendem a se concentrar

cada vez mais em diferentes regiões ou conjuntos de bairros da metrópole”. O autor

ressalva que são as “classes acima da média” que tendem a se segregar em uma única

região da metrópole. Já os espaços produzidos pelas burguesias não se limitam ao

contraste centro-periferia, sendo o padrão dominante o dos setores de círculo. Assim,

tem-se a concentração majoritária, em determinados espaços urbanos, de pessoas

pertencentes à dada classe sociais. Estas, na maior parte dos casos, concentram-

se em bairros específicos ou em condomínios fechados, no quais a presença de

integrantes de outras classes sociais, algumas até opostas, também se faz presente

nas proximidades.

Conforme Marcuse(2004) segregação: é o processo pelo qual um grupo

populacional é forçado, involuntariamente, a se aglomerar em uma área espacial

definida, em um gueto. É o processo de formação e de manutenção de um gueto.

As origens da aglomeração e da segregação são múltiplas. Por divisões culturais,

por papel funcional, zoneamentos apropriados dentro da cidade; diferenças no status

hierárquico refletindo e reforçando as relações de poder. “Uma vez que as funções não

são neutras na hierarquia do status, as três divisões andam juntas”. E assim por diante.

As permutas são múltiplas. “As relações sociais determinam relações espaciais; essas

por sua vez, geralmente influenciam, mas nem sempre reforçam as relações sociais”,

(MARCUSE,2004, p. 27).

Spósito ressalta o conceito de segregação espacial:

A segregação espacial pode ser compreendida como resultado de um processo de

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 161

diferenciação que se desenvolve ao extremo e que leva, na cidade, ao rompimento

da comunicação entre as pessoas, da circulação entre os subespaços, do diálogo

entre as diferenças, enfim, conduz à fragmentação do espaço urbano. (SPÓSITO,

2013, p. 74)

Esse conceito parte do pressuposto de que, na proporção que a cidade é dividida

em centro e periferia, as classes de mais alta renda ficam com as terras mais caras e

as de mais baixa renda ficam com as mais baratas. No entanto, sua aplicação pode

ser contestada em muitos casos, pois a concentração de grupos sociais pertencentes

a diferentes graus de condição econômica pode optar por residir na área periférica

por motivos particulares. Isso se verifica com mais intensidade nas grandes cidades

americanas e na construção de condomínios exclusivos nas periferias de muitas cidades

brasileiras. A principal contribuição dessa autora à teorização sobre segregação urbana

são as políticas públicas nesse processo, as políticas de moradia, e suas relações.

Vasconcelos(2016),no capítulo sobre Debate, processos e formas socioespaciais

nas cidades, contribui sobre a temática conceituando e classificando termos que

refletem subdivisões e categorias urbanas/espaciais. Esses termos apesar de soarem

como sinônimos apresentam certas características peculiares. Tal compreensão,

no entanto, requer a elucidação de alguns conceitos-chaves, facilitando assim a

compreensão destes processos. Dentre os quais estão os seguintes:

Desigualdade socioespacial: Tem como exemplo Londres dividida em um

“West Side” aristocrático e um “East Side”. O proletário é conhecido desde o século

XIX, e era, em parte, explicada pela poluição dos ventos dominantes em direção ao

leste (no hemisfério norte).

Fragmentação: Isolamento dos pobres, que a imobilidade do grande número de

pessoas tornaria a cidade “um conjunto de guetos”, e que poderia transformar “sua

fragmentação em desintegração” (alusão à Santos, 1990,p.90).

Exclusão: banimento, expulsão. Atualmente os excluídos habitam, sobretudo,

os grandes conjuntos habitacionais periféricos. Essa situação se deteriorou com o

aumento dos imigrantes vindos das antigas colônias, sobretudo da África do Norte.

Segregação: considera apenas a segregação involuntária, isto é, o processo

que conduz à formação de áreas semelhantes aos guetos, nas quais a população é

forçada a residir. Os casos mais representativos são os guetos judeus das cidades

medievais e renascentistas, inclusive portuguesas (“judiarias”), os novos guetos

implantados durante a ocupação nazista de cidades europeias, como Varsóvia, e os

bairros negros segregados das cidades norte-americanas.

Invasão: área já ocupada, por habitantes de um grupo recém-chegado. Nos

países pobres, os resultados do processo de invasão ou de ocupação de terrenos (e

de prédios) por indivíduos, famílias ou pelos movimentos sociais têm denominações

diversas: favelas, bindonvilles, villas miséria ou squatters. Há uma apropriação ilegal

das terras públicas e privadas, sobretudo daquelas com disputas judiciais. Essas áreas

são consideradas na literatura também como “segregadas”, mas de fato são o contrário.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 162

São o resultado da ação da população desfavorecida, que ocupa os espaços menos

valorizados da cidade e que não interessam ao mercado imobiliário, seja em morros,

em áreas de declive ou inundáveis, em torno de ferrovias ou outras áreas públicas,

assim como nas periferias longínquas. A população pobre desassistida pelo Estado,

que não oferece habitações sociais suficientes ou compatíveis com seus rendimentos

baixos e irregulares, não tendo condições de participar do mercado imobiliário mesmo

irregular (em loteamentos) ou do mercado de casas de aluguel, toma a iniciativa de

invadir pequenas áreas ou glebas de grande dimensão e tentam resistir às tentativas

de expulsão. Em alguns casos, essas populações invadem (ou “ocupam”) áreas

valorizadas pelo mercado, como no exemplo da “Invasão das Malvinas”, atual Bairro

da Paz, ao longo da Avenida Paralela em Salvador; “A noção de invasão foi utilizada

pelos sociólogos da Escola de Chicago para descrever a invasão de uma área já

ocupada, por habitantes de um grupo já recém-chegado. Nos países pobres, os

resultados do processo de invasão ou de ocupação de terrenos (e de prédios) por

indivíduos, famílias ou pelos movimentos sociais têm denominações diversas: favelas,

bindonvilles, villas miséria ou squatters. Há uma apropriação ilegal das terras públicas

e privadas, sobretudo daquelas com disputas judiciais.

Na cidade de São Paulo, em maio de 2016, houve um incêndio em um prédio

no setor central que foi invadido por mais de 200 famílias. Estas pagavam uma taxa

simbólica e tiveram seus pertences e objetos completamente destruídos.

Periferização: está substituindo a de marginalização espacial. Essa noção é

muito próxima da de marginalização, mas com um componente espacial mais forte. Ela

lembra também parte da dualidade “centro-periferia”, o que não reflete a complexidade

das cidades. É uma noção muito utilizada no Brasil, mas que não tem sentido em

outras realidades, como nos afluentes subúrbios norte-americanos, por exemplo. Ela

é frequentemente confundida com a noção de exclusão ou aparece como sinônimo de

pobreza. Deve ser lembrado que a população da periferia não está segregada, mas

ocupa o espaço em que o Estado tolera (ou permite) as implantações fora das normas

oficiais ou mesmo irregulares (laissez-faire) em áreas que não interessam ao mercado

imobiliário. (VASCONCELOS, 2016,p.50). O

,

para

a idealização desta obra. Para tal, tornou-

se conveniente a adoção de uma revisão

bibliográfica apropriada ao tema, objetivando,

desta forma, embasar o debate científico aqui

proposto ao tentar elucidar, com base na análise,

os procedimentos comuns ao ato de projetar e

suas respectivas problemáticas.

PALAVRAS-CHAVE: Eduardo Souto de Moura;

Casa do Cinema Manoel de Oliveira; Linguagem

Compositiva; Análise; Crítica Arquitetônica

1 | INTRODUÇÃO

O estudo aqui discorrido objetiva versar,

de modo crítico, sobre o projeto realizado para

a “Casa do Cinema Manoel de Oliveira”, com

base em uma revisão bibliográfica pertinente

ao tema, juntamente a uma introdutória

compreensão sobre o método compositivo do

arquiteto português Eduardo Souto de Moura.

Concluída em 2003, a “Casa do Cinema Manoel

de Oliveira”, destinada a abrigar e expor parte

significativa das obras do cineasta português

Manoel de Oliveira, nunca chegou a ser

ocupada e a desempenhar a função que havia

lhe sido estabelecida. Contudo, por tratar-se de

uma das obras de Souto de Moura que aparenta

transparecer peculiaridades a seu método de

composição, veio a tornar-se instrumento de

análise do presente estudo.

A justificativa referente à escolha do tema

embasa-se, primordialmente, na importância

da construção de um diálogo crítico a respeito

da obra arquitetônica. E, do mesmo modo,

em como esta mesma discussão possa vir a

contribuir academicamente para o entendimento

na composição do raciocínio projetual e

nas escolhas e demais posicionamentos

arquitetônicos assumidos pelo arquiteto em seu

ato de projetar.

Portanto, para este caso, o presente estudo

adotou como posicionamento metodológico a

análise de um determinado objeto arquitetônico

e uma abordagem teórico-referencial sobre a

obra, tal como o respectivo método compositivo

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 12

do arquiteto realizador, a fim de satisfazer os objetivos e a justificativa anteriormente

expostos.

A princípio, para a seleção do conteúdo arquitetônico a ser analisado, foi

pertinente à pesquisa optar, dentre os projetos realizados por Eduardo Souto de

Moura, aquele que contivesse em si a capacidade de expressar as diretrizes que

caracterizam, formalmente e funcionalmente, os trabalhos do arquiteto. No entanto,

foi igualmente conveniente a este estudo conferir, na mesma obra selecionada (“Casa

do Cinema Manoel de Oliveira”), determinados elementos que se contrapusessem aos

posicionamentos projetuais comuns aos demais projetos de Souto de Moura. Esta

postura objetiva enriquecer academicamente o debate aqui proposto ao tentar explanar,

entre outras questões, as problemáticas e possíveis contradições pertencentes ao ato

de projetar.

A razão da escolha do objeto arquitetônico a ser analisado pertencer ao arquiteto

Souto de Moura, apoia-se sobre a relevância em se estudar analiticamente a produção

arquitetônica deste que, segundo Mônica Castro (2008, p 38.):

“Pela exemplar capacidade reformadora do seu trabalho, Eduardo Souto Moura

destaca-se como uma das figuras de maior relevo de um grupo de jovens arquitectos,

maioritariamente do norte, que vê na circunstância um elemento propulsor do acto

criativo e considera o desenho expressão poética e suporte instrumental para a

transformação da realidade.”

Ainda inserido na perspectiva das razões que motivaram a escolha de um dos

projetos de Souto de Moura como objeto de análise deste estudo, para o interesse em

compreender o modo de projetar do arquiteto português, pode-se destacar que:

“(...) as referências linguísticas de Souto Moura, que encontram nos planos livres

de Mies van der Rohe a sua expressão mais directa, fundem-se numa inovadora

continuidade com os temas construtivos da tradição local, dotando a obra de um

grande sentido de rigor e essencialidade. (...) a atitude romântica de Souto Moura

em renunciar ao protagonismo expressivo da obra para deste modo construir

um conjunto onde objecto e contexto se confundem numa natural continuidade.”

(CASTRO. 2008, p.39)

Dadas tais circunstâncias, torna-se viável compreender que a construção de um

diálogo analítico, a fim de explanar algumas das particularidades características da

gramática compositiva do arquiteto, tenderá a contribuir a este estudo para o entendimento

da obra “Casa do Cinema Manoel de Oliveira” e das soluções arquitetônicas aplicadas

a esta. Tal compreensão igualmente possibilita reconhecer o modo e a postura com

a qual Souto de Moura tende a desenvolver sua arquitetura frente ao ato de projetar,

uma vez em que, de acordo com Stroher (2005), o arquiteto português desenvolve,

em seus projetos, um posicionamento rígido com relação ao aspecto morfológico e

um desenvolvimento purista da composição visando uma simplificação formal e um

atencioso olhar para a materialidade da edificação. Todas essas particularidades se

aproximam de características comuns à produção arquitetônica de Mies van der Rohe

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 13

tendo, por muitas vezes, suas respectivas produções assemelhadas pela crítica.

A preferência ao selecionar a obra “Casa do Cinema Manoel de Oliveira”, de

outros trabalhos de Souto de Moura, embasou-se tanto nas premissas anteriormente

desenvolvidas, quanto na capacidade que este objeto arquitetônico tem em transparecer

características ora comuns, ora peculiares aos posicionamentos formais, funcionais e

de demais posturas projetuais do arquiteto português – sendo este um de seus mais

distintos trabalhos realizados.

“A Casa do Cinema representa uma mudança significativa na expressão formal

de Eduardo Souto de Moura. Uma mudança de estilo que aborda este trabalho

para a expressão formal da arquitetura de Siza Vieira. Este edifício pretende ser

semelhante às casas circundantes, tendo algumas distorções para se encaixar

melhor no enredo. A imagem geral se assemelha à lente da câmera, com olhos

dinâmicos como os insetos, buscando as visualizações para ver entre os prédios.”

(João Sousa, 2011)

Assim sendo, fica sublimada a relevância contributiva pretendida por esta

pesquisa ao propiciar o debate científico acerca de questões referentes à abordagem

crítica e o posicionamento analítico à obra arquitetônica e seu respectivo realizador.

2 | METODOLOGIA

Estruturalmente, os métodos responsáveis por balizar os posicionamentos

contidos neste estudo orientaram a pesquisa realizada de duas formas: a primeira

condiz com o desenvolvimento de uma revisão bibliográfica apropriada, a fim de melhor

compreender as características que constituem o “vocabulário arquitetônico” e o modo

com o qual Eduardo Souto de Moura idealiza seus projetos. Para tal, autores como

Mônica Castro (2008) e Ronaldo Stroher (2008) contribuíram significativamente ao

introduzir as particularidades e demais especificidades comuns ao desenvolvimento

projetual do arquiteto português e discorreram sobre tais características em projetos

específicos.

A segunda forma objetivou realizar uma argumentação crítica direcionada ao

edifício. Deste modo, conferiu-se a necessidade em analisar os desenhos técnicos

(plantas, cortes e fachadas) referentes ao projeto da edificação, cedidas pelo escritório

do arquiteto autor do projeto para o desenvolvimento deste estudo. Além do material

técnico cedido, foram igualmente analisadas imagens fotográficas da “Casa do

Cinema Manoel de Oliveira” e croquis elaborados por Souto de Moura, a fim de

melhor compreender o objeto arquitetônico estudado. Contudo, a estruturação da

argumentação crítica pretendida deu-se, tanto pela análise do material já mencionado,

como pela elaboração de uma revisão bibliográfica que buscou embasar e fundamentar

os posicionamentos críticos impostos.

De tal forma, inserida em uma perspectiva teórico referencial, os autores cujas

obras justificam tais argumentos são, respectivamente; Josep Maria Montaner (2014),

Arquitetura e Urbanismo: Planejando

,

processo de periferização também está

relacionado ao modo de produção capitalista do espaço, no qual a terra passa a ser

um produto a ser comercializado, onde áreas centrais são bem mais valorizadas em

razão de sua vantagem locacional (GOTTDIENER, 2010). Dessa maneira, a população

economicamente menos favorecida é “expulsa” para áreas mais afastadas.

3 | CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse artigo é pertinente discutir os aglomerados subnormais como conformação

e advindo de afunilamentos e consequentes formas de desigualdades formas e

padrões.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 163

Para o IBGE, o termo “aglomerado subnormal” foi utilizado pela primeira vez em

1991, tendo permanecido no Censo Demográfico de 2010. O vocábulo “possui certo

grau de generalização de forma a abarcar a diversidade de assentamentos irregulares

existentes no país, conhecidos como: favela, invasão, grota, baixada, comunidade,

vila, ressaca, mocambo, palafita, entre outros” (IBGE, 2011, p. 26).

O IBGE (2011, p. 19) define aglomerados subnormais da seguinte forma: É

um conjunto constituído de, no mínimo, 51 unidades habitacionais (barracos, casas

etc.) carentes, em sua maioria, de serviços públicos essenciais, ocupando ou tendo

ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular)

e estando dispostas, em geral, de forma desordenada e densa. A identificação dos

aglomerados subnormais deve ser feita com base nos critérios abaixo:

a) Ocupação ilegal da terra, ou seja, construção em terrenos de propriedade

alheia (pública ou particular) no momento atual ou em período recente

(obtenção do título de propriedade do terreno há 10 anos ou menos).

b) Urbanização fora dos padrões vigentes – refletido por vias de circulação

estreitas e de alinhamento irregular, lotes de tamanhos e formas desiguais e

construções não regularizadas por órgãos públicos;

c) Precariedade de serviços públicos essenciais.

A precariedade dos serviços essenciais (serviços de abastecimento de água,

coleta de esgoto, coleta de lixo e fornecimento de energia elétrica) leva em conta

somente a existência do serviço ou não, de forma que não se considera a qualidade

desses serviços (frequência na coleta de lixo, qualidade da água e frequência no

fornecimento de energia).

A geomorfologia de Goiânia é diferente de outras capitais na região Sudeste, as

quais há visíveis aglomerados subnormais acima ou abaixo de prédios luxuosos.

Em vários pontos do país encontram-se aglomerados subnormais em que

serviços essenciais de coleta de lixo, abastecimento de água, de energia, esgoto,

entre outros são ineficientes, quando não inexistentes. Nas regiões do Brasil, os

aglomerados apresentam características distintas. Para melhor caracterizá-los, foi

necessário padronizar elementos que definem a situação. De acordo com o IBGE

(2011), foram utilizadas, na pesquisa, as características do domicílio, dos serviços

urbanos, dos padrões urbanísticos, da localização da área, da densidade de ocupação

e da situação fundiária e legal. É importante ressaltar que, para se ter um conceito

comparativo entre as regiões brasileiras, perde-se, muitas vezes, as especificidades

locais, o que ocorre principalmente devido à diversidade existente em municípios e

regiões. Em razão disso, diversos locais onde se verifica a carência de prestação de

serviços não foram identificados como aglomerados subnormais, conforme os critérios

estabelecidos pelo IBGE.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 164

4 | PARA NÃO CONCLUIR

Conforme o procedimento metodológico planejado, foram usadas variáveis

censitárias. Inferências e análises geoestatísticas, com o intuito de dar visibilidade

aos agrupamentos da segregação territorial para os recortes em Goiânia. A pesquisa

será pautada nos indicadores adotados pelo IBGE (2010) em amplas dimensões, bem

como a disponibilidade de seus dados censitários, com o detalhamento das variáveis a

serem utilizadas, de maneira inédita. Há diversas pesquisas, projetos em andamento,

teses e dissertações sobre segregações socioespaciais, mas nenhum deles distinguiu

exatamente as variáveis que abordaremos adiante. Figura 2: Distribuição espacial

setores censitários

Figura 2 – Goiânia: 2010. Distribuição espacial setores censitários.

Fonte: IBGE. Censo Demográfico de 2010.

Pela análise geoestatística percebemos que há uma total disparidade social e

econômica, pois apenas uma parte da população concentra a renda e as riquezas

e nesse mesmo território há muitas pessoas com baixa renda. Assim, há uma alta

desigualdade, uma vez que poucos grupos possuem alta renda e muitos grupos têm

baixa renda. No mapa, essa classe está representada pela coloração marrom, nas

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 165

regiões noroeste, oeste, sudoeste, parte da norte, leste e sul. Conforme pesquisa feita

pelo Conselho Regional de Registro de Imóveis (CRECI), nesses locais o valor em reais

do metro quadrado em Goiânia, em 2010, coincide com os setores mais valorizados

da cidade. Nas áreas de coloração rosa, temos a classe 2, que mostram a alta

desigualdade com alta renda. Isso significa que há poucas pessoas com renda elevada

e muitas com baixa renda, gerando uma alta desigualdade, presentes nas regiões sul,

sudoeste e noroeste. Na classe 3, baixa desigualdade com baixa renda, lembramos de

conceitos sobre a eliminação da obrigatoriedade de se implantar infraestrutura básica

em novos loteamentos na cidade, que levou, de imediato, à aprovação de um grande

número de novos parcelamentos, bem como do número de construções ativando o

circuito imobiliário. Os loteamentos se multiplicavam de maneira descontrolada, sem

restrições ao tipo de utilização, fosse ela industrial, comercial ou residencial. Essas

atividades foram se espalhando espontaneamente, sem nenhum controle e os locais

de moradia passaram a se dispersar por áreas distantes, sem serviços públicos e

benfeitorias urbanas (PDIG/2000, 1992, p. 12 apud MOYSÉS et al., 2007). Por fim,

a classe 4, baixa desigualdade com alta renda, é representada no mapa pela cor

verde-claro. Nessa classificação, há uma homogeneidade das classes sociais, mais

elevadas, ou seja, altíssima renda, situadas próximas, e baixas desigualdades, pois a

média tornou-se alta. Não significa que não há desigualdade ou pessoas com baixa

renda, mas sim uma minoria desta última e uma maioria da primeira. Essa classe se

situa, no mapa, nas seguintes regiões: centro, sul, sudeste, noroeste, norte e oeste.

Nessas regiões localizam-se muitos condomínios fechados devido à alta renda,

visto os custos, benefícios, valores do metro quadrado e padrão de vida. De acordo com

dados da Secretaria Municipal de Planejamento, existem hoje, na Grande Goiânia, ao

menos 19 (dezenove) condomínios fechados já implantados, legalizados e habitados,

sendo 14 deles na cidade de Goiânia, a saber: a) Região sul: Privê Atlântico, 1978;

Florença, 1997; b) Região norte: Aldeia do Vale, 1997; c) Região oeste: Residencial

Granville, 1998; d) Região leste: Jardins Madri, 2000; Portal do Sol I, 2001; Complexo

Alphaville Flamboyant – 3 etapas, 2001; Portal do Sol II, 2002; Jardins Paris, 2003;

Jardins Atenas, 2003; Residencial Araguaia,2011, 2004; Goiânia Golfe Residence,

2005; Jardins Milão, 2005; e Condomínio do Lago, 2005.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 12 166

Figura 3: Aglomerado subnormal Setor Universitário

Fonte: PEREIRA(2018)

REFERÊNCIAS

CORRÊA, Roberto Lobato. O espaço urbano. São Paulo: 4º Edição, Ática, 1989.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. Disponível em:http://censo2010.

ibge.gov.br/materiais/guia-do-censo/operacao-censitaria.html. Acesso em: 27 jul. 2017.

______. Censo Demográfico 2010: aglomerados subnormais – primeiros resultados. Rio de

Janeiro: IBGE, 2011.

______. Indicadores mínimos conceitos. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/

,

e Edificando Espaços Capítulo 2 14

que introduziu a esta pesquisa a relevância da compreensão crítica sobre a obra

arquitetônica, além de expor, de modo breve, algumas das especificidades comum à

produção arquitetônica do arquiteto português.

Igualmente, os autores Francis D. K. Ching (2013) e Simon Unwin (2013),

com suas respectivas obras teóricas, orientaram os posicionamentos referentes ao

entendimento formal, funcional e estético da edificação analisada por este estudo.

Sendo estes os argumentos que constituem elementos fundamentais à composição

da análise pretendida.

Com o objetivo de contextualizar a condição atual da obra, foi conveniente,

também, expor de forma breve as complexidades políticas e administrativas pelas

quais o edifício passou ao longo dos anos. Do mesmo modo, tornou-se igualmente

necessário introduzir, de modo sucinto, uma biografia referente ao arquiteto realizador

do projeto, Eduardo Souto de Moura, e seu respectivo cliente, o cineasta Manoel de

Oliveira.

3 | O ARQUITETO

Eduardo Elísio Machado Souto de Moura é o arquiteto português cuja produção

arquitetônica contemporânea alcançou projeção internacional, sendo amplamente

reconhecida pela crítica e mídias especializadas, e entusiastas de sua obra. Vencedor

do prêmio Pritzker em 2011, Souto de Moura nasceu em 25 de Julho de 1952 na

cidade do Porto, em Portugal e formou-se em arquitetura pela Escola Superior de

Belas Artes do Porto. Tem como obras icônicas em sua carreira o Estádio Municipal

de Braga, juntamente com a Casa das Histórias Paula Rego, entre outras. O arquiteto

ainda possui o título de Doutor Honoris Causa pela Faculdade de Arquitectura e Arte

da Universidade Lusíada do Porto e pela Universidade de Aveiro. (UNIVERSIDADE

DO PORTO, 2016)

O crítico espanhol Josep Maria Montaner, em seu livro A condição Contemporânea

da Arquitetura (2016), destaca, de maneira breve, a obra de Souto de Moura como

conceitual, com forte presença minimalista e embasada na composição estrutural. A

abordagem realizada pelo crítico reforça a noção contemporânea e evolução de sua

prolífica obra e, entre outras, se associa de modo claro e direto em alguns aspectos

particulares com a produção de Álvaro Siza Vieira.

Nos projetos elaborados por Souto de Moura tornam-se evidentes que as

soluções arquitetônicas planejadas tendem a possuir uma sólida contextualização com

o lugar. Sua abordagem projetual prima, entre outros aspectos, por elaborar através da

síntese, um cuidadoso e sensível jogo de elementos e estratégias arquitetônicas que

se relacionem com o espaço, colocando-o no eixo primordial na tomada de decisões,

segundo Stroher (2005).

Segundo Castro (2008), nas obras realizadas por Souto de Moura é possível

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 15

conferir uma intensa indução neoplástica, nas quais se fazem notar a presença de

planos verticais livres que estão articulados entre si, compostos dentro de um sistema

ortogonal. Estes, por sua vez, definem limites para as funções a serem desempenhadas

no espaço, nas quais as aberturas posicionadas entre esses planos irão definir as

relações do interior com o exterior.

“Em contraponto ao pluralismo da década de 70, marcado por um pós-modernismo

carregado de cores, imagens e formas, procura na arte minimalista americana as

respostas para uma arquitetura contemporânea (...) No movimento moderno, Souto

de Moura encontra, depois, a linguagem que lhe permite traduzir espacialmente

a essencialidade e a exatidão características do minimalismo. Se em termos

operativos, esta arquitectura proporciona-lhe as ferramentas com as quais formula

uma gramática própria e enfrenta os vários problemas do projecto.” (CASTRO,

2008, p.170).

4 | A CONDIÇÃO ATUAL

A “Casa do cinema de Manoel de Oliveira”, situa-se entre as ruas Rua Viana

de Lima e Bartolomeu Velho, na cidade do Porto, em Portugal. Atualmente, o edifício

encontra-se desocupado e sem funcionamento, em decorrência do óbito do cineasta

(2 de Abril de 2015) para quem a edificação foi projetada. Em razão de inúmeros

processos administrativos e jurídicos, o edifício futuramente assumirá outra finalidade.

Inserida no imóvel, a edificação possui duas partes distintas que desempenham

funções diferentes dentro do mesmo espaço. Uma das partes consiste em uma

habitação residencial unifamiliar projetada para o uso do cineasta. A outra parte

caracteriza-se por ser uma porção edificada de escala semelhante à da residência

e que assume uma função cultural para uso público, sendo um museu. A princípio, a

iniciativa que levou ao projeto e posterior construção da obra partiram de um acordo

realizado entre o cineasta e a Câmara Municipal do Porto. (DIÁRIO DE NOTÍCIAS,

2016).

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 16

Imagem 01: Fotografia aérea que situa a locação da “Casa do Cinema Manoel de Oliveira”

Fonte: Google Street View e modificada pelo autor.

O projeto referente à edificação foi iniciado em 1998 e concluído em 2003, ano

correspondente ao nonagésimo aniversário do cineasta. Eduardo Souto de Moura foi

nomeado pela Câmara Municipal do Porto como o arquiteto responsável pela obra

e, devido às disparidades de caráter político que ocorreram ao longo do tempo após

período de eleições, a função cultural da obra edificada acabou por não ser oficializada,

permanecendo sem funcionamento apropriado. (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 2016).

A situação da edificação perdurou por muito tempo como complexa e incerta, pois

se encontrou inserida em um longo e exaustivo processo administrativo que envolveu

a venda do imóvel pela Câmara Municipal do Porto. Apesar do prestígio do arquiteto

realizador do projeto, não houve compradores durante doze anos à venda. De acordo

com o Diário de Notícias do Porto (2016), a “Casa do Cinema Manoel Oliveira” foi

vendida por 1,58 milhões à Supreme Treasure Lda, que indicou que o novo destino do

edifício seria em abrigar a Fundação Sindika Dokolo.

Portanto, o espaço da “Casa do cinema” irá destinar-se a ser um centro de

arte contemporânea e ambiente que objetiva, além da exposição de obras, o

desenvolvimento de atividades visando à integração de artistas vinculados aos meios

internacionais de debate da arte, de acordo com o Diário de Notícias o Porto (2016).

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 17

5 | O PROJETO

Imagem 02: Fachada principal da Casa do Cinema Manoel de Oliveira –

Fonte: Disponível em: http://www.archilovers.com/projects/36746/casa-do-cinema-manoel-de- oliveira.html

De acordo com o material cedido pelo escritório do arquiteto, a “Casa do Cinema

Manoel de Oliveira” possui 1.476 m² de área construída e 1.020 m² de área do terreno.

Esta define-se como uma edificação de caráter institucional e residencial voltada para

o desenvolvimento de atividades culturais e moradia do cineasta Manoel de Oliveira.

A princípio, a edificação fora encomendada pela Câmara Municipal do Porto em um

acordo com o cineasta, na finalidade de que esta viesse a possuir função expositiva

e no armazenamento das obras do acervo de Manoel de Oliveira, além abrigar sua

própria residência. (BARATTO, 2014)

5.1 Função

Funcionalmente, o projeto pode ser compreendido em dois complexos edificados

que abrigam em si funções distintas, mas que se conectam pelo subsolo do mesmo

terreno em que residem. O complexo principal, situado de modo mais central ao

terreno, contém as funções destinadas às atividades voltadas, prioritariamente, para

exposição, armazenamento e demais ações institucionais de cunho cultural propostas.

Neste encontra-se, no nível térreo, o espaço destinado ao foyer, bilheteria, escadas e

um pequeno auditório.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 18

Imagem 03: Planta Baixa Térreo

Fonte: Souto de Moura Arquitectos Lda. e modificada pelo autor

Já no nível superior (primeiro pavimento), situam-se os ambientes referentes à

administração, biblioteca,

,

lavabo e salas de reunião. O outro complexo, inserido de

maneira mais discreta aos fundos do lote, abriga as funções residenciais voltadas para

a moradia de Manoel de Oliveira.

Imagem 04: Planta Baixa do Pavimento Superior

Fonte: Souto de Moura Arquitectos Lda.e modificada pelo autor

O subsolo tem por função no projeto, além de promover uma conexão física

entre duas partes, ser o acesso de veículos, tanto da residência como do complexo

institucional, com a principal via de acesso ao lote. A proposta idealizada por Souto

de Moura define duas formas distintas de acesso ao terreno: a primeira, pela Rua

de Bartolomeu Velho, onde está situado o acesso de visitantes, direcionados

prioritariamente ao bloco institucional e acesso de veículos. A segunda, através da Rua

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 19

Viana de Lima, na qual tem-se o acesso individualizado, tanto do bloco institucional

quanto da residência do cineasta.

A separação funcional realizada, assim como sua respectiva setorização, evoca

um senso de organização espacial prioritário, pautado nas funções que cada uma das

duas partes do complexo desempenha: O complexo principal, destinado a função

institucional, está mais ao centro, enquanto a parte que estabelece a função residencial

está sutilmente afastada, quase oculta, locada ao sudoeste do terreno. Esta condição

pode ser justificada tanto pela necessidade em se atribuir privacidade a residência,

como pela focalização do complexo institucional como principal elemento. Esta ideia

que consiste na organização espacial pautada em um senso prioritário de valores,

pode ser observada na perspectiva assumida por Simon Unwin (2016) ao descrever,

em suas análises, que a esquematização organizacional entre espaços (internos ou

externos) comumente dá-se pelo grau de relevância que o arquiteto atribui a cada

ambiente.

Imagem 05: Planta Baixa do Subsolo – Indicando acesso de veículos.

Fonte: Souto de Moura Arquitectos Lda e modificada pelo autor.

Contudo, esta abordagem pode ser facilmente questionada, ao se considerar

que o conteúdo programático de ambos complexos não é capaz de uma integração

eficaz, tanto com relação ao uso das áreas livres do terreno, quanto na própria

incompatibilidade de atividades a serem desempenhadas pelo programa proposto.

Ao que parece, a necessidade de implantação de duas organizações programáticas

distintas no mesmo terreno, consistia na condição de existência do projeto, por parte

de seus financiadores.

Assim sendo, com base na interpretação realizada com base na análise do projeto,

percebe-se que o projeto arquitetônico desenvolvido desempenha certa atenciosidade

com estas questões, de tal forma que a volumetria do edifício proposto almeja

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 20

equipara-se em escala e proporção com a residência do cineasta, mas diferencia-se

formalmente e funcionalmente da mesma. Desta maneira, propõem-se uma equidade

entre corpos, a fim promover o equilíbrio proporcional entre ambos e uma particular

diferenciação formal e imagética.

Há de se levar em conta, também, que Souto de Moura, em sua arquitetura,

preocupa-se e toma como referência em seus projetos, particularidades físicas e

conceituais de seus respectivos entornos (CASTRO, 2008). Portanto, fatores referentes

à escala, proporção e forma do edifício também estão internalizados no diálogo que o

arquiteto, com seu projeto, realiza com as edificações e demais especificidades deste

espaço circundante. Tais características são comuns ao projeto aqui analisado, uma

vez que todas as partes constituintes da edificação equiparam- se proporcionalmente

aos demais edifícios presentes no entorno.

Estruturalmente, com base no material técnico cedido pelo escritório do arquiteto,

não foi possível identificar a marcação dos pilares nas plantas referentes ao térreo e

pavimento superior, tanto na residência, quanto no bloco institucional. No entanto,

foi percebido na planta de subsolo, que interliga ambos edifícios, elementos gráficos

circulares que sugerem a presença de pilares. De todo modo, a composição estrutural,

no bloco residencial, aparenta assumir a costumeira racionalidade com a qual Souto

Moura realiza seus projetos (CASTRO, 2008). E, diferentemente deste, no bloco

institucional, em função da orientação irregular das paredes, estima-se que os pilares

que o sustentam estejam inseridos nessas mesmas paredes.

Com relação à materialidade, o relatório técnico cedido pelo escritório de Souto

de Moura destaca que, exteriormente, foi utilizado zinco para revestir a cobertura,

monomassa cinza escura para compor o revestimento da superfície externa da

fachada do primeiro pavimento e chapa de inox despolida a jato de fibra de vidro para

revestir a superfície da fachada do andar térreo. O relatório cedido também afirma

que, internamente, foram utilizadas placas acústicas no teto da edificação, assim

como também destaca que o material referente ao revestimento de piso do hall e das

escadas foi o mármore cinza amaciado.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 21

Imagem 06: Corte Longitudinal da Edificação

Fonte: Souto de Moura Arquitectos Lda e modificado pelo autor.

Outro aspecto relevante à análise do projeto consiste na organização espacial

proposta nas plantas do complexo institucional. Estas, com relação às outras plantas

desenvolvidas nos demais projetos de Souto de Moura, apresentam diferenciações

que destoam, consideravelmente, de soluções comuns ao vocabulário compositivo do

arquiteto.

A disposição espacial dos ambientes internos, do bloco institucional, está

definida por paredes com eixos distintos entre si, formulando um possível desencontro

de direções. Esta é uma particularidade incomum nos projetos de Souto de Moura,

visto que, de acordo com Stroher (2005), a simplificação de aspectos formais e

funcionais, muitas vezes associadas a uma postura miesiana, condiciona, entre outras

particularidades, a um estado puramente racional e ordenado da planta baixa nos

projetos do arquiteto.

Portanto torna-se perceptível na composição em planta, a preferência do arquiteto

em desenvolver uma linguagem conceitual que optou por fugir, neste caso, de algumas

das convenções comumente adotadas em seus respectivos projetos.

Tornar-se valido lembrar que a orientação espacial dos ambientes do bloco

residencial, segue a matriz de ordenação racional comumente proposta por Souto

de Moura em seus projetos. (STROHER, 2005). Esta evidência presente no próprio

projeto, fortalece o argumento de uma composição que optou por estabelecer uma

diferenciação funcional e formal entre a residência do cineasta e a edificação voltada

para as atividades institucionais. Esta especificidade caracteriza um interessante

posicionamento projetual, uma vez em que, apesar de residirem no mesmo terreno,

estarem fisicamente unidas pelo mesmo subsolo e terem eventualmente sido

projetadas por Souto de Moura, assumem particularidades formais e funcionais que

as diferenciam.

Com relação a composição organizacional referente ao complexo institucional, tal

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 22

inserção conseguiu estabelecer uma comunicação interativa entre distintas áreas do

programa e agregou fluidez a espacialidade do respectivo complexo. Contudo, seria

consciente ressaltar que, tal como foi realizado no modulo institucional, abordar da

mesma forma (ou de maneira similar) a espacialidade da residência do próprio cineasta

Manoel de Oliveira poderia vir a ser tão interessante quanto, a fim de dar continuidade

ao discurso conceitual desenvolvido projetualmente para o bloco institucional.

5.2 Forma

A composição volumétrica do complexo institucional consiste de uma derivação

prismática de características cubicas que sugerem, de modo sutil, uma movimentação,

em função da orientação de seus planos, mas que ainda dentro do aspecto

,

cubico,

propõe uma delicada estaticidade, de acordo com os princípios formais introduzidos

por Ching (2013).

Em função da orientação axial irregular dos planos que compõem o sólido, a

perspectiva é realçada do ponto de vista do observador. Na parte superior do volume

situam-se dois elementos que constituem a personalidade formal e identidade visual

do edifício: duas grandes janelas com suas respectivas molduras em projeção.

Imagem 07: Montagem Ilustrativa

Fonte: Souto de Moura Arquitectos Lda; < http://observador.pt/2015/02/19/teatro-tivoli-e-casa-manoel- de-oliveira-

classificados-como-monumentos-de-interesse- publico/>;

directors> e modificada pelo autor.

Estas podem ser interpretadas como os “olhos” do edifício e, de fato, se

comportam como tal. Em razão da irregularidade angular de orientação dos planos

do volume, ambas janelas buscam recortes distintos na paisagem, decorrente de

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 23

suas igualmente distintas orientações. Volumetricamente, as janelas compõem

uma articulação do edifício, além de conferir a sensação de movimento, através da

perspectiva proporcionada (CHING, 2013).

Com base na leitura da montagem fotográfica inserida, pode-se idealizar que a

solução formal elaborada pelo arquiteto sugere, de modo sutil, uma aproximação com

o conceito de forma tipológica introduzida por Sílvio Colin, ao destacar que:

“Analogia e a relação de semelhança entre dois objetos; é um dos mais poderosos

meios de criação de que dispomos. A forma arquitetônica analógica é inspirada por um

objeto externo ao universo da arquitetura.” (COLIN, p.71, 2000)

Inserida em uma composição abstrata, de orientação minimalista, compreende-

se que há uma aproximação formal e estética do volume edificado com o equipamento

cinematográfico de filmagem, uma vez em que a moldura das janelas em projeção

propostas por Souto de Moura, aparentam assemelhar-se, formalmente e

imageticamente, com a parte dianteira de uma câmera de filmagem profissional. E, tal

como a funcionalidade de uma câmera, a orientação destas janelas buscam espaços

vazios na paisagem, a fim de realizar uma conexão entre interior e exterior – sendo

esta, também, uma das características comuns aos demais projetos do arquiteto,

segundo Castro (2008).

O edifício responsável por abrigar a função residencial foi volumetricamente

idealizado de acordo com as convencionais posturas projetuais adotadas pelo arquiteto,

pois com base na análise realizada, foi percebido que neste há uma simplificação

formal que transparece uma condição minimalista e que, também, procura se associar

visualmente com seu respectivo entorno. Este sólido cúbico de cor branca, inserido

no terreno, expressa um contraste em relação ao bloco institucional edificado à sua

frente.

6 | CONCLUSÃO

Tornou-se possível, com base no desenvolvimento analítico realizado, introduzir

a ideia de que a “Casa do Cinema Manoel de Oliveira” insere-se, dentro da produção

arquitetônica de Eduardo Souto de Moura, como um elemento instigante ao debate

proposto. Deste modo faz-se viável compreender que, tanto a aplicação de uma

dialética projetual comumente realizada pelo arquiteto português, quanto a adesão de

elementos e soluções arquitetônicas incomuns a esta mesma gramática, são capazes

de culminar em um objeto arquitetônico que possui, em sua composição, componentes

referentes a distintos posicionamentos projetuais, porém consegue ser percebido de

modo homogêneo.

Há, no projeto analisado, uma notável diferenciação de aspectos formais e

funcionais sobre as duas partes edificadas presentes no sítio. Tal distinção sugere a

adoção de diferentes conceitos e partidos arquitetônicos para a composição individual

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 2 24

de cada uma destas partes. Este posicionamento transparece uma reflexão de

relevante análise: o projeto, em sua totalidade, denota a estruturação de duas linhas

de raciocínio arquitetônico que foram desenvolvidas, pelo mesmo arquiteto projetista,

na finalidade de residirem no mesmo terreno, que foram idealizadas no mesmo período

de tempo, mas que por suas incompatibilidades programáticas, desenvolveram-se

de modo diferenciado. Portanto, há de se raciocinar que tal imposição dá-se pela

necessidade em se definir um espaço voltado para a atividade da privada e outra

destinado ao domínio do uso público.

Esta manobra projetual sugere uma ressignificação dos posicionamentos

arquitetônicos assumidos por Souto de Moura que, para a composição da residência

do cineasta Manoel de Oliveira, assume sua típica linguagem de criação ao idealizar

a edificação de um sólido cúbico que assume uma simplificação formal, com base na

adoção de uma perspectiva de senso purista, que assimila características comuns a

seu entorno e que, funcionalmente, se organiza de modo racionalizado. (STROHER,

2005)

E, em contrapartida, à frente deste mesmo sólido, se edifica um conteúdo

prismático de faces irregulares, cujas janelas alcançam a projeção e dividem-se

em busca de emoldurar recortes na paisagem e que, em sua materialidade, faz-se

perceber aquilo que pertence ao térreo do edifício e o que se sobrepõe a este.

Portanto, torna-se compreensível destacar que a “Casa do Cinema Manoel de

Oliveira” é, para além de uma edificação voltada à sua respectiva função, um exercício

projetual que demonstra objetivamente a versatilidade compositiva de um arquiteto

frente a um desafio programático e conceitual. Deste modo, fica subentendida a

capacidade de Souto de Moura em revisitar seu próprio modo de composição e, neste

ato, idealizar algo capaz de se comunicar com o que já lhe é comum e, ao mesmo

tempo, lançar-se ao peculiar.

REFERÊNCIAS

BARATTO, Rômulo. Câmara do Porto põe à venda a Casa Manoel de Oliveira, projetada por

Souto de Moura. 2014. Disponível em: < http://www.archdaily.com.br/br/601264/

camara-do-porto-poe-a-venda-a-casa- manoel-de-oliveira-projetada-por-souto-de-moura>. Acessado

30 Jun. 2017

CASTRO, Maria Alexandra Correia de. História e Tradição na Arquitectura Contemporânea

Portuguesa: Cinco Obras de Arquitectura em Centros Históricos.

2008. 204 f. Dissertação – (Mestrado) - Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto. Porto,

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COLIN, Silvio. Uma introdução à arquitetura. 7° ed .Rio de Janeiro: Editora UAPÊ. 2000. p.196

CHING, Francis D.K. Arquitetura : Forma, Espaço e Ordem. 3°ed. São Paulo: Editora

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MONTANER, Josep Maria. A condição contemporânea da arquitetura. São Paulo: Editora G. Gili,

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SOUZA, João. Mi Modern Architecture Portugal – Casa do Cinema Manoel de Oliveira, 2011.

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STRÖHER, Ronaldo de Azambuja. Casas do Norte de Eduardo Souto de Moura. ARQTEXTO,

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, n.6, p. 104-115, Jan 2005. Disponível em:

< https://www.ufrgs.br/propar/publicacoes/ARQtextos/PDFs_revista_6/09_Ronaldo%20 de%20

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20Eduardo%20Souto%20de%20Moura.html>.

,

Acessado em: 29 de Jun. 2017

UNWIN, Simon. A análise da arquitetura. 3° ed. Porto Alegre: Editora Bookman; 2013. p.276

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 26

CAPÍTULO 3

doi

PERMANÊNCIAS E INOVAÇÕES TÉCNICAS E

ORNAMENTAIS EM CASAS SENHORIAIS URBANAS

CONSTRUÍDAS PELOS BARÕES DO CAFÉ

EM CAMPINAS – SP

Renata Baesso Pereira

Pontifícia Universidade Católica de Campinas,

Programa de Pós Graduação em Arquitetura

e Urbanismo, Faculdade de Arquitetura e

Urbanismo

Campinas - SP

Ivone Salgado

Pontifícia Universidade Católica de Campinas,

Programa de Pós Graduação em Arquitetura

e Urbanismo, Faculdade de Arquitetura e

Urbanismo

Campinas - SP

RESUMO: A cidade de Campinas (SP), que

se originou no século XVIII como uma grande

produtora de açúcar, e depois da década de

1840 de café, na segunda metade do século

XIX incrementa o prestigio político e social

de uma elite, agraciada por títulos imperiais,

o que coincide com significativas mudanças

no espaço urbano, especialmente na sua

arquitetura, quando assistimos à construção

de casarios senhoriais pela nobreza da terra. O

objetivo deste trabalho é o estudo comparativo

de dois exemplares de casas senhoriais

urbanas de Campinas: o Palácio dos Azulejos,

construído em 1878 por Joaquim Ferreira

Penteado, o Barão de Itatiba e atribuído ao

construtor português Manoel Gonçalves da Silva

Cantarino; e a residência de Joaquim Policarpo

Aranha, o Barão de Itapura, iniciado em 1880

e concluído em 1883, pelo construtor italiano,

Luigi Pucci. Embora os exemplares tenham

sido construídos por representantes de uma

mesma classe social e num curto intervalo de

tempo, sua comparação aponta permanências

e inovações na arquitetura senhorial urbana do

século XIX. A análise do programa funcional

revela como o enriquecimento das famílias

se expressa nos espaços domésticos. Mas

é na análise da técnica construtiva e da

ornamentação que se revelam as principais

diferenças. O estudo de dois casos exemplares

permite compreender como, na segunda metade

do século XIX, a produção do casario senhorial

urbano contribuiu para o “embelezamento” de

Campinas. Tais exemplares se alinham com a

arquitetura erudita da Corte e com a tratadística

que circulava entre arquitetos e construtores.

PALAVRAS-CHAVE: Campinas (SP).

Arquitetura do século XIX. Casas senhoriais

urbanas. Café. Azulejos.

ABSTRACT: The city of Campinas (SP), which

originated in the eighteenth century as a major

producer of sugar, and after the 1840s, of coffee,

in the second half of the nineteenth century,

increases the political and social prestige of an

elite, graced by imperial titles, which coincides

with significant changes in the urban space,

especially in its architecture, when we witness

the construction of manor houses by the nobility

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 27

of the land. The objective of this work is the comparative study of two examples of urban

manor houses in Campinas: the Azulejos Palace, built in 1878 by Joaquim Ferreira

Penteado, the Barão de Itatiba, and attributed to the Portuguese architect Manoel

Gonçalves da Silva Cantarino; and the residence of Joaquim Policarpo Aranha, the

Baron of Itapura, whose construction begun in 1880 and was completed in 1883 by the

Italian builder, Luigi Pucci. Although the examples were constructed by representatives

of the same social class and in a short period of time, their comparison points to abidance

and innovations in nineteenth century urban manor architecture. The analysis of the

functional program reveals how the enrichment of families is expressed in the domestic

spaces. But it is in the analysis of constructive technique and ornamentation that

the main differences are revealed. The study of two exemplary cases allows us to

understand how, in the second half of the 19th century, the production of the urban

manor house contributed to the “beautification” of Campinas. Such exemplars align with

the court’s erudite architecture and with the treatise that circulated between architects

and builders.

KEYWORDS: Campinas (SP). 19th century architecture. Urban manor houses. Coffee.

Tiles.

1 | INTRODUÇÃO

No final do século XVIII, a economia da região de Campinas se estrutura com base

na lavoura de cana-de-açúcar e, alinhando os interesses dos donos de engenhos com

os do governo da Capitania de São Paulo, o território que era um bairro rural foi elevado

ao estatuto de freguesia (1774) e, posteriormente, de vila (1797), desmembrando-se

então da Vila de Jundiaí.

Do ponto de vista fundiário, a fundação de Campinas inscreve-se no regime de

concessão de sesmarias, utilizado pela Coroa portuguesa. A sesmaria originariamente

destinada a Antônio da Cunha Abreu (concedida em 1732) conteve cartograficamente

todo o Bairro das Campinas do Mato Grosso de Jundiaí e conteria todo o rossio da

futura vila. Essa concessão de terras, abandonada por seu donatário original, foi

apropriada por outros, entre os quais destaca-se Barreto Leme que doaria parte de

suas terras para o patrimônio religioso, fundando, em 1774, a Freguesia de Nossa

Senhora da Conceição de Campinas do Mato Grosso de Jundiaí.

A produção açucareira concentrou capitais, terras e poder na mão de poucas

famílias da vila, um só senhor ou uma só família detinha a propriedade de vários

engenhos, herdados, comprados ou anexados por casamento e que, posteriormente,

se convertem em fazendas de café.

No final do século XVIII, Campinas estava inserida na região que Petrone (1968)

define como “Quadrilátero paulista do açúcar” - inscrita no polígono formado pelas

vilas de Sorocaba, Piracicaba, Mogi-Guaçu e Jundiaí – principal região produtora na

Capitania de São Paulo.

Arquitetura e Urbanismo: Planejando e Edificando Espaços Capítulo 3 28

O rio Atibaia é elemento importante no processo de ocupação territorial, pois

margeando seu curso, muitas das sesmarias foram delimitadas, dando início à cultura

da cana de açúcar e depois do café. A partir da interpretação das cartas de doação de

sesmarias, e referenciando-se no curso do Rio Atibaia, Pupo (1983) elabora a seguinte

classificação da principal região onde se estabeleceram engenhos e depois fazendas

de café (ver Figura 1):

Chamaremos de Alto Atibaia o trecho (...) desde a Serra de Cabras até a divisa com

o município de Pedreira; do Médio Atibaia, desde a curva nesta mesma divisa até

a estrada de Goiás; e desta estrada até a embocadura com o Jaguari, do Baixo

Atibaia. (PUPO, 1983, p. 121)

Segundo Ribeiro (2015, p.18), os maiores produtores de açúcar e proprietários

de grande quantidade de escravos na Vila de São Carlos, em 1829, eram os seguintes

senhores de engenho: Antonio Manoel Teixeira (12.400 @ de açúcar e 226 escravos),

Francisco Ignácio Sousa Queiroz (12.000 @ de açúcar e 215 escravos), Floriano de

Camargo Penteado (4.062 @ de açúcar e 132 escravos), Theodoro Ferras Leite (4.000

@ de açúcar e 82 escravos) e Francisco Egydio de Sousa Aranha (3.500 @ de açúcar

e 94 escravos). Estes cinco senhores de engenho respondiam por 28% da produção

campineira de açúcar nas primeiras décadas do século XIX e eram proprietários de

17% de todos os escravos da vila.

A partir de 1840, o café torna-se o principal produto da região. E na segunda

metade do século XIX, o complexo cafeeiro de Campinas trouxe diversas repercussões

para seu desenvolvimento urbano, além de prestigio político e social para uma nova

elite, portadora de diversos títulos imperiais. O processo de acumulação de terras e a

passagem da produção do açúcar para o café coincidem com significativas mudanças

no espaço urbano de Campinas, especialmente no que se refere à sua arquitetura,

quando assistimos à construção de casarios senhoriais urbanos pelos barões do café.

Na década de 1880, a cidade de Campinas era a maior produtora de café e

possuía o maior número de escravos dentre os demais municípios de toda a província

de São Paulo,

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